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Estado de sítio? Advogado explica termo citado por Jair Bolsonaro

Em artigo, ele explica regimes previstos na Constituição após o decreto de calamidade para defender o Estado e as instituições democráticas

atualizado

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Igo Estrela / Metrópoles
Jair Bolsonaro mostra a Constituição
1 de 1 Jair Bolsonaro mostra a Constituição - Foto: Igo Estrela / Metrópoles

Após as recentes críticas do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sobre o toque de recolher decretado pelo governador Ibaneis Rocha (MDB), quando classificou a medida como “estado de sítio“, um advogado explicou como funciona o regime rigoroso previsto na Constituição.

“Em tempos nebulosos, aconselha-se visitar a Constituição da República para familiarizar-se com os mecanismos concebidos pelo constituinte, os quais visam a defender o Estado e as instituições democráticas. A Constituição Federal prevê dois poderosos e excepcionais regimes: o estado de defesa (art.136) e o estado de sítio (arts.137/139), sob cujo império normas constitucionais disciplinam e limitam o exercício de poder extravagante e inibem o gozo pleno de direitos e liberdades públicas e individuais”, pontuou o criminalista Luís Carlos Alcoforado em artigo divulgado nesta sexta-feira (12/3).

De acordo com o especialista, a calamidade pública é um dos requisitos para a decretação primeiramente do estado de defesa, medida anterior ao sítio. “O estado de defesa e o estado de sítio se decretam para preservar a integralidade do Estado, em conformidade com seu modelo constitucional, e, necessariamente, devem defender as instituições democráticas, mesmo em situações anômalas”, sublinhou.

Segundo Alcoforado, é de competência do presidente da República decretar o estado de defesa, desde que ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional. “A decretação do estado de defesa visa a preservar ou, prontamente, restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social, ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza”.

O estado de defesa se limita, no máximo, a trinta dias, prazo prorrogável por igual período, se persistirem as razões que justificaram a sua decretação. “Exige-se que, decretado o estado de defesa, o presidente da República, em 24 horas, submeta o ato, com a respectiva justificação, ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta, no prazo de dez dias”.

Já a decretação do estado de sítio depende de autorização do Congresso Nacional, após solicitação do Presidente da República, já consultados o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional.

“São as seguintes as hipóteses que comportam a decretação do estado de sítio: comoção grave de repercussão nacional; ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa; declaração de estado de guerra; e resposta a agressão armada estrangeira. No decreto de estado de sítio, serão inseridas disposições relativas: à duração; às normas necessárias à sua execução e as garantias constitucionais que ficaram sobrestadas. Compete ao Presidente da República nomear o executor das medidas específicas e as áreas abrangidas”, acrescentou.

O estado de sítio só pode ser decretado com fundamento em comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa. Durante a vigência, só poderão ser tomadas contra as pessoas  medidas mais duras, como obrigação de permanência em localidade determinada, restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão e proibição de liberdade de reunião, por exemplo.

“Jamais a decretação do estado de defesa ou do estado de sítio se presta para afundar a democracia ou corromper a dignidade da pessoa humana, mas para afirmá-las como condições essenciais ao cumprimento dos mais caros princípios e valores constitucionais”, reforça.

De acordo com o advogado, são medidas constitucionais para socorrer um momento de anormalidade institucional ou natural.

“O estado de defesa e o estado de sítio não foram concebidos pelo constituinte para defender governos, estimular tiranos disfarçados de democratas, aquartelar ditadores, mas para defender, exatamente, as instituições democráticas e evitar que o Estado sucumba nas mãos de minorias, armadas de ódios e ressentimentos contra os valores da civilidade e da cidadania”.

No ano passsado, um parecer da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) considerou que um possível decreto de Estado de Sítio é inconstitucional, mesmo tendo como justificativa a pandemia de Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus.

Segundo a entidade, a medida só serviria como “instrumento de fragilização de direitos e de garantias constitucionais, sem qualquer utilidade e efetividade para fazer frente às reais demandas” do combate ao coronavírus.

Leia o artigo na íntegra:

 

Estado de Defesa e Estado de Sítio

Em tempos nebulosos, aconselha-se visitar a Constituição da República para familiarizar-se com os mecanismos concebidos pelo constituinte, os quais visam a defender o Estado e as instituições democráticas.

