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O passo a passo da inovação: um sonho para a economia de Brasília

Comitiva brasiliense passou cinco dias em Nova York e na Califórnia visitando locais de inovação tecnológica

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Luiz Oliveira/Metropoles
Tata Innovation Center
1 de 1 Tata Innovation Center - Foto: Luiz Oliveira/Metropoles

Enviado especial a Nova York – O mundo inteiro conhece o Vale do Silício como a meca da tecnologia. Porém, antes dos anos 1960, a instituição mais famosa da região ainda era a Universidade Stanford, que buscou desenvolver um interesse específico em tecnologia ao fomentar empresas como Hewlett-Packard, Kodak, Lockheed, General Electric e Intel. Com a consolidação da fabricação de microchips na área, a reputação do lugar decolou e, hoje, estabeleceu-se como o lar da inovação e do empreendedorismo tecnológico.

Atualmente, um terço do investimento americano em start-ups (U$ 333 bilhões em 2016) gira pelo Vale. É um montante gigantesco, mas ainda assim deixa bastante para outras regiões do globo. Chamar um pouco dessa soma para si é o objetivo de países e organizações em busca do desenvolvimento de suas economias com empregos que requerem alta escolaridade e pagam bons salários.

Entre os dias 11 e 15 de março, uma comitiva brasiliense* (foto em destaque) – organizada pela Federação das Indústrias do Distrito Federal (Fibra) e composta pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), pelo Governo do Distrito Federal (GDF) e pela Universidade de Brasília (UnB) – visitou locais de inovação tecnológica em Nova York e na Califórnia, nos Estados Unidos.

O propósito foi conhecer os processos e as características de casos bem-sucedidos no ramo de inovação tecnológica, com o objetivo de trazer conhecimento e contatos para o desenvolvimento do Biotic – Parque Tecnológico de Brasília, que foi concebido nos anos 1990 e será inaugurado em abril.

Esses encontros formaram um manual de instruções gerais sobre como conceber um plano inovador de sucesso. Confira o passo a passo.

Passo #1: O terreno
A primeira parada desse programa foi em Cornell Tech, escola de pós-graduação situada em Roosevelt Island, uma ilhota entre Manhattan e o bairro Queens, na cidade de Nova York. Em 2008, o prefeito Michael Bloomberg lançou edital para transformar uma área de 12 hectares da ilha numa instituição focada em inovação e tecnologia.

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Fachada de prédio em Cornell Tech

 

Cornell, prestigiosa universidade americana, apresentou o projeto vencedor de uma acirrada disputa. Inaugurado em 2017, o campus dispõe de três prédios já erguidos, um em obras e outros sete planejados. Dos construídos, um foi bancado pelo próprio Bloomberg, que doou U$ 100 milhões de seu patrimônio, e outro, patrocinado pela Tata Motors, empresa indiana conhecida por fabricar automóveis. O terceiro é o edifício residencial para alunos. O quarto, em construção, leva o nome da operadora telefônica Verizon.

Antes de tudo, Cornell Tech é uma instituição de educação, o que parece destoar do propósito de formar um centro de inovação. Cabe aqui o lembrete de que a Universidade Stanford foi quem deu o pontapé inicial no Vale do Silício. Isso ocorre porque a própria escola já serve como uma incubadora, onde os alunos moram, estudam e criam suas start-ups. Lá, faz parte do currículo criar empresas e tecnologias.

Ao encontrar um dos diretores da Cornell Tech, Oto Morato Álvares, a comitiva brasiliense assinou uma carta de intenções para um intercâmbio com o Biotic.

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Assinatura da carta de intenções

 

Passo #2: O governo
Considerando que o terreno cedido à Cornell Tech era área pública e, portanto, do governo, a comitiva foi conhecer o órgão responsável pelo desenvolvimento do projeto. A New York City Economic Development Corporation (NYCEDC), corporação sem fins lucrativos criada em 2012, é subordinada à prefeitura. Faz parte de sua missão fomentar a economia da cidade, criando boas oportunidades de emprego.

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Com todos os terrenos públicos de Nova York em seu portfólio de gerenciamento, a NYCEDC estuda quais tipos de indústria teriam o maior benefício econômico em determinada parte da cidade. Quando o governo passado sentiu falta de um parque tecnológico capaz de concorrer com o Vale do Silício, foi essa instituição que selecionou a área de Roosevelt Island como o lugar ideal. Se falta atendimento médico em um bairro, eles oferecem o terreno para construção e formatam a licitação que será lançada.

