Conheça 4 mulheres que são a cara da nova gastronomia do DF
Catarina Freire, Luiza Jabour, Roberta Azevedo e Victoria Neddermeyer comandam empreendimentos jovens e de destaque na cidade
atualizado
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As rosas comumente espalhadas por Brasília no 8 de março celebram a delicadeza e a força das mulheres. Mas hoje elas também dão uma cor diferente a dias difíceis provocados pela pandemia do novo coronavírus. No DF, o lockdown declarado pelo governo ainda deixa mesas de bares e restaurantes vazios. Porém, as cozinhas ainda estão cheias de esperança de dias melhores, e muitas sob o comando de mulheres que revelam o que a gastronomia brasiliense será nos próximos anos.
Para celebrar o Dia Internacional da Mulher, reunimos quatro histórias especiais. Uma delas é a de Luiza Jabour. Ela cresceu nas cozinhas da Sweet Cake ao lado dos pais, Celso e Simone. Agora, aos 29 anos, a chef comanda o restaurante Almería, no qual é sócia com o irmão Guto, o marido Tiago e a cunhada Bianca.
“Não é fácil gerir um restaurante tão grande, uma equipe com volume, sendo mulher. Sou baixinha, tenho voz de criança. Isso torna difícil ter voz de comando na cozinha. Trabalho para que as pessoas me respondam não porque sou a dona, mas porque sou a chef”, destaca Luiza.
Outro nome que não passa despercebido quando o assunto é a nova gastronomia da capital é Roberta Azevedo. No Comedoria Sazonal, ela apresenta uma proposta de comida flexitariana, que combina sabor e nutrição. A empresária acredita que comandar um negócio sendo mulher é “colocar o coração na panela e a alma no feijão. E equilibrar toda essa arte com método, organização e rotina de um negócio que precisa de ritmo e disciplina para rodar bem”.
Quem aprecia a comida do Nakombi e do Southside deve conhecer a responsável por eles. Catarina Freire tem apenas 25 anos e é chef executiva das duas casas, mas enfrenta desafios todos os dias. “Comandar uma cozinha é desgastante por si só. Como mulher, sinto que meu desgaste seria bem menor se o mercado conseguisse enxergar minha competência em primeiro lugar, não meu gênero”, pontua Catarina.
Por fim, é Ana Victoria Neddermeyer que merece atenção. A empresária é formada em marketing e gastronomia, e é sócia de três negócios que acompanham as tendências no ramo dos restaurantes, as cozinhas voltadas apenas para produção. Hoje, ela é uma das responsáveis pelas marcas NedderGoods, Nolina Pizza e Lali. Victoria revela que gosta do conceito das ghost kitchens, ou dark kitchens, “por ver que uma produção bem estruturada pode proporcionar experiências diferentes para públicos diversos”.
Tempero jovem
A chef Catarina Freire mostra que a cozinha deixou para trás aquela ideia de culinária tradicional e se abriu às mentes jovens. Com apenas 25 anos, ela assina os menus de dois conhecidos restaurantes localizados na Asa Sul, que trabalham com propostas bem diferentes. Mas além dos desafios impostos pela idade, a chef também enfrenta as dificuldades de ser mulher no ramo da gastronomia.
“Somos questionadas diariamente a ponto de realmente indagar nossa capacidade de fazer bem o trabalho. Obviamente, esta é só a ponta do iceberg! Uma mulher não tem direito de ter um dia ruim, porque nosso dia ruim é justificado como TPM ou falta de sexo. Não deve usar a roupa que lhe é mais confortável no trabalho, porque marca nosso corpo e ‘distrai’ os colegas. Mulher não pode chegar a um cargo de chefia pela competência técnica que anos de estudo proporcionam. Eu já ouvi piadas sobre meu ‘teste do sofá’ quando assumi um cargo importante. Então eu gostaria muito de dizer que os desafios da cozinha são universais, independente de gênero, mas não é uma realidade.”
A chef também ressalta que para as mulheres, a entrada no mercado de trabalho é mais difícil, mas mesmo diante das dificuldades, se diz uma apaixonada. “O que eu mais gosto no que faço é a possibilidade de mudar o mundo através da comida e da experiência por trás disto”, revela. Ela recomenda ainda que mulheres que vão entrar nesse segmento tenham uma rede de apoio formada por pessoas que acreditem nelas e lembrem quão incríveis elas são. “Faça tudo por você, sempre. Por fim, crie memórias, referências e repertório.”
Um passo à frente
A empresária Ana Victoria Neddermeyer aprecia “o poder que a comida tem de trazer uma sensação boa para as pessoas”. E ela acredita tanto nessa afirmação, que hoje é sócia de três negócios gastronômicos que oferecem opções variadas ao público brasiliense. Mas tudo com foco no serviço de delivery ou retirada nas lojas.
