Evangélico e antiaborto: conheça Mirko Giannotte, juiz sondado ao STF
Candidato do MT foi indicado pela Associação dos Magistrados Estaduais e defendeu Bolsonaro: “O que precisa é deixar o homem trabalhar”
atualizado
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Com a indicação endossada pela Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages), entidade que presidiu por dois triênios e na qual permanece no conselho presidencial, o juiz Mirko Vincenzo Giannotte, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), é um dos nomes que disputa a cadeira a ser liberada no Supremo Tribunal Federal (STF) com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello, prevista para 5 de julho.
De berço evangélico e “muito conservador na defesa dos costumes” – como se autodefine – , o magistrado passou a ser uma opção de escolha do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como alternativa ao atual cabo de guerra entre os nomes tidos como favoritos para a vaga: a do ministro Humberto Martins, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), e de André Mendonça, da Advocacia-Geral da União (AGU), além de Augusto Aras, procurador-geral da República.
Para as andanças entre compromissos com a associação e conversas de bastidores no centro do poder, Giannotte esteve em Brasília, na última sexta-feira (11/6), quando recebeu a reportagem do Metrópoles para uma conversa que durou pouco mais de 1h45. Na entrevista, realizada no hotel onde estava hospedado na capital federal, defendeu a “reaproximação do Supremo com a sociedade”, elogiou o governo Bolsonaro e afirmou estar disposto a ocupar o cargo vitalício mais importante do Poder Judiciário.
“Olha, imagina uma mulher, uma menina que é rainha do rodeio de Jaguariúna, em São Paulo, e perguntam a ela se ela não quer ser Miss Universo. É claro que ela quer ser Miss Universo. Agora, pergunte para um juiz, né? Eu tenho 20 anos de magistratura e dez de advocacia. Quem não gostaria de ser ministro do Supremo Tribunal Federal?”, animou-se.
Nascido em Santos, litoral paulista, Mirko Giannotte disse que ter o próprio nome referendado pela Anamages – entidade que representa três mil juízes estaduais do país – é um ativo importante, mas pontuou que outros critérios serão levados em conta por Bolsonaro, o qual já declarou ter interesse em nomear alguém de perfil “terrivelmente evangélico”.
“Eu sou um evangélico de berço. A minha mãe é imigrante italiana, de origem judaica, e chegou aqui em 1953, com apenas 6 anos. Ela se tornou evangélica aqui, se tornando ‘assembleiana’, da Assembleia de Deus. Claro, eu sempre olhei, obedeci e ouvi os preceitos, a Bíblia estava presente sempre na minha casa. Dessa forma, se minha mãe é evangélica, eu que sou do ventre dela evidentemente também sou. Frequento uma igreja aqui no Jardim Botânico, em Brasília”, contou.
No exercício da magistratura, em 2017, enfrentou a acusação de ter recebido no contracheque um valor turbinado de mais de R$ 500 mil, o que gerou debate sobre privilégios no Poder Judiciário e despertou uma investigação já encerrada no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
“Durante 13 anos, eles recolheram determinado valor do salário dos juízes e eu fui lá e cobrei, mas não fui o único. Foram 83 juízes que ganharam, só que recebi mais, porque eles me designavam em comarcas distantes, o que me garantia um adicional, sem que me pagassem. Nós cobramos e veio tudo de uma vez. Só que o Portal da Transparência falou que era salário, mas não era. Foi o acumulado de anos e anos”, explicou.
Proximidade com a população
O juiz está no segundo casamento e tem dois filhos: uma bacharelanda em direito, de 23 anos, e outro, estudante de 16. Na corrida pela preferência bolsonarista, Giannotte apresenta credenciais conservadoras, como ser totalmente contrário à legalização da maconha e do aborto, o que afirmou estar reavaliando em casos de estupro. Questionado sobre os próprios atributos que poderiam turbinar a preferência presidencial, Giannotte preferiu elogiar os possíveis adversários.