Por fazer parte do governo, a organização não gerencia os projetos após sua conclusão. Seu papel é lançá-los e escolher a melhor instituição para tocá-los. Após uma licitação bem-sucedida, ela apenas fiscaliza se as condições do contrato estão sendo cumpridas. Determinar uma necessidade urbana, construir um empreendimento e depois instalar uma repartição pública vai contra o propósito.

Segundo a NYCEDC, o papel do governo é estabelecer um lugar onde a inovação deve ocorrer. Após esse passo, ela deve surgir e crescer por esforço próprio.

Passo #3: Capital para investir
Em 2016, fundos de venture capital (VC), aqueles focados em start-ups de tecnologia, tinham U$ 333 bilhões de patrimônio sob seu controle. O número de empresas que receberam dinheiro VC também foi altíssimo: 7.750. Isso apenas nos Estados Unidos.

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Placa “motivacional” na empresa WEST

Todos esses investidores têm o mesmo sonho: ganhar dinheiro com ações dos próximos Googles, Facebooks, Twitters, etc, ao investir nessas ideias logo no começo. Mesmo se dezenas de apostas não derem em nada, uma só start-up que chegue à valorização de U$ 1 bilhão já resolve a vida. Daí a importância de criar a maior diversificação possível.

A empresa que conhecemos, WEST, atua em duas áreas. Em 2017 lançou seu primeiro fundo VC, formado com o dinheiro de investidores para aplicar em start-ups. Dessa maneira, participa desse mercado bilionário.

Além disso, a empresa se especializa no marketing de produtos tecnológicos, ajudando fundadores a descobrir a melhor maneira de transformar suas ideias em um produto viável. Enquanto pequenas companhias de tecnologia têm vários engenheiros entre seus funcionários, poucas delas já pensam em como colocar suas invenções nas mãos de usuários e consumidores.

Um exemplo interessante foi o da marca Impossible Burger. Com produto feito inteiramente a partir de ingredientes vegetais, seu inventor imaginou lançá-lo como um hambúrguer vegano. Quando a WEST entrou na jogada, evitou um erro crasso. Visto que o público vegano ainda é muito pequeno, o Impossible não deveria entrar no mercado como um produto só para esse nicho, mas sim ser visto primeiro como um hambúrguer delicioso e, em seguida, como um hambúrguer vegano.

Os produtos das start-ups ainda em busca de investimento ou já prontos para o mercado precisam de uma apresentação e de uma visão que aumentem as possibilidades de sucesso.

Passo #4: O ecossistema
Acontece que de nada adianta formar um parque tecnológico, mesmo já recheado de investimentos, se esse permanecer isolado. Da mesma maneira que se deve criar uma rede entre investidores, start-ups e empresas, é necessário que esse pequeno ambiente também esteja presente em um ecossistema maior.

No âmbito acadêmico, a professora e pesquisadora Martha Russell corre o mundo estudando os relacionamentos entre indústrias de tecnologia. Seu foco principal é a relação de empresas de perfil tecnológico, tanto umas com as outras quanto com seus fundadores e investidores. Martha é diretora do mediaX, um instituto dentro da Universidade Stanford.

Divulgação

Sua pesquisa resulta na criação de mapas de relacionamento e investimento. É como se ela pegasse um grande canvas vazio e colocasse uma tachinha para cada empresa, cada empresário e cada financiador identificado. Em seguida, uma linha é traçada entre todos os pontos que detêm uma conexão (empresários e financiadoras frequentemente se envolvem com mais de uma start-up).

Ao mapear países com indústrias de tecnologia, a estudiosa consegue mostrar as diferenças entre ecossistemas mais fechados e outros mais abertos, envolvidos com outros países e, especialmente, com o Vale do Silício. A diferença é brutal: quanto mais abertos, mais recebem dinheiro de investimento e mais formam empresas.

Daí, uma conclusão: o dinheiro que move ambientes de tecnologia – assim como as próprias empresas fomentadas por ele – não se restringe a ambientes nacionais, mas se espalha pelo mundo, sempre em busca de novos projetos e clientes. Cabe aos centros tecnológicos se apresentarem para esse público.

Após conhecer o significado do ecossistema de inovação, é necessário investigar técnicas para sua formação. Para isso existe a Influencer Series, empresa fundada por uma ex-gerente de produção da Apple e pelo criador de uma das maiores incubadoras da região.

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Com uma rede de 15 mil pessoas da indústria tecnológica e que inclui CEOs e fundadores entre seus palestrantes, ela organiza eventos com o objetivo de fazer contatos, convidando os envolvidos a se envolverem com o projeto em questão. Como exemplo, a Influencer Series cita seus trabalhos no Canadá, onde juntou empresas e investidores díspares – que não tinham uma cultura de trocar conhecimento e investir em tecnologia – em uma nova potência no ramo de inteligência artificial.