Isso porque Victoria escolheu trabalhar com cozinhas conhecidas como dark ou ghost kitchens, que funcionam apenas para produção e despacho de alimentos. A tendência que conquistou chefs mundo afora nos últimos anos, também vem ganhando força na capital. Por aqui, a empresária trabalha com as massas artesanais da Nolina Pizzaria, o menu brasileiríssimo da Lali e as experiências no pote da NedderGods.
Hoje, a empresária se divide entre tocar os negócios e criar receitas únicas em meio a uma equipe formada basicamente por mulheres. Porém sabe que sempre foi difícil conseguir oportunidades no universo da gastronomia. “As pessoas ainda associam a figura feminina a aquela pessoa que traz o afeto pela comida, muito mais do que a figura de alguém que toca um negócio”, pontua Neddermeyer.
Paixão por doces, talento para tudo
Apaixonada por doces, em especial o chocolate, Luiza Jabour, cresceu dentro das cozinhas da Sweet Cake, confeitaria de seus pais. O amor pelas sobremesas fez a chef ir até a França para se especializar na área de pâtisserie. Mas a volta reservava outra surpresa, o restaurante Almería.
A casa localizada no Clube de Golfe abriu as portas durante a pandemia e conta com uma equipe de cerca de 20 pessoas, entre cozinheiros e responsáveis pela limpeza. A metade é formada por mulheres. “A presença delas chefiando ou sendo sub chefs está cada vez maior. Porém ainda é (um movimento) muito tímido. Ainda é um mercado machista, mas aos pouquinhos a gente vai conquistando nosso espaço”, diz Luiza.
Para a chef, as principais referências no ramo são a mãe e a avó. Foi com elas que aprendeu o prazer em servir, alimentar pessoas e agregar em momentos especiais. “A cozinha é aberta e, às vezes, tenho a chance de ver a pessoa dar um sorriso enquanto come”, confessa.
Acredito que cozinheiros alimentam a alma das pessoas e é por isso que eu cozinho.
No Almería, as bases da cozinha são o mediterrâneo e a valorização dos produtos. Entretanto, Luiza Jabour abre espaço para ingredientes locais e para os frutos do Cerrado. Pimenta macaco, baunilha do Cerrado e castanha de baru são exemplos de ingredientes comumente usados por ela. “Estou encantada pelo maracujá do Cerrado e em breve apresentarei uma novidade que combinará mousse e geleia”, adianta.
Fora da curva
É comum encontrar restaurantes com propostas de comidas saudáveis por aí. Mas na Comedoria Sazonal, espaço localizado dentro do Infinu, Roberta Azevedo vai além. A empresária e nutricionista oferece pratos que unem qualidade, sabor e experiência.
“Toda vez que um cliente me diz que tem rejeição à um alimento e na Comedoria ele topou provar e amou, sinto que minha missão foi cumprida. Fazer com que pessoas alcancem lugares que nem elas imaginavam mais ser capazes é o que faz com que eu esteja constantemente buscando novas releituras e ressignificando os alimentos”, destaca a empresária.
O nome de Roberta cresce ao lado de outras mulheres que se destacam na gastronomia da cidade, e ela também percebe isso. “Vejo com muito entusiasmo que tivemos excelentes representantes das últimas gerações. Uma nova leva de cozinheiras, padeiras, confeiteiras, nutricionistas, empreendedoras, baristas, jornalistas, fotógrafas e outras tantas especializações que além de estarem abrindo negócios e se realizando profissionalmente, estão trazendo para a cidade inovações e ajudando o mercado de Brasília a ser tornar mais maduro.”
Entre pandemia e lockdown
Com o decreto de lockdown assinado pelo governador Ibaneis Rocha na última sexta de fevereiro, o segmento de bares e restaurantes vive dias tensos. Para as empresárias, o momento é de preocupação.
Enquanto a perda de endereços assusta com o possível fechamento, caso o decreto seja atualizado e siga por mais dias, há um sentimento coletivo de que é necessário ser criativo, se reinventar e se movimentar, acima de tudo.
Victoria Neddermeyer destaca que a pandemia mudou os padrões de consumo e produção de modo geral. “Isso afetou diretamente o ramo de gastronomia. Várias empresas que eram avessas ao delivery tiveram que se repensar. Muitas operações tiveram que modificar o cardápio, por exemplo.”
Foi o que aconteceu com a Comedoria Sazonal. Roberta Azevedo explica que precisou reduzir o menu e incluir pratos que seriam lançamentos da temporada, porque são produtos que podem ser transportados sem prejuízo. Já Luiza revela que no Almería eles entraram de cabeça em um território inexplorado. Realizaram mudanças de cardápios e criaram receitas especiais para delivery. “Se adaptar ao momento é essencial para seguir confiante”, frisa.