Conservador, Bento XVI teve trajetória religiosa marcada por polêmicas
Declarações e posicionamentos contrários a mudanças em doutrinas da Igreja Católica marcaram polêmica atuação do papa Bento XVI na função
atualizado
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Conhecido por posicionamentos conservadores adotados durante os quase oito anos em que permaneceu na função, o papa emérito Bento XVI assumiu o cargo mais alto da Igreja Católica em meio a polêmicas. Ele morreu neste sábado (31/12), aos 95 anos, no convento onde morava, no Vaticano.
Ao renunciar, em 2013, Joseph Aloisius Ratzinger afirmou ter idade avançada e não dispor de condições de saúde para assumir o papel. Apesar disso, informações divulgadas por fontes próximas ao papa davam conta de que o anúncio teria decorrido de controvérsias com os pares e dos escândalos na instituição.
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Enquanto líder máximo da Igreja Católica, ele recebeu críticas por posicionamentos como a rejeição a alterações nas doutrinas morais religiosas — que guiam entendimentos repassados aos fiéis —, à união de pessoas do mesmo sexo e à liberação de padres do celibato.
Outro ponto de destaque do papado de Bento XVI teve relação com denúncias de casos de pedofilia na igreja, que começaram aparecer entre 2009 e 2010. As acusações mencionavam, inclusive, supostos acobertamentos por parte de líderes religiosos das dioceses e do Vaticano.
O papa assumiu a responsabilidade sobre as denúncias, encontrou vítimas e emitiu pedidos de desculpas. Também adotou normas para dar mais transparência e celeridade às apurações dos casos. As acusações se tornaram mais uma mácula do período em que Bento XVI ficou na função.
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Combate à Aids
Na primeira viagem de Bento XVI como papa à África, em 2009, mais uma declaração teve repercussão negativa. Ele afirmou que o combate à Aids no continente não se resolveria com a distribuição de preservativos e que isso “agravaria o problema”. À época, a região era uma das mais afetadas pelo avanço da doença.
O papa, que seguia para uma viagem a Camarões, defendeu que “castidade e abstinência” seriam a melhor maneira de conter o avanço da doença. O líder religioso chegou a acrescentar que uma mudança “espiritual” seria a “única solução”.
Ainda no continente, na Angola, Ratzinger condenou o aborto e criticou o Protocolo de Maputo, documento que define direitos das mulheres. Não seria a primeira vez que Bento XVI se manifestava contrariamente à interrupção da gravidez, inclusive em casos de risco para a vida de gestantes.
O uso do preservativo por pessoas em tratamento para o HIV e entre pessoas sorodiscordantes — quando uma delas tem o vírus, e a outra, não — é “fortemente recomendado”, segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids). Ele também é indicado para evitar o contágio por outras infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) e casos de gravidez indesejada.
Outras religiões
Após uma declaração polêmica, o papa emérito ofendeu a comunidade muçulmana. Em 2006, na Universidade de Ratisbona, na região alemã da Baviera, Bento XVI disse que Maomé teria trazido ao mundo apenas “coisas más e desumanas”.
Além disso, afirmou que o comando do profeta do Islã espalhou pela espada a fé que pregava. As declarações levaram a ataques contra igrejas católicas na Cisjordânia, a cobranças de explicações por parte do governo paquistanês e à aprovação de uma resolução contra o papa pelo Parlamento europeu.
No mesmo ano, judeus também reagiram a falas de Bento XVI a respeito do Holocausto, durante uma visita dele ao antigo campo de concentração de Auschwitz, na Polônia. Na ocasião, o papa responsabilizou “um bando de criminosos” pelas ações durante o regime nazista.
Para líderes de associações judaicas, a fala teria reduzido o papel de aliados e cúmplices do nazismo nas ações de violência contra judeus.
Disputas internas
Em 2013, Bento XVI foi o primeiro a renunciar do cargo em 600 anos. Um ano antes, um mordomo do papa entregou documentos encontrados na casa do pontífice a uma jornalista, com informações sobre casos de corrupção e disputas internas por poder na Igreja Católica.
Dois funcionários do líder religioso acabaram presos e condenado à prisão após o caso, mas receberam perdão papal.
Mesmo recentes, as ações controversas de Bento XVI reverberavam desde o período em que ele assumiu a vaga de prefeito, o cargo máximo, da Congregação para a Doutrina da Fé do Vaticano — a antiga Santa Inquisição —, em 1981.
À frente do cargo, ele atacou ações que tentassem aproximar o Evangelho dos mais pobres, por considerá-las “marxistas”, e elaborou textos que defendiam a manutenção de medidas consideradas ortodoxas para o mundo contemporâneo.