metropoles.com

Família diz que brasileiro foi enganado pela Rússia e enviado à guerra

Embaixada do Brasil em Moscou aconselhou a família do brasileiro enviado à guerra para lutar pela Rússia a não expor o caso

atualizado

Compartilhar notícia

Google News - Metrópoles
Kostiantyn Liberov/Libkos/Getty Images
Imagem colorida de prédio em chamas após mísseis russos atingirem Kiev, Ucrânia - Metrópoles
1 de 1 Imagem colorida de prédio em chamas após mísseis russos atingirem Kiev, Ucrânia - Metrópoles - Foto: Kostiantyn Liberov/Libkos/Getty Images

A família de um brasileiro acusa a Rússia de enganar e enviar o jovem para a guerra contra a Ucrânia. O caso veio à tona após o Metrópoles revelar que um cidadão do Brasil é prisioneiro de guerra em território ucraniano.

Uma semana antes de deixar o Brasil rumo à Rússia, no último dia 15 de abril, Caio* havia completado 28 anos. Ele saiu de Três Lagoas, em Mato Grosso do Sul, sob a promessa de um emprego com um bom salário, conforme detalhou a irmã do brasileiro à reportagem.

“Quando ele chegou ao local da possível entrevista [de emprego], explicaram que, para possuir cidadania russa, ele precisaria estar empregado com um contrato de no mínimo um ano, e que eles tinham uma empresa prestadora de serviços na qual ele poderia ser integrado”, revela Hemyli Beatriz de Lima, irmã de Caio.

De acordo com a irmã do brasileiro, que segue desaparecido no Leste Europeu, Caio sempre foi uma pessoa reservada e, além de se reunir com alguns amigos para beber socialmente às segundas-feiras, ficava no computador durante boa parte de seu tempo livre.

Hemyli conta que o irmão não forneceu maiores detalhes sobre a ida para a Rússia e a proposta de emprego. Ela, no entanto, diz acreditar que Caio pode ter chegado à oferta por meio da internet.

Realidade era a guerra

Durante a suposta entrevista de trabalho, já em território russo, todos os pertences de Caio, incluindo documentos e telefone celular, teriam sido recolhidos. O jovem solicitou que sua professora de russo no Brasil – com quem teve 10 dias de aula antes de partir para a Europa – atuasse como sua tradutora nesse processo, mas o pedido foi negado.

O brasileiro ficou alguns dias sem se comunicar com a família, até que teve o celular devolvido. Os documentos, no entanto, não foram entregues de volta para o jovem. Ele voltou a entrar em contato e revelou que, em vez de iniciar um emprego com salário melhor do que no Brasil, estava indo para a guerra.

“Quando ele voltou a entrar em contato, falou que o contrato que tinha assinado era para servir a Rússia na guerra contra a Ucrânia”, diz Hemyli, relembrando uma conversa telefônica que teve com o irmão. “Ele falou que não sabia o que fazer, e foi para Rostov [cidade russa] em busca de ajuda. Após dias sem poder fazer nada, aceitou sua realidade e fez um treinamento de alguns dias e logo foi mandado para o front na guerra.”

Doença no front

A família chegou a ficar 15 dias sem contato com Caio – que, já no front de batalha, conseguia se comunicar ocasionalmente com o Brasil por meio de mensagens no WhatsApp e ligações.

Em um dos telefonemas, o jovem revelou estar alocado no sexto batalhão da 6ª Brigada do Exército da Rússia, na região de Luhansk, sob o comando de um militar identificado como “Vitas”.

Durante outro contato com a família, Caio revelou estar doente, sofrendo com fortes dores nos rins no campo de batalha. Apesar de debilitado, o brasileiro teve atendimento médico negado e chegou a ser desafiado pelo comandante russo a desertar e buscar seu próprio caminho no front da guerra, conforme detalhou a irmã.

“Ele começou a sofrer de fortes dores nos rins. Com os problemas renais, mal conseguia andar e, por diversas vezes, precisou da ajuda de soldados para se locomover”, diz a família de Caio. “Ele solicitou atendimento médico para ajudá-lo com a dor, mas isso foi negado – não uma nem duas vezes, mas várias.”

Embaixada aconselhou a não expor o caso

No último dia 9 de agosto, a família procurou a Embaixada do Brasil em Moscou para relatar o caso às autoridades. Em troca de mensagens, obtidas pelo Metrópoles, a mãe de Caio pediu que a representação brasileira na Rússia tomasse medidas para que “ele retorne ao Brasil e tenha tratamento médico para seu quadro”.

Segundo registros, a pasta colheu as primeiras informações e prometeu entrar em contato com o governo da Rússia para solicitar mais detalhes.

Cinco dias depois do primeiro contato, a família voltou a cobrar respostas da Embaixada do Brasil em Moscou. A missão diplomática voltou a retornar em 14 de agosto e disse ter consultado as autoridades russas sobre o caso. Na ocasião, a pasta ainda revelou ter recebido uma mensagem de Caio explicando a situação.

Diante da falta de respostas, a mãe do jovem voltou procurar a representação brasileira no dia 20 de agosto, mas não obteve sucesso no contato. Dois dias depois, a família foi orientada a buscar o setor consular da Embaixada. Com a ausência de informações, familiares ameaçaram expor o caso, porém a missão diplomática os aconselhou a não tomar tal atitude.

