Discussão sobre petróleo atrapalha consenso em texto final da COP28
COP28 chega a reta final travada em discussão relacionada à exploração de petróleo e geração de energia renovável
atualizado
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Após quase duas semanas de negociações, a 28ª Conferência das Nações Unidas para Mudança do Clima (COP28) em Dubai, nos Emirados Árabes, entra na reta final sem uma conclusão contundente sobre a redução do uso de combustíveis fósseis e com um balanço que não reflete a urgência da atual situação climática, avaliam ambientalistas.
A criação inédita do fundo de perdas e danos para países vulneráveis, logo no primeiro dia da conferência, marcou um avanço na luta contra as mudanças climáticas. No entanto, o rascunho mais recente do balanço global (o Global Stocktake – GST), demonstra que os avanços na conferência avançam a passos bem mais lentos que os eventos climáticos extremos.
No caso do Brasil, apesar dos esforços dos negociadores da diplomacia brasileira, a passagem rápida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), durante o período em que os chefes de Estado participaram da conferência climática, na semana passada, escancarou as contradições da política ambiental brasileira.
A expectativa é que, ao longo dos próximos meses, o país desenvolva debates mais aprofundados sobre a transição energética, além de manter os avanços alcançados no combate ao desmatamento e preservação de florestas, e apresente alterativas mais concretas – em uma postura condizente com a de anfitrião da COP30 em 2025, na Amazônia.
Na salas privadas de negociação, a estratégia adotada pelo Brasil nos bastidores é pressionar os países desenvolvidos a liderarem os esforços no tema. O rascunho divulgado nessa segunda-feira (11/12), no entanto, não menciona o “abandono” dos combustíveis fósseis, ou sequer uma “saída gradual” das fontes de energia não renováveis.
O texto cita, por outro lado, a necessidade que os países desenvolvidos de fato cumpram com o compromisso financeiro estimado em R$ 100 bilhões para financiar os prejuízos causados pelas mudanças climáticas em países pobres, e a falta de definição do financiamento climático.
Texto final
O Global Stocktake é um texto apresentado ao final da COP, em que os países interessados decidem de forma coletiva quais ações mundiais serão tomadas para cumprir o acordo de Paris e limitar o aumento da temperatura global a 1,5ºC.
Uma das alternativas que devem ser apresentadas no documento final é em relação a medidas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Na COP28, uma das principais alternativas apresentadas é a diminuição do uso de combustíveis fósseis, principalmente para geração de energia.
Durante o encontro deste ano, as organizações da sociedade civil e líderes ambientais se concentraram no debate sobre o fim da exploração de petróleo e o uso de energias renováveis, como eólica e solar.
Camila Jardim, especialista de políticas internacionais do Greenpeace Brasil, enfatiza que o esboço apresentado nesta segunda coloca como uma alternativa à eliminação ou não dos combustíveis fósseis e o investimento em energias renováveis. Para ela, essa discussão não deve aparecer como uma alternativa e sim como algo obrigatório e urgente.
“A gente não tem escolha, não é uma escolha eliminar os combustíveis fósseis, não é possível fazer essa escolha, ela é imperativa e o acordo ele simplesmente não reflete nem as discussões que a gente teve aqui [em Dubai], nem a necessidade do que do que assim se apresenta que é necessário”, salienta Camila Jardim.
Além de ignorar as demandas da sociedade civil ao não promover um acordo global pelo fim progressivo dos combustíveis fósseis, o texto também é especialmente frustrante aos países em desenvolvimento por não oferecer os meios de implementação, como previsão de financiamento, para que estes tenham condições de promover sua transição energética.
A especialista do Greenpeace destaca a importância do acordo global para adaptação climática, que também está na mesa de negociações da COP28. Ela ressalta a necessidade de repasse de recursos para os países em desenvolvimento que não possuem dinheiro para investir em tecnologias que possam conter o avanço das mudanças climáticas.
“Esse acordo não andou, ele tá bastante travado. Os países que precisam assumir a responsabilidade, que são os países desenvolvidos, não estão se colocando nessa posição de responsabilidade. E aí a principal questão da justiça climática”, afirma Camila Jardim.
Mudanças climáticas: periferias são as mais afetadas em épocas de chuva
Andrew Deutz, diretor geral de política global e financiamento para conservação na The Nature Conservancy, aponta que a proposta para o texto final da COP28 não avançou nas discussões para eliminação dos combustíveis fósseis.
“O novo texto parece ser uma tentativa inteligente de reformular a questão mais controversa – mas na ausência de metas claras sobre quanto e quando a produção e o consumo de combustíveis fósseis serão reduzidos, não avançamos muito além dos apelos anteriores para a sua eliminação gradual”, aponta Andrew Deutz.
“À medida que as conversas prosseguem, percebemos que foram feitos alguns progressos em questões como soluções baseadas na natureza, sistemas alimentares resilientes, adaptação e resiliência baseadas nos oceanos e metas para parar e reverter o desmatamento até 2030 – mas ainda precisamos de mais avanços para garantir que os países maximizem a contribuição da natureza para os esforços climáticos”, completa o representante da The Nature Conservancy
Participação de Lula
A proposta do presidente Lula de reposicionar a liderança do Brasil na agenda ambiental durante a passagem dele pela COP28, nesse fim de semana, acabou ofuscada pelo anúncio de adesão do país à Organização dos Países Exportadores de Petróleo e Aliados (Opep+) e, também, por críticas do presidente francês, Emannuel Macron, sobre o acordo Mercosul-União Europeia (UE).
O presidente Lula retornou à conferência do clima como chefe de Estado em posição de destaque, devido à redução significativa dos índices de desmatamento e ao alinhamento em defesa dos povos indígenas e de outras comunidades tradicionais.
Anfitrião da COP30, na Amazônia, ele foi convidado a discursar na abertura da cúpula de líderes e tomou o palco logo após o secretário-geral da ONU, António Guterres.