Saiba por que restaurantes devem apostar na gastronomia afetiva
O tema andou irritando os críticos nas últimas semanas, entenda a razão e porque discordo deles
atualizado
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Gastronomia afetiva, ou comfort food, é uma tendência gastronômica que vem ganhando força desde que a animação Ratatouille chegou ao circuito audiovisual. Nela, o temido crítico Alton Ego se apaixona por um prato (o que dá nome ao filme) por remetê-lo à sua infância. Essa vertente gastronômica tem por objetivo justamente isso: te levar a locais caseiros, trazer de volta memórias de infância e lembrar comida que seus pais e avós faziam. Por alguma razão o tema virou pauta entre diversos críticos (alguns sérios, porém a maioria apenas reclamões de redes sociais), mas, como esperado, muitos reclamam da popularidade desse movimento.
A acusação dos insatisfeitos é de que é impossível reproduzir uma sensação afetiva de comer comida que se comia em sua infância, e eu discordo. Sigo algo que chamamos de gastronomia de produto, que nada mais é do que valorizar os ingredientes que temos, evitando temperos fortes que os mascarem, processos longos que removam sua delicadeza e, obviamente, industrializados. Por razões óbvias, isso acaba esbarrando na afetiva. Afinal, a cozinha caseira (que é a base da afetiva) nos remete às memórias familiares.
Eu defendo a existência dessa gastronomia e de cozinheiros que se proponham a recuperar a comida com gosto de feita em casa: simples, saborosa e bem preparada. Mas, como qualquer movimento comercial, há excesso e charlatanismo. Obviamente eu não consigo vender o parmegiana da sua avó, o pudim da sua madrinha, o quindim que você comia na casa do seu amigo de infância. Porém, consigo fazer algo próximo disso.
Posso me propor a produzir coisas simples, caseiras e bem preparadas, mas com uma apresentação menos rústica e agradar clientes. A gastronomia que mais preparo em meus eventos é a italiana e tendo a seguir as técnicas raízes dela. Não é incomum ouvir dos comensais que o nhoque lembrou muito o que comia nos almoços da casa dos avós. Que a polenta era aquela feita pela família do interior do Sul e outras referências a memórias caseiras.
Quantas vezes você já não pediu um pudim, brigadeiro, bolonhesa, milanesa, o que for, que te levou de volta a momentos de sua infância? Garanto que várias. É óbvio que nenhuma casa vai conseguir reproduzir a experiência sempre e com todos, mas isso não quer dizer que não possa tentar. Até porque, convenhamos, quando estamos mal é comum buscarmos aquilo que comíamos e nos melhorava.
Acho que o grande problema é como cada um entende o movimento. Eu compreendo como retomar o simples, o bem temperado, o que eu chamo de comida que abraça o estômago. Já o pessoal que critica, entende como alguém que se propõe a ativar memórias de todos que vão lá.
Para mim, é você voltar às origens, comida de verdade, com o mínimo possível de ultraprocessados e com insumos o mais naturais possível. E me arrisco a dizer sim que é possível criar uma “nova memória afetiva” pela forma como a comida se apresenta. Vários restaurantes atualmente trazem receitas familiares em seus cardápios que remetem a estar comendo na casa de um amigo durante sua infância.