As prioridades são a saúde e a alimentação do povo
Para o colunista, a prioridade total é mais do que salvar vidas. É preciso dirigir a economia e o Estado para esses objetivos
atualizado
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A questão colocada por Bolsonaro — não só por ele, mas também por setores do mercado — é salvar vidas ou a economia. Não discutirei a premissa dos que, como Bolsonaro, querem salvar a economia por considerar a pandemia uma conspiração, subestimando-a por sua absoluta improcedência científica. Na verdade, uma cortina para esconder seu objetivo político: preservar o próprio mandato.
O fato é que a prioridade total não é só salvar vidas, mas colocar a economia e o Estado a serviço deste objetivo. Explico: todas as nações têm planos de Estado-Maior para cenários e situações de guerra, catástrofes e calamidades, de reconversão da indústria, serviços, comércio e logística para enfrentar tais crises.
Se nossas Forças Armadas, principalmente o Exército, que nos custa mais de R$ 100 bilhões por ano, não os têm e nossa indústria e suas entidades, sustentadas pelo dinheiro público, são incapazes de traçar estas estratégias, cabe ao Parlamento, aos empresários e aos sindicatos, por suas entidades, à sociedade organizada, fazê-lo.
Devemos dirigir a economia e o Estado, inclusive as Forças Armadas, para dois objetivos: a saúde e a alimentação do povo, além do funcionamento dos serviços públicos, como água, luz, telecomunicações, o que for essencial na indústria, no comércio, nos serviços e principalmente na agropecuária e no transporte de carga em geral. Fazer com que o povo tenha assistência médica hospitalar, comida e principalmente renda para sobreviver pelo menos por 6 meses ou um ano.
Segunda regra básica é a solidariedade universal de cada um segundo sua participação na riqueza e renda nacional. Que os ricos — os 1% e os 10% mais ricos — contribuam respectivamente na proporção de suas participações na renda nacional, quase 30% e 50%.
Deixando de lado as posições criminosas da falácia da “mitigação”, devemos colocar o Estado e a economia a serviço da salvação nacional e aproveitar a crise para aprender sobre a fundamental importância da saúde pública e de consolidar o SUS, a nossa rede de proteção social, o BPC, o Bolsa Família, o seguro-desemprego, a Previdência Social, a renda mínima, o abono salarial, a educação pública e gratuita, a pesquisa cientifica e a inovação, a universidade pública, setores fundamentais que vinham sendo literalmente abandonados pelo governo atual.
No caso dos estímulos para as empresas e renda para os trabalhadores, a equipe econômica de Bolsonaro, prisioneira ideológica do ultraliberalismo, insiste em não socorrê-los. E quando o fazem são medidas em doses homeopáticas, com resultados desastrosos, uma brutal recessão e um desemprego em massa sem proteção social. Sabotam na verdade tanto o isolamento social, estimulando a reabertura de serviços, quanto a ajuda à economia.
A lição desta crise mudará nossa economia e o país. Espero que sejamos capazes de superar a crise fazendo uma reforma tributária para sustentar o estado de bem-estar e distribuir renda, pondo fim a uma das piores tributações do mundo, concentradora de renda e de riqueza. O momento é de emergência nacional. O Congresso e a maioria dos governadores, independentemente de partido, já entenderam a dramaticidade da situação. É necessário criar condições para que as empresas sobrevivam e garantam, com o apoio do Estado, em primeiro lugar os empregos e renda para as famílias e a demanda mínima para mitigar a recessão – esta, inevitável.
É preciso reorganizar o aparato produtivo do comércio, de serviços e de logística do país utilizando o poder do Estado, do Tesouro, do Banco Central, via crédito, compras governamentais postergação de impostos e dívidas que devem ter uma ampla renegociação nacional para famílias e empresas. Isso é o que fazem os demais países.
Não podemos seguir na contramão, perder tempo com jogos de cena de um presidente da República errático e irresponsável, que joga para a plateia, e criminosamente subestima a pandemia. E, pior, tenta aproveitá-la para uma luta política insana e destrutiva da própria democracia para a qual ele e seus acólitos em nada contribuíram como prova a história recente de nosso Brasil.
* Este texto representa as opiniões e ideias do autor.