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Qual o nosso papel para combater o racismo?

As crianças constroem concepções com base em suas vivências e é preciso promover reflexões sobre diversidade de maneira leve

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Sábado de sol, calor e praia, eu chego perto do Miguel, de quase 5 anos, e digo: você está ficando pretinho! Que lindo! Ele me olha, injuriado: eu não quero ficar pretinho! Eu não gosto!

Levo um susto tremendo, tento dizer a ele que isso é uma bobagem e que pretinho é lindo, sim. Ele não se convence, e eu fico tentando entender de onde ele tirou essa ideia.

“As crianças, por vezes, carecem de referências positivas de pessoas negras. Elas não têm coleguinhas negros, os pais também não têm amigos assim, o pediatra tampouco é dessa cor”, contextualiza a pedagoga Clélia Rosa, mestre em Educação e cocriadora do Luderê Afro Lúdico, um coletivo que promove a imersão nas culturas africana e afrobrasileira.

“Quando há o relacionamento com pessoas negras, é sempre alguém em uma condição socioeconômica diferente da que a criança está inserida. É a tia da escola, o porteiro”, acrescenta.

Clélia aponta que meninos e meninas constroem concepções com base em suas vivências e existe a  possibilidade de promover reflexões sobre a diversidade de maneira leve. Ela cita o exemplo de um amigo negro, que, ao comprar pipoca de um homem da mesma cor, foi questionado por um menino branco se eles eram da mesma família. “Meu amigo foi conversando com o garoto e explicando o fato de ele e o pipoqueiro terem a mesma raça não significava que eram iguais”, recorda.

Na ocasião, a família do menino ficou desconcertada com o diálogo. “Pais e mães devem se perguntar se estão realmente dispostos a educar para a diversidade”, diz a especialista. “Há uma ideia errada de que a pauta racial é da população negra. Isso é um equívoco, que leva a muitos outros. A educação racial precisa ser trabalhada com todos”.

Em casa, além de conversas com as crianças sobre a forma como elas veem o mundo e situações corriqueiras, é importante tomar cuidado com a linguagem. Muitas expressões – “a coisa está preta” – são pejorativas e carregadas de preconceitos.

É necessário, também, fazer uma autocrítica – processo que parece estar longe de ser iniciado em nossa sociedade. Uma pesquisa realizada pelo Ibope Inteligência em 2017, sobre as práticas discriminatórias dos brasileiros, revelou que só duas em cada 10 pessoas se consideram preconceituosas. Entretanto, 73% admitiram ter falado frases discriminatórias na vida.

“No caso do racismo, isso decorre de uma não compreensão de que essa é uma pauta de toda a sociedade brasileira. As pessoas brancas também precisam participar dessa discussão”, reforça Clélia.

E o papel da escola?

A pedagoga já fez assessoria para diversos colégios de São Paulo e afirma que os currículos escolares devem incluir estratégias para a apresentação de referências negras positivas que extrapolem as datas comemorativas ou o debate no contexto da escravidão, por exemplo. “Há negros e negras ocupando diferentes papéis na sociedade, isso precisa ser levado às crianças”, defende.

Um exemplo é o aprendizado sobre música, ainda muito focado nos compositores brancos europeus. “É claro que é importante falar sobre Beethoven e Mozart, mas por que não falar também de Pixinguinha, um compositor negro, brasileiro, autor de canções belíssimas?”, questiona.

Ela também ressalta ser importante trazer o contexto de resistência em que surgiram muitas manifestações culturais do povo negro. “Não adianta oferecer aula de capoeira para as crianças se não há uma explicação sobre a história da prática”, critica. “A escola é uma instituição de construção de conhecimento. O que ela tem ensinado sobre a população negra do Brasil e do mundo?”

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