Brasileiros contam como é a vida pós-pandemia na Nova Zelândia
Enquanto a Nova Zelândia já está reaberta, a Austrália, que estava seguindo o mesmo caminho, precisou recuar e reimpor a quarentena
atualizado
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No sábado, feijoada com a família e, à noite bar, e festa com os amigos. No domingo, churrasco de aniversário e, para terminar o fim de semana relaxado, um filme no cinema, com pipoca. Tudo isso acontece no sonhos dos brasileiros. O Brasil, apesar de estar reabrindo agora alguns de seus serviços não essenciais, paralisados por conta da pandemia do novo coronavírus, ainda não pode ser considerado um país onde a vida voltou ao “normal”.
Mas existem brasileiros que já podem usufruir do “novo normal” da vida pós-coronavírus. Entretanto, eles não moram aqui: estão na Nova Zelândia. Naquele país da Oceania, a pandemia começou em 28 de fevereiro e, em 23 de março, a primeira-ministra Jacinda Ardern declarou estado de emergência, passando para o lockdown (bloqueio total) no dia 25 de março.
Somente em 29 de março foi registrada a primeira morta pela Covid-19 e hoje o total é de 22 vítimas, sendo que a última foi em 28 de maio, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Tempo de adaptação
Melissa Hecksher, de 40 anos, mora em Auckland, é professora de inglês para estrangeiros no país há 14 anos e viu todas as mudanças que a pandemia causou no país e na sua rotina.
A professora, que é natural de Santa Maria (RS), mas que diz que o coração é de Brasília, onde morou por mais tempo no Brasil, também precisou se adaptar às aulas on-line.
“Trabalhei de casa por 5 semanas e as aulas eram feitas pelo Zoom. Minha esposa e eu saíamos para caminhar pelo bairro no fim da tarde. Cozinhamos bastante, porque os restaurantes e take aways estavam fechados, e eu era responsável por ir ao supermercado. Ficou tudo muito calmo e quieto. Os passarinhos cantavam super alto”.
Da mesma forma que as medidas foram instauradas de maneira gradual, assim aconteceu com o relaxamento delas. O lockdown durou de 25 de março a 27 de abril. Depois disso, as coisas foram se normalizando aos poucos.
“No início, a grande mudança foi poder estender a ‘bolha’. Foi muito bom para famílias que não viam seus pais, ou netos, por 5 semanas, por exemplo. A gente incluiu uma amiga na nossa bolha. Ela é solteira e tinha passado o lockdown todo em casa, sozinha”, contou Melissa.
Apesar de as coisas estarem voltando ao normal por lá, Melissa teme pelo o que ainda está por vir no âmbito da economia. “O problema aqui, no momento, é o fato de as fronteiras estarem fechadas e isso tem afetado muito a economia, principalmente os setores de turismo e educação. Os alunos estrangeiros, por exemplo, não podem vir estudar no país e, com isso, várias escolas de inglês estão fechando e as universidades estão perdendo muito dinheiro”.
Self isolation
O paulista Domingos Capua, também de 40 anos, foi para a Nova Zelândia para estudar e chegou já durante o caos e próximo de o lockdown ser instalado, em 17 de março.
“Fiquei os primeiros 14 dias em ‘self isolation’ e não podia sair da acomodação. Mas depois já podia ir ao mercado comprar itens essenciais e comida. Também fazia caminhadas em dias alternados, mas sempre usando máscara. E minhas aulas eram on-line. Basicamente, estudava e assistia a filmes e séries pelo computador ou TV”, relatou.
Capua conta como foram os dias que antecederam a ‘real reabertura’: “Notei que os restaurantes estavam sendo higienizados novamente e os equipamentos das obras, sendo organizados. Assim que abriu, realmente mudou tudo. Passou a ter muita gente na rua, crianças passeando de bicicleta, restaurantes funcionando. O que era praticamente deserto, ganhou vida novamente”, disse o intercambista, que deixou a esposa Alliny e filho Miguel em casa, em São Paulo.
“Foi bem interessante. Os estabelecimentos limitaram o número de pessoas e era obrigatório fornecer nome, número de telefone e e-mail para possível contato no futuro”, complementou Domingos. “Durante a quarentena, a cidade realmente parou. Tinham várias locais em obra e tudo estava realmente parado. Achei incrível pois é bem diferente do que estamos acostumados no Brasil”.
Preocupação com o Brasil
A professora Melissa tem irmã, dois sobrinhos e tios, além de amigos que ela considera como se fossem da família, além dos parentes de sua esposa, morando no Brasil, e se preocupa com a situação da pandemia no país. “Infelizmente, o Brasil tem um presidente que é realmente o oposto da líder da Nova Zelândia, a Jacinda Ardern. Eu sinto muito por tudo que está acontecendo aí e fico muito preocupada com minha família e amigos”, desafabou.
“Felizmente, as pessoas da minha família podem trabalhar de casa. Elas estão rigorosas com a quarentena e só saem de casa para coisas extremamente essenciais (farmácia e supermercado)”, comentou Melissa.
Domingos também teme por sua família e amigos e cita os conflitos entre a pandemia e as decisões políticas. “Temos um país muito grande e se realmente trabalhássemos juntos os resultados seriam incríveis. Infelizmente, não confio nos números divulgados e acredito que se a decisão de fazer o isolamento tivesse sido tomada antes do Carnaval, estaríamos com números bem menores. Mas a população também precisa colaborar. Muita gente não faz como é orientada”, ressaltou.
Montanha-russa australiana
Dentro do intervalo de 1 mês, a Austrália viveu uma verdadeira “montanha-russa”: migrou de “país que caminha rumo à sociedade livre do coronavírus” e de estar próximo do fim da pandemia, em 29 de abril, para registrar o maior número de casos em 24 horas dos últimos 2 meses, em 29 de junho.
Nesse meio tempo, o país começou a retomar as atividades normalmente e realmente acreditou que tinha conseguido conter a pandemia de vez, após várias regiões não registrarem casos. Até que registrou a maior quantidade de infectados desde 11 de abril: 85 pessoas doentes em 24 horas.
Rapidamente, a Austrália decidiu tomar atitudes para combater o novo coronavírus e saiu na frente de muitos países nesse quesito. Porém, os dados atuais mostram que a decisão de reabrir foi feita muito cedo. No último dia 7 (julho), o país voltou a impor a quarentena aos australianos com o objetivo de voltar a conter os casos e, melhor ainda, as perdas.
E isso porque os números australianos estão bem longe dos observados no Brasil. Desde o início da pandemia, que foi em em 25 de janeiro, foram somadas 123 mortes — no Brasil, apenas o Mato Grosso do Sul, estado com menor número de óbitos, está perto desse número, mas também já o ultrapassou, tendo 228 mortes confirmadas pela Covid-19, de acordo com a atualização do Ministério da Saúde desta segunda-feira (20/7).
Já o pico de mortes na Austrália ocorreu em 5 de abril, quando 6 óbitos foram registrados, segundo informações da OMS.