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“Foi preciso gravar o irreversível”: foi desta forma que o presidente francês, Emmanuel Macron, apresentou a oficialização da entrada da “liberdade das mulheres à recorrerem ao aborto” na Constituição. O país se tornou assim o primeiro a inscrever o direito na Carta Magna.
Em uma emocionante cerimônia no Ministério da Justiça, no 1° distrito de Paris, o texto recebeu um selo que oficializa a entrada da lei na Constituição. Coube ao ministro francês da Justiça, Éric Dupond-Moretti, fabricar diante do público que acompanhava a cerimônia a peça de cera que gravou a constitucionalização do aborto.
Em seguida, o texto da legislação foi repassado a Claudine Monteil, uma das signatárias do “manifesto das 343”, célebre petição redigida por Simone de Beauvoir e publicada em 1971 na revista Nouvel Observateur em apelo à descriminalização na França.
Na época, as 343 mulheres que assumiram ter recorrido ao procedimento clandestinamente corriam o risco de serem processadas e presas.
Durante um discurso, o presidente francês justificou a necessidade de inscrever na Constituição “a liberdade garantida às mulheres de recorrerem ao aborto” devido “aos recuos da nossa época”.
Macron criticou “as forças reacionárias” que “miram primeiro e sempre nos direitos das mulheres antes de atacar, em seguida, os direitos das minorias, de todos os oprimidos, de todas as liberdades”.
Execução na guilhotina por aborto
O chefe de Estado lembrou que a interrupção voluntária da gravidez (IVG), como o procedimento não-espontâneo é chamado na França, chegou a ser um crime punido com pena de morte durante o sangrento regime de Vichy, quando a França foi ocupada pela Alemanha nazista, de 1940 a 1944.
Macron ressaltou o caso de Marie-Louise Giraud, guilhotinada “em nome da proteção da família e da pátria” por realizar operações do tipo durante o período.
O presidente também citou o nome de várias mulheres que lutaram pela legalização deste direito na França, como a médica Madeleine Pelletier, que realizava procedimentos clandestinos no início do século 20, a advogada Gisèle Halimi, que defendeu a adolescente Marie-Claire nos anos 1970, vítima de uma gravidez após um estupro, e a ex-ministra Simone Veil, que defendeu e aprovou a lei que descriminalizou a interrupção voluntária da gravidez em 1975.
“O selo da República grava neste dia um longo combate em prol da liberdade”, afirmou o chefe de Estado diante de centenas de personalidades convidadas a participar da cerimônia na Praça Vendôme, suscitando forte emoção e lágrimas entre o público.
Entre parlamentares e ministros, marcaram presença celebridades, como a atriz Catherine Deneuve, além de representantes de associações feministas.
Sob aplausos, Macron ainda expressou o desejo de inscrever a liberdade de recorrer ao IVG na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
“A França se tornou hoje o único país no mundo cuja Constituição protege explicitamente o direito à interrupção voluntária da gravidez, em todas as circunstâncias. E não descansaremos enquanto essa promessa não for cumprida em todo o mundo”, reiterou.
Nos arredores do Ministério da Justiça, milhares de pessoas também se reuniram para acompanhar o evento. Foi o próprio presidente que convidou cidadãos e cidadãs a participarem da cerimônia, uma constitucionalização legislativa aberta ao público pela primeira vez na história.
Após o discurso, Macron foi em direção à multidão com quem conversou durante quase uma hora.
Leia a matéria completa do portal RFI, parceiro do Metrópoles.