Amázzoni: gim brasileiro ganha fama mundial com toques de bruxaria
Ao misturar ingredientes nacionais com elementos do folclore tupiniquim, a bebida levou o prêmio de melhor do mundo em Londres
atualizado
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“Um italiano, um argentino e um brasileiro se juntaram” é a introdução de várias piadas mequetrefes do imaginário popular. No entanto, o assunto aqui é bem sério: o arquiteto Arturo Isola, o mixologista Tato Giovannon e o artista plástico Alexandre Mazza – respectivamente, os representantes de cada uma das nações da blague – uniram-se para criar o Amázzoni, eleito o Melhor Gim Artesanal de 2018 em concurso realizado em Londres.
Tudo começou do desejo dos três fundadores em encontrar uma bebida de qualidade e degustar bons drinques. Em 2015, criaram uma confraria e a cada viagem trocavam experiências e, é claro, garrafas. A conclusão foi que faltavam rótulos de qualidade no país e os importados custavam muito caro.
Diante do desafio, os amantes de gim decidiram pôr a mão na massa: entre discussões, estudos, ideias e testes, Arturo e Mazza chegaram a um protótipo. Assim, acionaram Tato para adequar as proporções. Dessa forma, o Amázzoni, um gim brasileiro, produzido no Rio de Janeiro, ganhou temperos italianos e argentinos.
Com a receita pronta, era preciso encontrar uma destilaria. Sem medo de inovar, os sócios adquiriram a Fazenda Cachoeira, no Rio Paraíba, a 130km do Rio de Janeiro. Eles restauraram a construção do século 18 e fundaram o primeiro alambique dedicado ao gim no país.
Isso tudo ocorreu em 2016. A venda comercial, com a distribuição em bares, começou em abril de 2017. Em uma trajetória de quase dois anos, a ascensão do Amázzoni impressiona: o prêmio do World Gin Awards, o reconhecimento dos bartenders brasileiros e a expansão para o mercado internacional (precisamente, Itália, Portugal, Luxemburgo, Bélgica e Singapura).
Brasil, Europa e misticismo
O que torna o Amázzoni tão especial, a ponto de fazer os tradicionais britânicos, criadores dos mais renomados gins do mundo, renderem-se ao seu sabor? A explicação tem duas vertentes: sabor e bruxaria.
O Amázzoni usa, ao todo, 11 botânicos na sua fórmula: mexerica, limão-siciliano, aroeira, cacau, castanha-do-pará, louro, coentro, maxixe, zimbro, cipó-cravo e semente de vitória-régia. Tudo natural, nada de extratos.
É um produto que nasceu de forma espontânea, não veio de uma planilha. Fizemos de coração, buscando aquilo que gostaríamos de beber. Procuramos como produzir algo que utilizasse apenas ingredientes naturais
Arturo Isola
A mística ao redor da bebida está justamente no último item da lista. Acredite, a semente de vitória-régia não acrescenta sabor ou mesmo aroma ao produto. Então, qual a razão em utilizá-la? “Ela adiciona espírito ao gim”, explica Isola. “É necessário um pouco de bruxaria nessa alquimia”, brinca o italiano, que fala português fluente, de quem está no Brasil há 10 anos.
O folclore indígena está na raiz da bebida, que assume o slogan “E das águas nasceu a estrela”. A frase é inspirada na lenda da guarani Naiá. Inocente, a jovem moça se lançou ao rio para abraçar a lua, pois almejava virar uma estrela. Morreu afogada, mas, pelas mãos do guerreiro Jaci, realizou seu sonho e foi brilhar no céu.
Negócio promissor
Lendas e folclores são elementos de uma extensa cadeia produtiva. Boa parte do sucesso do Amázzoni vem de sua qualidade como bebida especial: entre as concorrentes nacionais, é das poucas a utilizar apenas álcool de cereais – insumo mais caro no Brasil do que o produzido a partir da cana-de-açúcar.
A escolha garante neutralidade no sabor e um aroma menos marcado, capaz de harmonizar melhor com os botânicos adicionados à bebida. “É um produto muito coerente, que trata com muita verdade o processo artesanal. No processo produtivo, usamos mão de obra das pessoas da região”, explica Arturo.
Dono do Miríade Speakeasy (711 Norte) e mixologista, André Jorge conheceu o Amázzoni ao procurar produtos artesanais para compor sua carta de drinques. O especialista atesta a qualidade do produto. “A identidade brasileira na produção e na proposta conferem um diferencial ao gim”, avalia.
Com a garrafa custando R$ 150, o Amázzoni produz hoje entre 12 e 15 mil garrafas por mês – uma média de 10 mil litros mensais. Negócio promissor que atraiu a gigante do mercado Pernod Ricard. Em outubro, a dona de marcas como Ballantine’s e Absolut tornou-se sócia minoritária da empresa brasileira – a essência, garante Isola, seguirá artesanal.
Em Brasília, o produto é servido em 19 bares da cidade. Entre eles, estão o IVV Swinebar, Miríade, Teta Cheese Bar e Universal Diner. A garrafa pode ser adquirida por meio do grupo Imagina Juntos.
Reinvenção do gim
Embalado pelo movimento de valorização da bebida iniciado há 10 anos na Europa, o gim chegou de forma avassaladora no mercado brasileiro. Atualmente, a bebida tornou-se a querida da mixologia, bombando em festas e bares.
“A versatilidade da bebida como base para coquetéis, a refrescância e o poder etílico, somados a um álcool leve de cereais e ervas, tornam o gim muito especial”, comenta André Jorge. “É a cara do Brasil”, completa Isola.
Pensando nisso, a Amázzoni traça voos maiores para 2019. A empresa mira expansão rumo aos Estados Unidos, Alemanha e Inglaterra. Um outro rótulo, de teor alcoólico mais elevado, também está em processo de gestação. Vamos aguardar!