Rodrigo Oliveira: “Meu papel é mostrar a riqueza da culinária sertaneja”
Chef à frente do premiado restaurante Mocotó e criador do famoso dadinho de tapioca, Rodrigo bateu um papo exclusivo com o Metrópoles
atualizado
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Não faltam referências à persistência do sertanejo e a força do sertão. Da obra de Euclides da Cunha, ao mandacaru – que supera a seca nordestina e insiste em florescer – à batalha do migrante que cruza o Brasil e o mundo em busca de um trabalho e daquele grande sonho.
Filho de pernambucanos, o chef Rodrigo Oliveira cravou seu nome na história da gastronomia brasileira e demonstrou que, se o sertanejo é antes de tudo um forte, quem descende dele carrega aquele “quê” de rebeldia e resistência por onde for.
Foi com esse espírito de teimar, insistir e apostar que nasceu o Mocotó, restaurante que há quase duas décadas atrai entendidos, curiosos, de paulistanos da gema a estrangeiros atrás de “comida com sabor de Brasil”.
“Foram muitos desafios. Mostrar que a cozinha sertaneja não é pesada ou menor tecnicamente como a imagem que muitos carregam dela, ter um restaurante na Vila Medeiros, umas das beiradas de São Paulo, convencer meu pai que mudanças são necessárias…”, relata o chef, reconhecido com uma série de prêmios.
Contudo, a história do criativo Rodrigo se inicia lá atrás, com o menino que gostava de observar o pai mexendo nas panelas: “Olhando hoje, penso que isso estava comigo desde que comecei a ver meu pai na cozinha. Mas o estalo mesmo foi depois, quando conheci grandes chefs, como a Mara Salles e o Luiz Emanuel que me fizeram ver um caminho que eu nem suspeitava”.
O mítico dadinho de tapioca também foi um ponto alto do sucesso do chef. Criado por Rodrigo há alguns anos, o petisco ganhou os bares, cafés e restaurantes brasileiros e conquistou paladares brasilienses. Prova disso é a facilidade em achar o quitute na capital. “Já é um clássico. Foi algo surpreendente pois se espalhou também por outros lugares do mundo. Vejo como uma forma de homenagem, fico grato. No ano passado, o Albert Adrià fez uma versão dos dadinhos de tapioca com trufa negra num jantar especial com o Alex Atala, no restaurante Tickets, na Espanha. Achei o máximo”, celebra Mocotó.
Quebrada Alimentada
Questionado sobre a pandemia e a quarentena, o profissional se mantem otimista. “Sei que para muitas pessoas a quarentena foi um momento de reflexão, mas para nós foi um momento de ação. Primeiro tivemos que redesenhar nosso negócio (o grupo possui as operações Mocotó Café, no Mercado de Pinheiros e no Shopping D e o Balaio IMS, dentro do Instituto Moreira Salles) para sobreviver nesse cenário e depois a gente viu que era hora de cuidar da comunidade do entorno mais diretamente”, explica.
Durante o isolamento social, o chef começou uma ação chamada Quebrada Alimentada. “O projeto já serviu mais de 35 mil refeições e cestas básicas, além de cestas de orgânicos e de higiene para mais de 600 famílias por mês. Essa foi a toada da quarentena da quebrada”.
Cozinha Sertaneja
Outra iniciativa que saiu do papel durante a quarentena foi o curso “Cozinha Sertaneja do Mocotó”, ministrado pelo chef e realizado em parceria com a Curseria, plataforma de cursos online.
No curso de mais de oito horas, o aluno tem acesso às principais técnicas usadas pelo chef no preparo de receitas como, massa de tapioca, maneiras de usar os feijões e favas, quais os componentes fundamentais para a cozinha sertaneja, processo de salga e maturação da carne de sol, derivados da mandioca, além de como usar frutas em pratos salgados e doces.
“Ao longo dos anos, entendi que a tradição e a inovação caminham juntas, que podemos criar e reinventar diferentes pratos e receitas do sertão nordestino mantendo a essência da culinária. É isso que ensinamos no curso, trago os pratos que desenvolvi no restaurante Mocotó para apresentar diferentes ingredientes e preparo que podem deixar a comida ainda mais especial e deliciosa”, explica Oliveira.
“Queremos mostrar a importância da cozinha sertaneja, que foi estigmatizada por tanto tempo aqui no Brasil. Mostrar como conseguimos criar uma linguagem universal para essa cozinha e como o Mocotó teve um êxito tremendo nisso”
Novo ares
Por fim, o chef se dedica intensamente ao plano de abrir um restaurante em Los Angeles, nos Estados Unidos. “Já é um projeto que estamos trabalhando há quatro anos. O nosso sócio na empreitada é o grupo Sprout da área de hotelaria, eventos e restauração. Temos um chef da nossa equipe morando por lá há dois anos”, entrega.
A ideia inicial era abrir um restaurante dentro hotel Hollywood Roosevelt, um clássico da cidade. “Porém a pandemia mudou tudo e decidimos nos últimos meses que o restaurante vai sair do hotel. Abriremos numa casa que já existe no Art District, em Hollywood. Esperamos que a inauguração aconteça ainda no fim do ano”, finaliza.