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Em tempos de relatos sobre abuso, não duvidem das meninas

As crianças são as principais vítimas da violência sexual no nosso país

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Children having fun.
1 de 1 Children having fun. - Foto: iStock

Na aula de pilates, em meio a mil opiniões sobre as denúncias contra João de Deus, uma das colegas questiona o fato de as vítimas terem demorado para se pronunciar. Outra quer saber por que a moça violentada na companhia do pai (que estava na mesma sala, mas de costas para a cena) não reagiu. “Se fosse comigo, eu teria gritado na hora”, diz.

Eu poderia dizer que não devemos medir os outros pela nossa régua, mas não é apenas isso. Vítimas de abusos sexuais não costumam relatar o que sofreram, principalmente, por vergonha e por medo de serem desacreditadas.

As histórias são muitas. Lá no pilates mesmo, uma das professoras contou que, há alguns anos, durante uma cavalhada religiosa, foi ameaçada por um grupo de homens. Ela estava acompanhando o sobrinho, a cavalo, quando um dos integrantes do bando lhe disse: “você tem sorte de estar com ele (a criança), senão ia ver o que faríamos com você”. Assustada e aos prantos, ela foi contar à família. Ao invés de palavras de acolhimento, ouviu: “mas o que você estava fazendo?”.

Outra jovem lembrou que, quando adolescente, o pai da melhor amiga se masturbou na frente dela. Disfarçando o ato com uma caixa de ferramentas, o homem a olhava sem parar, e ela só conseguiu sentir nojo e medo. “Imagina se eu ia contar uma coisa dessas para a mãe da minha amiga!”, diz.

É uma lógica perversa essa nossa, pois impõe à vítima – sempre e invariavelmente – o ônus da dúvida. “Mas tem certeza?”, “O que você estava fazendo na rua até aquela hora?”, “Andando com essa roupa, esperava o quê?”. Injusto e cruel demais para mulheres adultas, imagine, crianças.

E são elas, tristemente, as principais vítimas da violência sexual no nosso país. Um levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com base no sistema do Ministério da Saúde, apontou que 70% dos estupros são praticados contra crianças e adolescentes. Na grande maioria dos casos (56,3%), o agressor é conhecido da família – pai, padrasto, avô ou alguma outra figura próxima da criança.

É por conta disso que as escolas devem oferecer educação sexual. Não se trata de ensinar sexo a meninos e meninas, longe disso, mas sim, esclarecer quais comportamentos não podem ser tolerados, em linguagem e com recursos apropriados para cada faixa etária. Se nossas crianças não souberem os limites do contato físico, como poderão se defender?

Também precisamos, os adultos, nos prepararmos para acolher esse tipo de relato, por mais desconfortável que possa ser. Abusadores não são pessoas desajustadas, que têm obrigatoriamente uma cara de mau. São pessoas comuns, que vivem entre nós.

Há alguns meses, li um relato emocionado no Facebook sobre a importância de acreditarmos na palavra das vítimas de violência. A moça contava que, quando criança, foi abusada pelo porteiro do prédio – uma figura muito querida por todos. Ela contou à irmã mais velha, que repassou aos pais. Houve uma reação enérgica, o homem foi afastado e processado. A menina fez terapia e superou, sem que isso se transformasse em um fantasma em sua vida. Tudo porque ninguém, em nenhum momento, colocou em dúvida o que ela e a irmã contaram.

Por isso, ensinem as crianças (principalmente as meninas) sobre seus corpos. E jamais duvidem delas.

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