Por que devemos falar sobre sexualidade com crianças
Quando elas aprendem aprende sobre o seu corpo se tornam empoderadas
atualizado
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Se você não esteve isolado em uma caverna nos últimos dias, deve ter visto a polêmica em torno da entrevista do candidato do PSL à Presidência da República no Jornal Nacional. Em dado momento, Jair Bolsonaro resolveu ressuscitar a história do “kit gay”, sacando um livro de baixo da bancada e dizendo que se tratava de pornografia distribuída pelo governo em escolas públicas. A obra era Aparelho Sexual e Cia., publicada pela Companhia das Letras em 2007, mas atualmente fora de catálogo.
Em 2011, o Ministério da Educação havia produzido materiais didáticos para o projeto Escola sem Homofobia, para a discussão de assuntos relacionados à sexualidade entre jovens. Deputados conservadores – entre eles, Bolsonaro – quiseram acabar com a iniciativa, apelidando-a de “kit gay” e espalhando a ideia de que incentivaria a promiscuidade. O estardalhaço fez com que o governo cedesse à pressão.
Para além das questões levantadas por Bolsonaro no JN – o livro não é pornográfico e tampouco foi adquirido como material didático pelo Ministério da Educação (em nenhum momento, nem na concepção do Escola Sem Homofobia) –, a dúvida é: deve o Estado atuar para a promoção da educação sexual de crianças? E da diversidade?
Estou convencida de que, sim, é papel do Estado trazer à escola esse tipo de debate, principalmente à escola pública, frequentada por quase 75% das crianças brasileiras. As instituições de ensino são espaços não apenas para meninos e meninas aprenderem ciências, matemática ou português, mas para que discutam, de forma adequada à cada faixa etária, tipos e prevenção a abusos sexuais e a doenças sexualmente transmissíveis – entre outras coisas. E isso só se faz falando de sexualidade.
Uma criança que aprende sobre o seu corpo – se possui um pênis, uma vagina ou, até mesmo, algo que não se enquadre nesses dois grupos – se torna empoderada. Mais ainda quando é ensinada que o corpo pertence a ela e somente a ela, e ninguém, especialmente adultos, pode vir se esfregar ou fazer coisas que ela não queira.
Responder de forma objetiva a questionamentos sobre sexo também é importante e, em momento algum, leva à promiscuidade. Muito mais danoso é quando crianças têm acesso a músicas e danças hiperssexualizadas, sem filtro e a qualquer hora. Assim como falar de pessoas que se apaixonam por outras do mesmo sexo não transforma ninguém em homossexual.
Educar para o convívio e o respeito às diferenças deveria ser uma prioridade. Infelizmente, o discurso moral, que desconsidera tudo o que já foi cientificamente provado e se sustenta no medo e nas frases feitas, parece estar levando a melhor.
Uma pena para um país em que 70% dos casos de abuso sexual ocorrem com crianças e adolescentes e em que, a cada 19 horas, morre uma pessoa gay, lésbica ou transexual.