Adriana Maria de Almeida e Wellington de Souza Lopes eram conhecidos entre os vizinhos pela “união e tranquilidade”. Apesar da fama boa do casal, todos já haviam escutado barulho de objetos quebrando e gritos saindo da residência deles. Mas, no dia 29 de setembro deste ano, foi o volume da música dentro do apartamento no Riacho Fundo que chamou a atenção do bairro.
Nenhuma das pessoas que moravam perto do casal sabiam: existiam duas ocorrências de Maria da Penha contra Wellington. Uma medida protetiva retirada por Adriana e uma tentativa de assassinato a facadas em 2017.
Doze horas depois da briga, os vizinhos e a família do feminicida abriram a porta com a ajuda de um chaveiro e encontraram o corpo de Adriana no chão, com um ventilador em cima. A mulher recebeu 32 facadas. O assassino saiu de casa com um saco de lixo. Até hoje está foragido. O casal tem uma filha de quatro anos.
A morte de Adriana é uma das dezenas de feminicídios que aconteceram este ano no Distrito Federal. Mais uma vez, a vítima recorreu às autoridades e ao equipamento de proteção fornecido pelo Estado, mas voltou atrás, em um exemplo típico do ciclo da violência tão alertado por especialistas. Novamente, uma mulher foi brutalmente assassinada por ser tratada como objeto de posse do companheiro.
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Neste perfil, o Metrópoles convidou o grupo de rap Donas da Rima, formado por Cris de Souza, Luana Euzébia e Thug Dee para musicar a história de Adriana Maria de Almeida. “O processo de escrever a letra se tornou, no meio do caminho, muito doloroso para a gente. Precisamos estudar o caso a fundo e ver a crueldade do Wellington. Somos mulheres da periferia e colocamos nas nossas rimas experiências que vivemos. Apesar de difícil, a construção nos libertou de alguns traumas”, explica Cris.
A rapper conta ainda que ter o nome do grupo estampado no projeto Elas por Elas é importante para empoderar e encorajar as mulheres a denunciar: “É o momento de nos fortalecer e mostrar para a sociedade que não aguentamos mais viver assim”, destaca.
Donas da Rima
Grupo de rap nascido no Distrito Federal, composto por mulheres. Juntas, além de música e entretenimento, levam ao público muito conteúdo abordando em suas composições temas como autoestima, equidade de gênero e violência urbana. Por meio do rap, evidenciam poesia, sonoridade e a cultura musical das periferias brasileiras.
Elas por elas
Neste 2019, o Metrópoles inicia projeto editorial para dar visibilidade às tragédias provocadas pela violência de gênero. As histórias de todas as vítimas de feminicídio do Distrito Federal serão contadas em perfis escritos por profissionais do sexo feminino (jornalistas, fotógrafas, artistas gráficas e cinegrafistas), com o propósito de aproximar as pessoas da trajetória de vida dessas mulheres.
Até sexta-feira (22/11/2019), 14.130 mulheres do DF já procuraram delegacias de polícia para relatar abusos, ameaças e agressões que vêm sofrendo por parte de maridos, companheiros, namorados ou pessoas com quem um dia se relacionaram. Já foram registrados 27 feminicídios. Com base em informações da PCDF, apenas uma pequena parte das mulheres que vivenciam situações de violência rompe o silêncio para se proteger.
O Elas por Elas propõe manter em pauta, durante todo o ano, o tema da violência contra a mulher para alertar a população e as autoridades sobre as graves consequências da cultura do machismo que persiste no país.
Desde 1° de janeiro, um contador está em destaque na capa do portal para monitorar e ressaltar os casos de Maria da Penha registrados no DF. Mas nossa maior energia será despendida para humanizar as estatísticas frias, que dão uma dimensão da gravidade do problema, porém não alcançam o poder da empatia, o único capaz de interromper a indiferença diante dos pedidos de socorro de tantas brasileiras.