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Delegado Espinosa de volta às livrarias

Protagonista dos livros de Luiz Alfredo Garcia-Roza se envolve com assassinato em série de mulheres e passa a proteger a próxima vítima

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1 de 1 luiz-alfredo-garcia-roza-bel-pedrosa-divulgacao - Foto: Bel Pedrosa/Divulgação

É momento de reencontros muito especiais, felizes ao extremo. Volto a ler e escrever com prazer, na companhia de Luiz Alfredo Garcia-Roza e da novela A Última Mulher (Companhia das Letras, 120 páginas). Mais longo do que um conto, mais enxuto do que um romance, o livro parece fechar ciclo definido: para o autor, o leitor e o delegado Espinosa, protagonista-mor da obra policial do escritor carioca.

Narrativa curiosa. A elegância de Garcia-Roza se mantém na página mesmo quando a alta temperatura da violência toma conta. A prosa que trama a história de um grupo marginal arma-se de uma letra lenta, em estado de contenção, como quem pergunta: pra que tanta pressa? Quietinha, a literatura aguarda o momento de dar o bote em algum trecho entre o Centro, a Lapa, Copacabana e o bairro Peixoto.

A presença de Espinosa faz com que A Última Mulher valha a leitura mesmo sendo mais discreta em relação a outros volumes da trajetória literária de Garcia-Roza. Porque é assim mesmo. Na moral, na ascendência sobre os que estão à sua volta, inclusive ou principalmente o leitor, Espinosa traz o outro (diferente, distinto) para dentro de casa e o abraça quase literalmente entre suas estantes de livros-sobre-livros.

Trata-se de obra “menor”, na extensão e no interesse do plot. Lida na compreensão de um desfecho, há de manter acesa conexão com o projeto maior de Garcia-Roza, desejo de inserção ética na sociedade brasileira por meio do personagem principal. Meu amigo Carlos Marcelo, autor do romance Presos no Paraíso (Tusquets), notou isso e a beleza arrebatadora do parágrafo final, quando “o que restava era sua consciência, e era aquilo que doía”.

O “bom policial” Espinosa está mais contido. Com a namorada Irene repousada sobre o peito, aos 60 anos de idade e um tanto fatigado, ainda assim faz sombra moral para a dupla Ratto e Rita (ele tarimbado cafetão, ela jovem prostituta), perseguida pelo policial Wallace, corrupto e assassino de personagens que giram em torno do casal, como o advogado alcoólatra Japa. Sim, universos paralelos se encontram no caótico mundo urbano, nas ruas do Rio de Janeiro.

Companhia das Letras/DivulgaçãoA divisão em três partes confere organicidade à maneira simples de desenvolvimento do relato. A ficção policial de Garcia-Roza sempre primou pela clareza na exposição de seus motivos, do crime à solução, tendo Espinosa como charmoso e generoso condutor dos fios da frase fina, na distensão do texto corrido, na agilidade natural dos diálogos. A diferença aqui é apenas de escala, nada mais.

Há pouca investigação e bastante proteção em A Última Mulher, das individualidades da pessoa comum e do homem incomum que é Espinosa. Delineiam-se em linhas rápidas as principais características das personagens e do delegado, suas manias, seus hábitos, suas relações familiares e amorosas. Cinco anos depois de Um Lugar Perigoso (Companhia das Letras, 264 páginas), o também psicanalista e professor Garcia-Roza parece ter encontrado um canto confortável para repousar a literatura.

Viver passa a ser um lento esperar por desdobramentos aparentemente inevitáveis, como se homens e mulheres soubessem que não há muito a fazer contra o destino a não ser manter-se em suave estado de alerta, sempre em modo padrão de dignidade, ainda que você seja um contraventor. É uma lição e tanto de sabedoria e afeição para com a vida. Não à toa Espinosa está menos tenso.

Entre a inocência e a culpa, a “última mulher” do título é também e ainda uma primeira leitora. Protegida na comodidade e no aconchego do apartamento de Espinosa, Rita começa a gostar de ler, gasta horas nessa novidade apaixonante. A gente depreende que seja ficção o motivo do recente prazer. Porque é nela que a realidade se dá com uma intensidade sussurrada ao arrepio do ouvido, do visto, do vivido.

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