Sai Valverde, entra Setién: a mudança de rota no Barcelona
Sem um grande currículo, é impossível não considerar Setién uma aposta do Barça, um clube onde apenas vencer não basta
atualizado
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Ernesto Valverde assumiu o Barcelona antes do início da temporada 2017/18. Naquele momento, o Real Madrid acabava de ser campeão espanhol e europeu. Logo de cara, o confronto na Supercopa sugeriu a maior distância a favor do clube da capital em muitos anos.
É necessário resgatar o contexto para não ignorar os méritos do treinador. Ainda em agosto, começava a arrancada para um dos melhores aproveitamentos da história do primeiro turno de La Liga. O Barcelona conquistou 51 dos 57 pontos possíveis. Com Valverde, o clube buscava uma organização que recuperasse a capacidade coletiva de competir, especialmente em um período que marcava a perda de Neymar e o natural enfraquecimento individual do ataque.
Embora tenha jogado pelo Barcelona, Valverde não era o típico “barcelonista” em seus conceitos. Seu Athletic Bilbao havia atingido bom nível, mas o olhar para o tipo de jogo mostrava que a escolha nunca foi a mais compatível com as expectativas do torcedor.
Ainda assim, foram dois títulos em dois campeonatos nacionais disputados. No início, funcionou a ideia de uma equipe mais sólida como base para sustentar a qualidade individual do ataque. Os resultados apareceram, mas a aprovação nunca foi das maiores. Aos poucos, o estilo pouco convincente foi dando lugar à dependência dos brilhos individuais.
Messi e Ter Stegen desequilibraram inúmeras vezes. Até diversas goleadas foram construídas a partir da dupla, com placares que ofuscavam a realidade dos 90 minutos de bola rolando. O descontentamento cresce nas traumáticas eliminações de Champions, quando não conseguiu administrar as enormes vantagens do 3 x 0 sobre o Liverpool e do 4 x 1 sobre a Roma. Duas viradas históricas que marcaram e não foram esquecidas.
Em um clube como o Barcelona, vencer não basta. A cobrança é por um estilo compatível com a filosofia de décadas. A demissão de Valverde foi facilmente compreendida, embora pessimamente conduzida. E a escolha de Quique Setién surpreendeu em meio a tantas especulações, mas representa uma grande aposta no estilo.
Setién não é ex-jogador do clube e também não possui títulos em seu currículo. Dois fatores geralmente muito considerados para comandar o Barcelona. Sua ligação com as ideias do clube está na admiração por Johan Cruyff, grande inspiração para um técnico que tem como trunfo o bom futebol.
Betis e Las Palmas são os maiores trabalhos da carreira do treinador. O perfil é facilmente identificado. Um treinador que não abre mão da posse de bola e do controle sobre os adversários. Virou atração pela personalidade com que seus times, mesmo modestos diante de gigantes, conseguiram se impor em diversos jogos em La Liga.
Quique Setién nunca teve um grupo tão talentoso nas mãos. Ao mesmo tempo, nunca precisou administrar um vestiário repleto de estrelas, nunca precisou encarar diariamente jogadores de tantos recursos técnicos nos treinamentos e nunca teve uma pressão tão grande por resultados.
Tudo será novidade. Por isso, a definição não pode ser diferente de aposta. O Betis de Setién agradou pela qualidade com que saía jogando e pela forma como buscava o controle a partir da posse, mas também sofreu pela falta de profundidade e contundência no ataque, tornando a troca de passes pouco produtiva em determinados cenários. Embora tenha elevado o patamar do clube, foi vaiado e acabou demitido quando a equipe se mostrou mais previsível e os adversários passaram a se adaptar mais facilmente.
No Barcelona, ter Messi e Griezmann (sem contar Suárez, que estará lesionado até o fim da temporada) no ataque já tende a ser uma garantia de gols e de criação no terço final do campo. Meio-campistas como Busquets, De Jong e Arthur também podem crescer dentro do modelo, como aconteceu com Canales e Lo Celso no Betis ou com Roque Mesa e Jonathan Viera no Las Palmas.
Quique Setién terá o maior desafio e a maior oportunidade de sua carreira. De uma hora para outra, foi alçado ao importante cargo de um dos maiores clubes do planeta. Suas ideias têm aprovação da torcida e são compatíveis com a história do Barcelona. Resta saber se a execução será positiva e, principalmente em um início de processo, como será o respaldo na equação entre busca por bom futebol e necessidade de resultados.