“Antes de falar do meu diferencial, tem um concorrente meu, o ministro André Mendonça, que é meu conterrâneo – ambos nascemos em Santos. E alguns outros, evidentemente, de diversos locais do país, são extremamente gabaritados. Eu não acho que tenho que convencer o presidente. Eu acho que é o presidente que tem de ser convencer de que eu, A, B ou C seja o melhor para sacramentar a escolha pessoal dele, conforme a Constituição prevê. Deus está acima de tudo, e eu tenho a certeza de que vai iluminá-lo para que escolha o melhor, seja quem for”, despistou.
Na investida para ocupar a próxima cadeira na mais alta Corte brasileira, o juiz do tribunal mato-grossense defendeu uma reaproximação entre o Supremao e a população. Uma das promessas, caso tenha o nome sacramentado, é de reservar parte da agenda para visitar instituições de ensino infantil, universidades e para a possibilidade de comandar aulas magnas para acadêmicos. Ele também reclamou sobre o fato de ensinos cívicos terem sido excluídos do currículo escolar obrigatório.
“Eu torço para seja alguém que aproxime um pouco o povo do Supremo Tribunal Federal. A Justiça Estadual é aquela que está mais próxima do povo. Tanto na questão do milhão, do bilhão, quanto do centavo e do real. Ultimamente, o povo não anda vendo o Supremo como Poder Judiciário. Se alguém tocar o coração dos 11 ministros que lá estão hoje para debaterem esta ideia, tenho certeza de que eles, ainda que não tivessem nenhuma vaga para ser preenchida por agora, tenho certeza de que o povo acataria. Não sou a voz do povo, mas se eles mesmos fizessem uma reflexão, acho que eles iriam um pouco mais perto da população.”
STF e pandemia
O juiz Mirko Vincenzo Giannotte também foi um dos magistrados que orbitou como protagonista nas ‘judicializações’ durante a gestão da pandemia no país. Em Mato Grosso, ele deferiu liminares para acabar com o toque de recolher e para flexibilização do horário de funcionamento de bares e restaurantes, a pedido dos próprios empresários, além de ter se posicionado de forma contrária ao fechamento de igrejas e templos religiosos.
O magistrado também avaliou como correta a decisão do Supremo de garantir aos estados e municípios a possibilidade de criar ações de enfrentamento à pandemia, mas defendeu que isso deveria ocorrer “sem abusos das autoridades”. Contudo, negou que o posicionamento fosse um aceno para agradar o titular do Palácio do Planalto, uma que Bolsonaro dispara constantemente contra as medidas restritivas.
Ao comentar sobre a flexibilização de funcionamento de bares e restaurantes, por exemplo, que geram aglomerações e estão sempre no radar das autoridades da fiscalização, o magistrado defende o entendimento de suas liminares. Na visão dele, faltou por parte dos chefes de executivos, por exemplo, um maior controle de comercialização de bebidas alcoólicas, principalmente nesses estabelecimentos, responsáveis – segundo ele – pelo descontrole comportamental em ambientes coletivos.
“Os lojistas perceberam que você aglomerava, ainda que com todas a biossegurança, todas as cautelas. Então, o vírus não vai te avisar, pedir licença para que o público se retire do local daqui a cinco minutos para que [só então] comece a infectar. A ciência há de ser respeitada, sem dúvida nenhuma, sobretudo por quem não é um cientista como eu. Só que a ciência, ela mesma, tem as suas confusões e tem as opiniões diferentes entre si: um diz A e o outro diz B, não é verdade? Eu busquei, observei e trouxe mais uma vez para dentro do processo a agenda do bom senso.”
O candidato ao Supremo Tribunal Federal também avaliou que a China tem responsabilidade parcial pela proliferação do vírus no mundo, já que os cidadãos daquele país viajaram para visitar parentes durante períodos de folga do trabalho e circularam por vários lugares do mundo.
