Dois anos de governo Temer:
17 vezes que presidente recuou de decisões
Michel Temer (MDB) chegou à Presidência da República às 11h25 do dia 12 de maio de 2016, quase cinco horas após o afastamento de Dilma Rousseff (PT) pelo Senado Federal. Se sua ascensão ao Palácio do Planalto pode ser considerada rápida, o caminho para ele se manter no poder durante os dois anos seguintes foi, no mínimo, tortuoso. Em meio a denúncias de corrupção, demandas de parlamentares e à maior rejeição já registrada por um presidente da República na história, Temer conseguiu sustentação na dinâmica que se tornou marca do seu governo: o recuo.
Quando uma decisão foi mal recebida pela opinião pública – ou por seus aliados políticos –, o presidente não hesitou em voltar atrás. Sem lastro popular e dependente de uma dezena de partidos no Congresso, reeditou decretos, cancelou medidas e desistiu de promessas, cumprindo o dogma que ele mesmo traçou em seu primeiro mês de governo: “Quando houver equívoco, tem de rever a posição”.
Da extinção do Ministério da Cultura à nomeação de Cristiane Brasil ao Ministério do Trabalho, aqui estão todas as vezes que, para salvar o governo, Temer teve de dar um passo – ou vários – para trás.
- Mai – 2016
Corte de Ministérios
Quando ainda era vice-presidente, Temer anunciou que, ao assumir o Planalto, cortaria pelo menos 10 dos 32 ministérios. Após a proposta de “enxugamento” da máquina pública pegar mal com os dirigentes partidários, interessados na cota política da Esplanada, o emedebista recuou: a degola atingiu somente três pastas. Ao final, ele assinou uma medida provisória extinguindo seis postos do primeiro escalão.
- Mai – 2016
Ministério da Cultura
Entre os ministérios cortados por Temer estava o da Cultura, que foi incorporado ao da Educação. A medida teve forte reação da classe artística. Uma semana após anunciar o fim do MinC, o presidente informou que “recriaria” a pasta, comandada pelo então secretário nacional, Marcelo Calero. Ele permaneceu seis meses no cargo antes de ser responsável pela demissão do então chefe da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, acusado de exercer pressão política sobre Calero e subordinados.
- DEZ – 2016
Velório da Chapecoense
Com medo de vaias e protestos, Temer decidiu receber familiares das vítimas do acidente aéreo da Chapecoense em uma cerimônia reservada, no aeroporto de Chapecó (SC). O anúncio não caiu bem para amigos e parentes das vítimas, que consideraram “desrespeito” e “falta de dignidade” do presidente com os jogadores mortos. O político mudou de ideia e compareceu ao velório coletivo, na Arena Condá. Durante o evento, não foi vaiado. Nem aplaudido.
- Mai – 2017
Forças Armadas na Esplanada
Em reação à depredação de prédios públicos durante um protesto com quase 45 mil pessoas, na Esplanada dos Ministérios, contra as reformas do governo, Temer assinou um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e acionou as Forças Armadas para que fosse feita a segurança do Patrimônio da União em Brasília. O gesto gerou rusgas dentro do próprio governo: o então ministro da Defesa, Raul Jungmann, e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), negaram a “paternidade” da medida. Um dia depois, o texto foi revogado pelo Planalto.
- Jun – 2017
Lista Tríplice da PGR
Após cogitar não escolher um nome para a Procuradoria-Geral da República (PGR) da lista tríplice indicada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), tradição mantida por presidentes desde 2001, Temer recuou e apontou Raquel Dodge para o cargo. Pela primeira vez em 14 anos, contudo, a opção do Planalto não foi o primeiro colocado na votação realizada entre membros do Ministério Público. Dodge ficou em segundo lugar.
- Jun – 2017
Delações da JBS e jato particular
Em sua delação premiada, o empresário Joesley Batista entregou diários de voo ao Ministério Público que registravam uma viagem de Temer e sua mulher, Marcela, em um jatinho da JBS para Comandatuba (BA), em 2011. Na ocasião, o governo emitiu nota oficial reconhecendo a viagem em um avião da FAB. Um dia depois, admitiu que o trecho foi concluído na aeronave privada. Mas ressaltou: Temer não sabia de quem era o avião.
- Jul – 2017
Participação no G20 na Alemanha
Em meio à tramitação da denúncia enviada pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, na Câmara dos Deputados, o Planalto havia anunciado que Temer não compareceria à reunião do G20, na Alemanha. Para demonstrar “normalidade” administrativa, contudo, o presidente voltou atrás e viajou para Hamburgo. Mas retornou a Brasília antes do encerramento do evento.
