Artigo: se eu fosse você, não pediria para trocar nada no prato
Entenda porque a simpatia do salão não anima muito a cozinha e ainda gera a maior confusão
atualizado
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Sempre que vou a um restaurante com amigos e eles pedem para trocar molho ou acompanhamento, peço para não fazerem ou, ao menos, esperem eu trocar de mesa. Digo isso não só porque sou chato (um hobby na minha vida). Normalmente a resistência já é percebida no salão: poucos maitres atendem de pronto, outros são mais cautelosos e explicam sobre o conceito daquela refeição e alguns dizem que consultarão a cozinha. Qual o motivo de tanta resistência?
Primeiro, há a questão de conceito, os pratos não são apresentados daquela forma ao acaso. Passaram por longos testes e todos os elementos lá presentes cumprem um propósito de textura, sabor, acidez, harmonização ou contraste. A modificação desses elementos pode resultar em uma combinação ruim e dificilmente o cliente aceita que a troca tenha sido responsável por isso. Além disso, raramente a mudança é bem recebida na cozinha — sobram puxões de orelha.
Também é necessário entender um pouco da operação de uma cozinha para perceber outros problemas. O pedido que chega ao chef é “cantado” ou “marchado” (leitura da comanda em voz alta) e, como a operação é intensa, todos os passos devem ser rápidos. No cardápio, está escrito “paleta de cordeiro ao molho de amoras, acompanhada de quinoa ao perfume de hortelã”. Na cozinha, vira “cordeiro com amora!”. Nesse simples comando, um cozinheiro já começa a regenerar a paleta, outro prepara o molho e um terceiro começa a cuidar da quinoa.
Adiciono, o pedido nunca vem sozinho, então normalmente se escuta na cozinha “Uma paleta com amora, dois poivre ao ponto, um spaghetti de camarão e um ancho mal passado!”. Com poucas palavras, já se sabe proteínas, acompanhamentos, pontos e molhos de 5 pratos.
Quando um pedido é modificado, ele chega escrito ou impresso na cozinha. Essas observações normalmente já não são claras na comanda, requerendo que o chef consulte o garçom responsável pela troca. Em paralelo a isso, dezenas de pratos são produzidos simultaneamente e é relativamente fácil perder essas observações por falta de atenção.
Costumo dizer que um cardápio é como a arara de uma loja de roupas. Lá, apresentam-se os itens disponíveis para se comprar. Fica confuso pedir uma camiseta com botão da outra e manga de uma terceira. Portanto, não é fácil pedir uma proteína, com molho do outro prato e guarnição de um terceiro.
Procure sempre testar! Em cada item do menu, há uma concepção do chef, vários testes e um conceito. Dê oportunidade aos que não são seus favoritos, faça combinações diferentes e se deixe surpreender. De quebra, ainda ajuda a operação da cozinha.