Anilcéia deve se afastar da Corregedoria para TCDF apurar ação do STJ
Conselheira foi alvo de operação da Polícia Federal e teve os sigilos quebrados pela Justiça em inquérito que investiga corrupção na Corte
atualizado
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Alvo da Operação Pacare, da Polícia Federal, a ex-presidente do Tribunal de Contas (TCDF) Anilcéia Machado deverá se afastar parcialmente da função atual de corregedora da Corte no caso de haver desdobramentos internos sobre a investigação autorizada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Anilcéia teve a quebra dos sigilos bancário e fiscal decretada pela Justiça.
O presidente do TCDF, Paulo Tadeu, decidiu convocar reunião do Conselho da Corte para discutir as denúncias. Anilcéia foi eleita corregedora em dezembro do ano passado para um mandato de dois anos.
A investigação apura crimes contra a administração pública, como peculato, emprego irregular de verbas ou rendas públicas, corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e falsidade ideológica, praticados por agentes públicos e empresários.
Além de Anilcéia, outras seis pessoas são alvo da operação: o ex-deputado distrital Benício Tavares, Marcelo Nóbrega de Miranda Lopes, ex- subsecretário de Logística e Infraestrutura da Saúde: e Rodrigo de Almeida Martins, representante da empresa Look Indoor Placas de Sinalização S/A. Os nomes dos demais envolvidos não foram obtidos pela reportagem.
A PF apura possíveis crimes praticados durante apreciação, pela Corte de Contas, de contratos da Secretaria de Saúde do Distrito Federal que ocorreram entre 2013 e 2015, com a Look Indoor. Anilcéia Machado era presidente do TCDF à época os fatos denunciados. O ocupante desse cargo tem prerrogativas de domínio da pauta da Corte, por exemplo. Por isso, o conselheiro no exercício da função se torna mais poderoso e visado.
Em outra frente buscam provas sobre possível troca de informações, intermediação e manipulação na distribuição de processos, dentro do TCDF, referentes à Operação Falso Negativo. Essa ação, deflagrada pelo MPDFT, denunciou irregularidades na aquisição de testes para detecção da Covid-19. Em razão da investigação, foram presos o secretário de Saúde à época, Francisco Araújo Filho, e outros gestores dessa pasta distrital.
Desta vez, indícios apontam que membros do TCDF podem ter recebido pagamentos de algumas empresas investigadas.
Eventual substituição
Por ser uma ocorrência incomum, a avaliação de servidores experientes da Corte de Contas é de que os conselheiros terão de buscar um entendimento para que Anilcéia seja substituída na atribuição no caso de o processo interno no qual figura como investigada seja confirmado. A expectativa é que ela mesma peça o afastamento.
Uma das alternativas seria indicar o decano do Tribunal de Contas, que atualmente é Manoel de Andrade – o mais antigo conselheiro em atividade –, medida geralmente usada em casos de vacâncias de funções internas. Outra possibilidade seria a convocação pelo presidente da Casa de eleição específica para escolha de um corregedor ad-hoc.
Anilceia Machado “está de licença para tratamento da própria saúde”. Desde 7 de maio, quando o marido dela, o engenheiro Fernando Laboissiere, morreu em decorrência de um câncer, ela não participa das votações. Após o período de afastamento pelo luto, a conselheira ficou ausente do trabalho para cuidar da própria saúde.
Nessa quarta, os policiais federais fizeram buscas no gabinete e na casa de Anilcéia, no Lago Norte, e no TCDF. Os mandados de busca e apreensão e a quebra de sigilos dos envolvidos foram determinados pelo relator dos inquéritos no Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha. O nome da operação faz alusão à palavra “pagar”, cuja origem etimológica vem do latim pacare, “aplacar, satisfazer, apaziguar”.
Esta é segunda vez que um conselheiro do TCDF é alvo de investigação. Em 2009, no escândalo também chamado de Mensalão do DEM, o então conselheiro da Corte de Contas Domingos Lamoglia esteve na mira da Operação Caixa de Pandora. O escândalo implodiu a gestão do então governador José Roberto Arruda.
Look Indoor
A Polícia Federal também fez buscas no escritório da Look Indoor. A operação da PF ocorreu na sede do Correio Braziliense, onde está localizada a empresa investigada. Ambos os empreendimentos fazem parte do conglomerado de mídia Diários Associados.
Segundo as investigações, a Look Indoor seria beneficiária de um contrato para pagamento de R$ 5,2 milhões, decorrente de verbas que deveriam ser destinadas à saúde pública do Distrito Federal. O acordo foi firmado em 2013, durante o governo de Agnelo Queiroz (PT). Em números atuais, aplicando o IGP-M no período, o desvio chegaria a quase R$ 11 milhões.
Apurações preliminares indicam que a suposta irregularidade teria ocorrido com o aval do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF). Um dos alvos da PF é Rodrigo de Almeida Martins – que era um dos dirigentes da Look Indoor no período em que ocorreram as supostas transações irregulares.
O ex-subsecretário de Logística e Infraestrutura da Saúde do governo de Rodrigo Rollemberg (PSB) também é investigado na operação policial. Marcelo Nóbrega de Miranda Lopes era gestor da Saúde na época da assinatura do aditivo do contrato, em 2015.
Os delegados à frente do caso suspeitam que, além do desvio de verbas que deveriam ter sido aplicadas em tratamentos de média e alta complexidades, os serviços contratados da Look Indoor não teriam sido sequer entregues. Em alguns casos, a apuração aponta para serviços cobrados em duplicidade.
O outro lado
Em nota, o Tribunal de Contas do DF informou ter autuado dois processos para tratar sobre possíveis irregularidades no Contrato 236/2013, celebrado entre a empresa Look Indoor e a Secretaria de Saúde do Distrito Federal. Um dos processos está no gabinete do relator desde 25 de março de 2021 para elaboração de relatório e voto.
Em outro, o TCDF alertou o Secretário de Saúde de que os eventuais pagamentos com recursos distritais referentes ao Contrato nº 236/2013 devem considerar as irregularidades apontadas pelo Tribunal de Contas da União no Processo de Tomada de Contas Especial.
“O Tribunal de Contas do DF ainda determinou que o corpo técnico acompanhasse o desfecho do exame realizado pelo Tribunal de Contas da União e da Justiça Federal, de forma a submeter ao Plenário eventuais medidas complementares que entender necessárias”, destaca a nota.
A reportagem conversou com o ex-deputado distrital Benício Tavares, que informou não ter conhecimento da operação. Ele está fora de Brasília e antecipou que colocará um advogado para saber qual é o conteúdo da apuração.
“Assim que eu tomar conhecimento de forma oficial, poderei me posicionar. Mas não soube de buscas, mesmo porque só volto para Brasília no fim da semana, e estou à disposição para colaborar com essa investigação”, disse.