- Set – 2017
Ministros denunciados
Após anunciar, em fevereiro, que afastaria temporariamente ministros denunciados no âmbito da Operação Lava Jato, Temer resolveu manter no governo seus dois maiores aliados: Moreira Franco, na Secretaria da Presidência, e Eliseu Padilha, na Casa Civil. Os dois foram alvo de denúncia da PGR – junto com o presidente – por organização criminosa. Moreira e Padilha ocupam, até hoje, ministérios na Esplanada.
- Set – 2017
Extinção da Renca
Sob críticas de entidades ambientais e da mídia internacional, Temer decidiu revogar o decreto que extinguia a reserva Reserva Nacional do Cobre Associados (Renca), na Região Amazônica. O documento havia sido sancionado pelo presidente em agosto. Até mesmo a modelo Gisele Bündchen entrou na briga e defendeu a manutenção da reserva nacional.
- Nov – 2017
Reforma ministerial
Com a aproximação do ano eleitoral, Temer anunciou que faria uma ampla reforma no fim de 2017 e exoneraria todos os ministros com intenções de concorrer a cargos eletivos. Após reação negativa de partidos da base, o presidente realizou apenas mudanças pontuais e deixou para 2018 as trocas no primeiro escalão.
- Nov – 2017
Posse de Marun
Após anunciar a ida do deputado federal Carlos Marun (MDB) para a Secretaria de Governo, o Palácio do Planalto recuou e adiou a nomeação do aliado. A informação havia gerado mal-estar com o tucano Antonio Imbassahy (PSDB), que ainda ocupava a pasta e soube da substituição pela imprensa. A posse de Marun aconteceu apenas em 15 de dezembro.
- Dez – 2017
MP do Trabalho Escravo
Em outubro, o governo foi alvo de duras críticas após editar uma portaria que flexibilizava a caracterização de condições de trabalho análogas à escravidão, por meio do documento que ficou conhecido como Portaria do Trabalho Escravo. A medida foi duramente criticada e chegou a ser suspensa após liminar do Supremo Tribunal Federal (STF). Em dezembro, Temer recuou e editou uma nova matéria, voltando atrás das mudanças na legislação.
- Fev – 2018
Cristiane Brasil
Após dois meses de um imbróglio judicial, Temer voltou atrás e abriu mão da nomeação de Cristiane Brasil ao Ministério do Trabalho. A deputada federal é filha do presidente do PTB, o ex-deputado federal condenado no Mensalão Roberto Jefferson. A indicação de Cristiane começou a ser questionada após a revelação de duas condenações contra a parlamentar na Justiça do Trabalho. Em uma queda de braço com o Supremo pela posse, o Planalto recuou.
- Fev – 2018
Reforma da Previdência
A PEC da reforma da Previdência foi uma das principais bandeiras do governo Temer. O texto chegou a ser aprovado em uma comissão especial da Câmara dos Deputados, mas teve a tramitação “congelada” após o envio de duas denúncias contra o presidente ao Congresso. Temer usou o capital político que pôde para manter a proposta viva, mas, sem os 308 votos necessários para a aprovação do texto, renunciou à reforma ao decretar intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro. Segundo a legislação brasileira, a Constituição não pode ser alterada em períodos de exceção, como durante uma intervenção.
- Mar – 2018
Extrato bancário
Quando o ministro do STF Luís Roberto Barroso determinou a quebra de sigilo bancário do presidente da República, Temer apressou-se em anunciar que divulgaria publicamente seus extratos bancários como prova de inocência. Aliados políticos e juristas o aconselharam do contrário e o Planalto não tocou mais no assunto. Até hoje, os documentos nunca foram liberados.
- Abr – 2018
Aumento do Bolsa Família
O reajuste previsto para o Bolsa Família em 2018 era de 3%, segundo a equipe econômica. Aliados políticos convenceram, contudo, o presidente a mudar de ideia: o valor seria um pouco acima da inflação do ano passado, de 2,95%. Em busca de popularidade, Temer anunciou um reajuste de 5,6% no programa.
- Abr – 2018
Reeleição
Temer reforçou inúmeras vezes ao longo dos últimos dois anos que o seu governo seria “de transição”. A melhora no emprego e nos índices econômicos levantou, no entanto, as ambições eleitorais do presidente e dos seus homens fortes no governo, que passaram a acreditar em uma candidatura do MDB em 2018. As pretensões foram assumidas publicamente em março, em entrevista do presidente publicada pela revista IstoÉ. De lá para cá, contudo, diante dos pífios desempenhos nas pesquisas de intenção de votos, Temer tem admitido a ideia de desistir da reeleição para apoiar um candidato de centro. Para outubro, o cenário ainda é incerto.