A Constituição Federal prevê dois poderosos e excepcionais regimes: o estado de defesa (art.136) e o estado de sítio (arts.137/139), sob cujo império normas constitucionais disciplinam e limitam o exercício de poder extravagante e inibem o gozo pleno de direitos e liberdades públicas e individuais.

Importa dizer que inexiste o estado de calamidade pública! Calamidade pública é um dos requisitos para a decretação do estado de defesa.

Calamidade pública é estado natural; estado de defesa, instrumento político-constitucional.

O estado de defesa e o estado de sítio se decretam para preservar a integralidade do Estado, em conformidade com seu modelo constitucional, e, necessariamente, devem defender as instituições democráticas, mesmo em situações anômalas.

 Compete ao Presidente da República decretar o estado de defesa, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional.

A decretação do estado de defesa visa a preservar ou, prontamente, restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social, ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.

Cuida-se de anomalia constitucional, tolerada, porém, pela Constituição Federal, sob regime extravagante dentro do qual se admite a adoção de medidas coercitivas, que autorizam restrições aos direitos de reunião, sigilo de correspondência, sigilo de comunicação de comunicação telegráfica e telefônica.

Coercitivamente, legitima-se, ainda, a ocupação e o uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública.

O estado de defesa se limita, no máximo, a trinta dias, prazo prorrogável por igual período, se persistirem as razões que justificaram a sua decretação.

Exige-se que, decretado o estado de defesa, o Presidente da República, em 24 horas, submeta o ato, com a respectiva justificação, ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta, no prazo de dez dias.

Durante o estado de defesa, a prisão por crime contra o estado será comunicada, imediatamente, ao juiz competente; a prisão ou a detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo se autorizada pelo Poder Judiciário.

A decretação do estado de sítio depende de autorização do Congresso Nacional, após solicitação do Presidente da República, já consultados o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional.

São as seguintes as hipóteses que comportam a decretação do estado de sítio: comoção grave de repercussão nacional; ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa; declaração de estado de guerra; e resposta a agressão armada estrangeira.

No decreto de estado de sítio, serão inseridas disposições relativas: à duração; às normas necessárias à sua execução e as garantias constitucionais que ficaram sobrestadas.

Compete ao Presidente da República nomear o executor das medidas específicas e as áreas abrangidas.

 Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento   em  comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas:  obrigação de permanência em localidade determinada; detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns; restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei; suspensão da liberdade de reunião; busca e apreensão em domicílio; intervenção nas empresas de serviços públicos;  requisição de bens.

Jamais a decretação do estado de defesa ou do estado de sítio se presta para afundar a democracia ou corromper a dignidade da pessoa humana, mas para afirmá-las como condições essenciais ao cumprimento dos mais caros princípios e valores constitucionais.

As instituições nacionais não submergem apenas porque, transitoriamente, há uma excepcionalidade, que não pode aterrorizar a cidadania, mediante a adoção de medidas que se afastam, por completo, das mínimas garantias constitucionais, exceto quanto àquelas que, constitucionalmente, podem ser suspensas.

São medidas constitucionais para socorrer um momento de anormalidade institucional ou natural, razão por que não se prestam a governos, independentemente do matiz ideológico, que têm dificuldades em conviver com a democracia, na plenitude dos valores que expressa como condição inalienável.

O estado de defesa e o estado de sítio não foram concebidos pelo constituinte para defender governos, estimular tiranos disfarçados de democratas, aquartelar ditadores, mas para defender, exatamente, as instituições democráticas e evitar que o Estado sucumba nas mãos de minorias, armadas de ódios e ressentimentos contra os valores da civilidade e da cidadania.

Não são instrumento para servir ao governo, mas ao Estado e às instituições democráticas, malgrado a excepcionalidade de medidas que podem ser decretadas temporariamente.

O problema é o mau uso das medidas constitucionais, com abuso de poder ou desvio de finalidade, típico de governantes autoritários, que não se conformam com a adversidade das ideias nem com a separação da competência dos Poderes da República.

Daí transformar uma medida transitória em definitiva basta vacilar…

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