Amamentação: Somos um pouco “vacas”, mas isso não deixa nada fácil
Biologicamente, a grande maioria das mulheres pode dar o peito. O problema é que o sucesso da amamentação não depende só disso
atualizado
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Na madrugada do último domingo (31/7), a apresentadora de TV Ana Maria Braga provocou polêmica ao dizer, durante o programa Altas Horas, que todas as mulheres que dão à luz são “como vacas”, têm leite e, portanto, podem amamentar.
Mães postaram uma enxurrada de comentários nas redes sociais, relatando suas experiências e criticando o fato de serem responsabilizadas exclusivamente pela amamentação. “Eu não pude amamentar. Antes de culpar as mães, vamos nos aprofundar mais no assunto”, sugeriu uma usuária.
Embora a comparação com as vacas não seja muito simpática, entendo um pouco o que Ana Maria Braga quis dizer. E ela está certa. Biologicamente, a grande maioria das mulheres pode dar o peito. O problema é que o sucesso da amamentação não depende só disso. Há fatores sociais, econômicos e emocionais envolvidos no processo.
Tudo começa antes mesmo de as mulheres deixarem o hospital. Uma pesquisa realizada pela bióloga Ligia Moreiras Sena revelou que 70% recém-mães não são incentivadas a amamentar nas instituições de saúde. Muitas vão para casa já com uma prescrição de complemento artificial, just in case.
Além da falta de apoio profissional, as mães também precisam enfrentar a pressão social. “Seu leite é fraco!”, “Esse menino está com fome!”, “Dá logo uma mamadeira para ela!” são algumas das frases que as recém-paridas ouvem com frequência. Imersas na turba de hormônios do pós-parto, cheias de dúvidas e ainda aprendendo a ajustar a “pega” correta do bebê ao peito, muitas acabam recorrendo à formula.Escolhas
Uma outra questão são as realidades e escolhas de cada uma. Por exemplo, já está comprovado que um dos fatores de sucesso da amamentação é a livre demanda (o bebê mama sempre que deseja, não em intervalos pré-estabelecidos). Muitas mulheres, contudo, não consideram que isso seja o adequado dentro de sua dinâmica familiar. E tudo bem.
Mas é preciso ter em mente que a produção de leite só acontece quando o bebê suga, se isso ocorre com menos frequência, é natural que o leite vá secando.
Há também as mães que não querem amamentar, seja por questões estéticas ou por praticidade (a mamadeira pode ser terceirizada). Como defensora da autonomia feminina, acredito que essa é uma escolha individual. Se tomada com consciência de perdas e ganhos, tudo bem também.
E quando não dá certo?
Há, ainda, as mulheres que não conseguiram amamentar, por problemas de saúde ou por dificuldades no ganho de peso do bebê. A publicitária Isabela Almeida, 31 anos, sonhava em dar o peito para a filha Lara, hoje com 1 ano e 4 meses, mas um quadro violento de hipoglicemia – que fez a menina perder 35% do peso – a obrigou a dar fórmula para a criança 10 dias depois do parto.
Lara largou o peito e recuperou o peso, e Isabela precisou lidar com as feridas de todo o processo. “Eu tinha medo de que minha filha não me identificasse como mãe. Hoje sei que isso é uma grande bobagem, nossa química existe e é forte”, conta Isabela.
A jornalista Tais Rocha, 37 anos, também sofreu com a perda de peso do filho Luca, hoje com 6 anos. Ela lembra que o menino teve a “pega” incorreta desde o início, e, depois de um mês, as pessoas passaram a perguntar se ele era prematuro. “Eu me culpava demais por isso, foi uma fase muito ruim”, diz.
Hoje, Tais e Isabela aprenderam a superar o trauma da não amamentação e a não se julgar incapazes por isso. “A gente se torna mãe para entender que vamos ser regidas por uma outra vida, por uma outra necessidade. O tempo não é mais nosso”, resume Isabela.