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O fundador do aplicativo de mensagens Telegram, Pavel Durov, deve comparecer a um tribunal francês neste domingo (25/8), horas depois de ser detido ao desembarcar no aeroporto Le Bourget, ao norte de Paris. O bilionário franco-russo que tem cidadania emiradense era alvo de um mandado de busca emitido por investigadores franceses, que apuram vários crimes relacionados à rede de mensagens criptografadas.
Acompanhado por seu guarda-costas e seu assistente, Durov, 39 anos, foi preso na noite de sábado após um voo iniciado em de Baku, capital do Azerbaijão. Ele passaria pelo menos uma noite em Paris, onde tinha planejado jantar, acrescentou uma fonte próxima da investigação.
Pela manhã, procurado pela agência AFP, o Ministério Público de Paris recusou-se a comunicar “um procedimento seguido durante a investigação”. O escritório especializado no combate à violência contra menores (Ofmin) emitiu um mandado de busca contra Pavel Durov, dono de uma fortuna estimada em US$ 15,5 bilhões.
O serviço coordena uma investigação preliminar de uma série de crimes que podem ter sido cometidos com o auxílio do Telegram: fraude, tráfico de drogas, assédio cibernético, crime organizado e apologia ao terrorismo e à fraude, explicou uma das fontes próximas ao caso. A Justiça afirma que Pavel Durov não agiu para coibir o uso criminoso das suas mensagens pelos seus assinantes, ao não adotar medidas como moderação dos conteúdos veiculados e não colaborar com os investigadores.
“Chega de impunidade no Telegram”, disse um dos investigadores, surpreso pelo fato de que o bilionário decidiu ir a Paris, mesmo sabendo que era procurado na França. “Talvez por sentimento de impunidade”, acrescentou uma das fontes próximas ao assunto.
O bilionário adquiriu a nacionalidade francesa em 2021, após um procedimento administrativo acelerado e com forte conotação política da parte de Paris, em meio ao contexto de tensão crescente entre o Ocidente e a Rússia.
Sigilo acima de tudo
O aplicativo de troca de mensagens online foi lançado em 2013 por Pavel Durov e seu irmão Nikolai, com o diferencial de que as comunicações podiam ser criptografadas de ponta a ponta e tendo sede em Dubai. O Telegram se posicionou contra a tendência das plataformas americanas, criticadas pela exploração comercial de dados pessoais dos usuários.
A plataforma se comprometeu a nunca revelar informações sobre seus usuários.
A prisão de Pavel Durov provocou inúmeras reações internacionais. “#FreePavel”, publicou no X (antigo Twitter) o dono da plataforma, Elon Musk. O ex-candidato independente à presidência dos Estados Unidos Robert F. Kennedy Jr, que acaba de se juntar a Donald Trump, disse no X que “a necessidade de proteger a liberdade de expressão nunca foi tão urgente”.
Rússia reage à detenção
Na Rússia, onde o Telegram é uma das redes sociais mais utilizadas, com canais que podem ter várias centenas de milhares de assinantes, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova, disse que “a embaixada russa em Paris imediatamente se mobilizou, como é habitual” no caso de detenção de cidadãos russos no exterior.
Ela lembrou que muitas ONG internacionais condenaram em 2018 a decisão de um tribunal russo de bloquear o Telegram – medida que nunca foi totalmente implementada. “Você acha que desta vez eles vão apelar e exigir a libertação de Durov ou vão ficar calados?”, perguntou ela em sua página do Telegram.
Mais tarde neste domingo, a embaixada russa em Paris acusou as autoridades francesas de “recusarem-se a cooperar” com Moscou sobre o caso. “Pedimos imediatamente às autoridades francesas que explicassem as razões desta detenção e exigimos que os seus direitos fossem protegidos e que lhe fosse concedido o acesso consular. Até agora, o lado francês ainda se recusa a cooperar nesta questão”, acusou a embaixada russa em Paris, citada pela agência de notícias Ria Novosti.
Pressionado em seu país, Durov deixou a Rússia há 10 anos
Discreto, Pavel Durov disse em abril, em uma rara entrevista, que teve a ideia de lançar mensagens criptografadas após ter sido pressionado pelas autoridades russas quando fundou a VK, rede social concorrente do Facebook que criou em seu país de origem e que era usada pela oposição do país. Acuado pelo regime russo, ele vendeu a plataforma e deixou o país em 2014.
No emirado do Golfo, o Telegram protegeu-se das regras de moderação do Estado, em um momento em que a União Europeia e os Estados Unidos pressionam as grandes plataformas a eliminarem conteúdos ilegais.
Com grupos de discussão que podem acomodar até 200 mil pessoas, as mensagens são por vezes acusadas de aumentar o potencial viral de informações falsas e de proliferação de conteúdos de ódio, neonazistas, pedófilos, conspiratórios ou terroristas.
A comissária russa de direitos humanos, Tatiana Moskalkova, disse que a prisão de Durov representa “uma tentativa de fechar o Telegram, uma plataforma de internet onde você pode aprender a verdade sobre os acontecimentos que ocorrem no mundo”.
O ex-presidente russo Dmitri Medvedev, por sua vez, afirmou ter avisado Pavel Durov, durante uma reunião “há muito tempo”, que ele teria “sérios problemas em todos os países” por causa da sua posição intransigente sobre a privacidade dos utilizadores.
“Ele calculou mal. Apesar de todos os nossos inimigos agora comuns, ele é russo – e, portanto, imprevisível e perigoso”, escreveu Medevedv no Telegram. “Durov deveria finalmente perceber que a pátria, assim como a época, não pode ser escolhida”, completou.
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