É, sem dúvida, um modo de chamar atenção do mercado de tecnologia e dos financiadores de VC para um polo específico. O ecossistema em que esforços tecnológicos buscam entrar é composto por um grande grupo de influenciadores especializados, e campanhas de publicidade para o amplo público não são consideradas atrativas para eles. Com um esforço direcionado de marketing, é possível estimular uma região cujo potencial está represado pela falta de comunicação.

Passo #5: A incubadora e a multinacional
Uma das maiores incubadoras do Vale do Silício, a Plug and Play foi criada por um imigrante iraniano refugiado na Califórnia após a revolução de seu país, em 1979. A recepção da sede contém um enorme tapete persa. Como uma indicação da mistura de ideias que coexistem no prédio, uma estátua do Buddha está acomodada na porta da frente.

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Amostra de uma parede da Plug and Play

Por dentro, a empresa é relativamente simples. Situada em uma antiga fábrica de chips, seu plano arquitetônico consiste em vastos ambientes de coworking, nos quais cada conjunto de mesas e poltronas – recheados de computadores – é diferenciado apenas pelas placas penduradas, cada uma com a logomarca da start-up que ocupa o espaço. Além disso, há apenas as amenidades obrigatórias, como refeitório, pátio a céu aberto e salas de reunião.

Penduradas nas paredes, há placas cobrindo cada centímetro quadrado da área disponível. Cada uma tem o nome e a logomarca de uma empresa que já se instalou na incubadora. Algumas das suas primeiras histórias de sucesso foram Google, PayPal e DropBox. Companhias mais antigas, criadas antes da Plug and Play e que hoje investem nela como parceiros, também exibem as próprias chapas comemorativas. Tentar contar o número de placas nessas paredes é imaginar que não resta uma só companhia em nosso planeta que ainda não tenha se envolvido com esse empreendimento.

Em termos bem básicos, a Plug and Play serve como a localização física das start-ups que sustentam uma economia de inovação. Após passarem por um processo de seleção e com o financiamento de fundos venture capital, o árduo trabalho de transformar a ideia em produto tem de acontecer em algum lugar. Aqui se encontram estações de trabalho, água, luz e telefonia, e mentores experientes que compartilham sabedoria e ensinamentos adquiridos em suas carreiras. Além disso, o plano aberto encoraja a comunicação entre engenheiros de empresas diferentes.

A Plug and Play nos mostra como é um polo tecnológico que funciona. Trata-se de um ambiente tão consolidado que o mero fato de uma start-up se instalar lá já atrai o investimento de curiosos, formando assim um ciclo virtuoso para seu sucesso.

No fim da viagem, um colosso: o prédio da Samsung Innovation, braço focado em inovação do conglomerado sul-coreano, localizado em San Jose. Inaugurado em 2015, o cubo de vidro e alumínio com área de 93 mil metros quadrados pode acomodar até 2 mil funcionários. Projetado desde o início para ser um centro de excelência, o edifício dispõe de tudo do bom e do melhor no Vale do Silício: academia, jardins, golfe, uma dúzia de restaurantes, fliperamas, mesas de pingue-pongue e sinuca, assim como cabines para relaxamento, que incluem cadeiras de massagem e leitos para cochiladas.

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Edifício principal do complexo Samsung

Aqui, os inovadores têm tudo o que precisam – e, por isso, estão livres de preocupações rotineiras. De certa maneira, a Samsung criou seu próprio ecossistema de aceleração e inovação, o que parece ser o ponto final na evolução acompanhada pela comitiva até agora. Além das start-ups bem-sucedidas, estão as gigantes de tecnologia que compram e vendem projetos que sobrevivem e prosperam.

Duas semanas antes dessa visita, a Amazon pagara U$ 1 bilhão para adquirir a companhia Ring, fabricante de campainhas inteligentes. Como uma das empresas aceleradas pela Samsung, a venda realizou um significativo retorno do investimento despendido.

*Integraram a comitiva: Jamal Jorge Bittar (presidente da Fibra), Graciomario de Queiroz (diretor de tecnologia da Fibra), Mário Lima (consultor da Fibra), Antônio Valdir Oliveira Filho (secretário de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia do Distrito Federal), Thiago Jarjour (secretário adjunto de Ciência, Tecnologia e Inovação), Afonso Bermudez (presidente do Sebrae), Rodrigo Sá (diretor-superintendente do Sebrae), Geraldo Martha (pesquisador da Embrapa), Cristina Castro (UnB), Renato Matsunaga (Jornal de Brasília) e Carolina Roberte.

O repórter acompanhou a delegação como convidado.

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