“Prezada, conforme informado, o melhor seria que ele voltasse o quanto antes ao Brasil e, alternativamente, que venha para Moscou”, diz trecho de um e-mail enviado pelo Consulado do Brasil em Moscou à irmã de Caio. “Expor na internet qualquer membro do exército, especialmente enquanto o Caio estiver na Rússia, parece uma ideia temerária.”

Em outra troca de e-mails, a missão diplomática brasileira ainda sugeriu que a família buscasse meios alternativos para resolver a situação. A embaixada orientou a contratação de um advogado, que tentaria romper o contrato assinado por Caio com a empresa não identificada.

Segundo a família, o último contato de Caio aconteceu no dia 8 de setembro, em uma ligação que não chegou a ser completada.

15 imagens
Eles relataram o caso envolvendo o brasileiro
A missão diplomática prometeu buscar maiores informações sobre o brasileiro
A embaixada revelou que Caio escreveu uma carta para a representação
Mensagem de Caio enviada para a Embaixada
A família foi orientada a procurar o setor consular
1 de 15

Família de Caio entrou em contato com a Embaixada do Brasil em Moscou em 8 de agosto

Material cedido ao Metrópoles
2 de 15

Eles relataram o caso envolvendo o brasileiro

Material cedido ao Metrópoles
3 de 15

A missão diplomática prometeu buscar maiores informações sobre o brasileiro

Material cedido ao Metrópoles
4 de 15

A embaixada revelou que Caio escreveu uma carta para a representação

Material cedido ao Metrópoles
5 de 15

Mensagem de Caio enviada para a Embaixada

6 de 15

A família foi orientada a procurar o setor consular

Material cedido ao Metrópoles
7 de 15

Material cedido ao Metrópoles
8 de 15

Troca de mensagens mostra o desespero da família

Material cedido ao Metrópoles
9 de 15

Material cedido ao Metrópoles
10 de 15

Material cedido ao Metrópoles
11 de 15

Material cedido ao Metrópoles
12 de 15

Material cedido ao Metrópoles
13 de 15

A embaixada em Moscou informou que o governo da Rússia recebeu consultas sobre o caso

Material cedido ao Metrópoles
14 de 15

Família de brasileiro foi aconselhada a não expor o caso e supostas violências por parte de militares russos

Material cedido ao Metrópoles
15 de 15

No dia 28 de agosto, a Embaixada do Brasil em Moscou revelou estar em contato com Caio

Material cedido ao Metrópoles

Brasileiro mantido prisioneiro de guerra na Ucrânia

A história de Caio veio à tona após o Metrópoles revelar, na última terça-feira (10/9), que um brasileiro é mantido refém pela Ucrânia após ser capturado nas fileiras russas na guerra.

A informação foi confirmada pelo representante da Coordenação para o Tratamento de Prisioneiros de Guerra da Ucrânia, Petro Yatsenko. Segundo o militar ucraniano, a história relatada pelo prisioneiro foi semelhante à versão apresentada pela família de Caio.

O Metrópoles, no entanto, não conseguiu confirmar se Caio é o mesmo brasileiro detido pela Ucrânia.

Na última quinta-feira (12/9), o embaixador do Brasil em Kiev, Rafael Mello Vidal, disse ter tomado ciência do caso do brasileiro detido na Ucrânia dois dias antes, por meio de familiares.

A família de Caio, no entanto, alega não ter mantido contato com a Embaixada do Brasil em Kiev, e que todas as comunicações foram com a representação brasileira em Moscou.

Após a publicação da reportagem, a Embaixada do Brasil em Moscou chegou a enviar uma mensagem para a irmã de Caio, questionando se o brasileiro citado na matéria era seu irmão.

Em conversa telefônica, nessa sexta-feira (13/9), uma funcionária da diplomacia brasileira na Rússia afirmou que a pasta não conseguiu identificar se o brasileiro preso na Ucrânia é Caio, e informou que o Ministério da Defesa do Brasil também havia sido comunicado sobre o caso.

 

O Metrópoles questionou a Embaixada do Brasil em Moscou sobre os relatos da família do brasileiro e também solicitou informações que pudessem confirmar se Caio é o cidadão do país detido na Ucrânia.

A reportagem também procurou o governo da Rússia, por meio da missão diplomática do país no Brasil, e fez perguntas sobre as acusações de que o país pode estar enviando estrangeiros, de forma forçada, para a guerra.

Até a publicação desta matéria, nenhum retorno foi dado à reportagem. O espaço segue aberto.

Atualização

Após a publicação da reportagem, Caio conseguiu entrar em contato com a família e afirmou que continua no campo de batalha.

* Por questões de segurança, a reportagem decidiu não revelar o nome completo do brasileiro.

Compartilhar notícia

Quais assuntos você deseja receber?

sino

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

sino

Mais opções no Google Chrome

2.

sino

Configurações

3.

Configurações do site

4.

sino

Notificações

5.

sino

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comNotícias Gerais

Você quer ficar por dentro das notícias mais importantes e receber notificações em tempo real?