“O povo chinês come rato, barata, mas isso não é e nunca foi cultural. É uma herança do comunismo do mal, porque eles não tinham o que comer. E aquilo se tornou algo deles. Se tornou uma cultura, não é nada milenar. Não sei se sabe, mas o chinês não tem férias, mas ele tem o mês de janeiro para descansar. E aí, o que aconteceu? Essas pessoas foram visitar os parentes, por isso que veio essa explosão do vírus, a explosão do vírus começou a partir de janeiro do ano passado, exatamente por causa disso. Como falaram no nosso Carnaval, né? Na hora que tiver o Carnaval, vai todo mundo aglomerar e vai acontecer aquela coisa também.”
Bolsonaro
Perguntado sobre como avalia a gestão do atual presidente, no recorte da visão de um cidadão, Mirko Giannotte afirmou que parte da população tem dificultado as ações de Bolsonaro no comando do Brasil. Ele também disse não acreditar na possibilidade de uma possível terceira onda causada pelo novo coronavírus e suas variantes.
“Como cidadão, eu aprovo as intenções do presidente Bolsonaro. As intenções do presidente Bolsonaro, até aqui, se demonstram sempre as melhores. O presidente é a mesma pessoa desde quando ele começou, na década de 1990, como deputado federal. As pessoas falam: ‘Ah, o presidente Bolsonaro é isso, é exagerado’, é aquilo, outros até usam alguns adjetivos piores, né? Mas eu não. O que precisa é deixar o homem trabalhar, e eu falo em trabalho genérico, fazer as obras e as inaugurações”, defendeu.
Com a linha de atuação na magistratura avaliada por ele próprio como humanista, Mirko Giannotte também criticou a parte da população que acusa o titular do Palácio do Planalto de ser “negacionista”. “Não acho que ele seja negacionista. Eu acho que o presidente é realista, ele só não é pessimista”, pontuou.
O magistrado evitou comentar a recente decisão do Supremo que anulou as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e transferiu os processos para serem reiniciados na Justiça Federal de Brasília. Ele reconheceu que o ato mexeu no tabuleiro eleitoral do ano que vem.
“Existe uma coisa que chama-se lei, e a lei não é a mídia. Não há de se decidir por pressão ou por outra questão qualquer, mas sim de acordo com a Constituição. No entendimento do ministro, ele não anulou o processo, ele não anulou os crimes. Ele anulou o procedimento, que é de ordem pública. Ainda que não tivesse sido pedido, se ele entendesse que aquilo era completamente ao arrepio procedimental, poderia tê-lo feito de ofício.”
Maconha, aborto e LGBTQIA+
Defensor público das pautas conservadoras, o juiz estadual Mirko Giaonette afirmou ser “determinantemente contra o aborto”, mas decidiu reavaliar a sua posição quando se tratar de casos resultantes de estupros e violências sexuais. Contudo, manteria a proibição inclusive para bebês com anencefalia. “Mesmo se nascer para viver apenas duas horas, Deus deu a ordem para ser concebido, né? Digamos assim, Ele é que tem a ordem de tirar”.
Da mesma forma, embora sinalize uma possibilidade sobre o uso medicinal para doenças específicas, posicionou-se de forma contundente contra a liberação do uso recreativo da maconha. “Sou totalmente contra. Mas, no caso medicinal, você tem como tirar extratos dela, como você tira até da cocaína para criar anestésicos. Mas esse negócio de você liberar maconha, porque na Holanda é liberado, sou completamente contrário.”
O magistrado reconhece a legitimidade da união homoafetiva e disse conviver no ciclo pessoal com amigos na condição reconhecida pelo Poder Judiciário. “Eu penso sempre na questão do filho. Acho que meus filhos não são homossexuais. Se eles fossem, você pode ter a certeza de que eu não iria jogá-los na lata do lixo. Sou conservador naquilo que não deturpa: a moral, os bons costumes e a família”.