Cafés estão pipocando em Brasília: será que é um bom negócio?
Donos de estabelecimentos brasilienses contam como lidam com o caro mercado de cafés especiais em expansão
atualizado
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Por mais que esteja na moda, é difícil colocar o café especial no hábito de consumo do brasileiro. Pudera: quem consegue pagar R$ 140 no quilo? Quem topa dar R$ 12 em uma caneca de coado? O custo não é um problema só para o consumidor, mas também para os donos de cafeterias. Como manter um estabelecimento somente com este tipo de grão sem ter prejuízo? O trabalho vai muito além do convencimento do cliente de que aquele é um produto superior: é preciso equilibrar qualidade e lucro.
“Para nós, o café é a estrela principal, mas o que leva meu cliente à casa é o conjunto da obra: pratos variados, ambiente acolhedor… O café entra nisso como um superbônus. Tem muita gente que nos visita procurando um serviço diferenciado para a bebida, mas no início, o que nos amparava era o cardápio”, comenta Giordano Bomfim, relações públicas do Ernesto Cafés Especiais, inaugurado em 2011, quando a cena em Brasília não se comparava com o boom de cafeterias que acontece hoje.
Isso depende, é claro, do conceito de cada estabelecimento. “Se você me dissesse há alguns anos que uma cafeteria se sustenta só com café, eu acharia impossível. O problema é que as pessoas abrem achando que alimentação dá muito dinheiro, e não é bem assim. É um ramo de margens enxutas”, argumenta o proprietário e mestre de torra da Belini Café, Luiz Gustavo Manso.
Eu tenho que pagar contas e faturar, se eu vender só café, eu consigo? Se não for possível, é preciso mexer no tíquete médio, fazer o consumidor gastar mais, geralmente com alimentos. No início, quando a gente abriu, meu objetivo era não servir comida. Mas não adianta, é preciso ter um ponto de equilíbrio
Luiz Gustavo Manso, proprietário da Belini Café
O estabelecimento de Gustavo se enquadra na chamada Terceira Onda do café: uma loja com equipe que torra os próprios grãos, tem contato direto com o cafeicultor, valoriza o preparo artesanal da bebida e faz questão de contar a história de cada produtor ao consumidor final. Algumas casas levam esse conceito muito ao pé da letra: a estrela principal é o café e a comida são simples tira-gostos oferecidos por uma cozinha bem enxuta.
O problema é que o cobertor é curto e nem todo mundo que vive só de café. Para equilibrar as contas, muitas casas optam por aumentar o cardápio. O desvio da atenção exclusiva à bebida – tão delicada e de preparo que exige precisão – pode acarretar na perda de qualidade.
“Houve um momento em que sentimos essa pressão, não estávamos conseguindo exercitar o melhor do café por causa da complexidade da operação. É um processo que pode acontecer, porque quanto mais você dilui o foco, maior a chance de fazer tudo mal. Nosso trabalho hoje gira em torno de tomar cuidado com os processos, de ter equipes fortes em cada frente”, descreve Giordano.
Para Vitor Ávila, sócio-proprietário do Los Baristas, café vencedor do último Veja Comer & Beber, a afirmação de que grãos especiais só dão prejuízo é falsa.
“É um modelo diferente se você o compara a cafeterias tradicionais e a outros estabelecimentos que trabalham com o café no cardápio. É um outro negócio quando se fala em comprometimento profissional, investimento em maquinário, treinamento de equipe, insumos. Guardadas as proporções, eu comparo o café especial à cozinha de alta gastronomia, dado o tipo de dedicação que se deve ter em todas as etapas”, opina.
Outro equilíbrio possível é o da variedade de produtos. Na Rapport, os baristas trabalham com grãos variados: desde o Orfeu, um café gourmet comercial, até microlotes de torrefações como Unique, Martins Café e a brasiliense Together.
“Eu acho que é importante saber o nicho que você quer atacar. Eu sempre quis abrir um estabelecimento para atrair curiosos, ajudar quem mal conhece os cafés do Brasil, os métodos de extração. Quis aguçar a curiosidade, não foquei em um público muito afinado com o café especial”, comenta Fabiana Braga, proprietária da casa.