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Entenda como o xadrez do Oriente Médio pode conter EUA e Irã

Conflito envolve interesses de vários países. Analistas ouvidos pelo Metrópoles acreditam que estratégia iraniana não deve se radicalizar

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NASSER NASSER/ASSOCIATED PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
funeral bagda
1 de 1 funeral bagda - Foto: NASSER NASSER/ASSOCIATED PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

Desde que os Estados Unidos mataram o general iraniano Qassim Suleimani, na última quinta-feira (02/01/2020), em um ataque com drones, a expectativa geral, tanto diplomática quanto nos mercados, é sobre como o Irã responderá ao ataque. Com a ofensiva militar do governo de Donald Trump, estaria o Oriente Médio – e, em um cenário mais alarmante – a um passo de mais uma guerra?

Para entender as chances de uma escalada severa no conflito, o Metrópoles ouviu especialistas em relações internacionais e política externa e a avaliação é de que, ainda que os discursos sejam inflamados de ambos os lados, o xadrez da região envolve uma série de fatores que podem frear impulsos de intensificá-lo gravemente.

Coordenador do curso de Relações Internacionais da Universidade Católica de Brasília (UCB), o professor José Romero Pereira Junior lembra que é preciso considerar que, embora EUA e Irã sejam os protagonistas do embate, ele envolve uma série de outros atores. Cada um deles com seus próprios interesses. E cada um deles aliado a um dos lados do conflito.

Nesse cenário, entram, além do Iraque (onde Suleimani foi morto), parceiros do Irã, como Rússia, China e Líbano, e aliados dos estadunidenses, como Israel e Arábia Saudita.

Israel, por exemplo, tem problemas internos com o Hamas, da Palestina, e o Hezbollah, do Líbano. “O Irã poderia dar armas a esses grupos, o que Israel inclusive já os acusa de fazer há bastante tempo”, pontua José Romero.

O elemento de agravamento dessa situação toda talvez esteja no fato de o Irã contar com a simpatia da Rússia e da China, embora hoje não exista nada além de uma reação diplomática desses dois”, completou José Romero.

O professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) Juarez Ferraz, especialista em política internacional, lembra que a China é parceira comercial do Irã, de quem compra petróleo e gás natural, e que a Rússia tampouco teria interesse em um conflito em suas fronteiras.

Para Juarez, o Irã tem uma série de opções menos drásticas de reação que bombardeios ou ações diretas contra os EUA, como consequência da estratégia de resistência regional que eles adotam há anos – e que envolve o apoio ao regime de Bashar Al Assad na Síria, o fortalecimento de milícias xiitas no Iraque e o apoio ao Hezbollah no Líbano. Isso significa que eles poderiam coordenar várias frentes de embates no Oriente Médio.

Eles vão parar e chorar a morte do general, mas vão parar como militares também. O Irã tem uma estratégia de resistência regional e deve atuar mais no sentido de forçar a saída dos americanos da região ou atacando em alvos no próprio Oriente Médio, como o Catar ou a Arábia Saudita”, afirmou o professor.

A outra “carta na manga” do Irã, destaca, é o acesso ao Estreito de Ormuz, rota do transporte de petróleo para Europa, Ásia e para a própria América do Norte. “Por ali, passa 30% do petróleo da região e isso seria um problema. Se o fechamento chegar a ocorrer, é porque a guerra já está na iminência. Mas não acho que chegue a esse ponto.”

No ano passado, atritos envolveram o estreito no Golfo Pérsico, com os EUA afirmando que o Irã abatera um drone de vigilância estadunidense e atacara navios,  além de o Reino Unido ter acusado os iranianos de tentar interceptar uma embarcação britânica.

Crise interna
No Irã, há também um fator interno que preocupa o regime dos aiatolás: o crescimento de uma oposição civil, capitaneada pela classe média iraniana. Recentemente, por exemplo, em novembro de 2019, pelo menos 304 pessoas (dados da Anistia Internacional) foram mortas pelo regime em uma rebelião popular.

Este, aliás, é apontado por Juarez como um dos motivos pelos quais Trump resolveu atacar agora, apesar de a CIA, agência de Inteligência dos EUA, monitorar Suleimani há anos.

“Recentemente, duas coisas ocorreram: primeiro, houve uma série de ataques por parte das milícias no Iraque contra alvos americanos; depois, cresceu a tensão interna no Irã e Trump achou que era hora de dar o recado, com o apoio da população civil iraniana”, ressaltou.

A eleição presidencial dos EUA em 2020, acrescenta José Romero, é outro fator crucial: “Na minha opinião, a gente não pode descartar o fato de que Trump vai concorrer”. “Essa estratégia de apertar para tentar negociar foi o que ele fez, por exemplo, com a Coreia do Norte. O que estranha nesse caso, contudo, é que ele forçou demais. Uma coisa é ficar no campo diplomático, outra coisa é matar uma liderança estrangeira”.

“E a grande questão é que faz quase 30 anos que os EUA vêm agindo quase que isoladamente pelo mundo. Chega um momento em que outras potências começam a se movimentar também”, completou.

Ele lembra ainda que os atritos entre EUA e Irã se intensificaram desde que Trump decidiu deixar o acordo que freava o desenvolvimento do programa nuclear iraniano e que recuos nessa negociação “podem ser um tiro no pé”. 

No último domingo (05/01/2020), o Irã anunciou que não iria mais honrar os termos do documento e que retiraria as limitações do processo de enriquecimento de urânio.

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