Real Madrid x Atlético de Madrid: o clássico fora de hora e lugar
Federação Espanhola escolheu a Arábia Saudita como sede da Supercopa ignorando problemas esportivos e relacionados aos direitos humanos
atualizado
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A Federação Espanhola resolveu inovar na temporada 2019/20. Mudou o formato da Supercopa, disputa que tradicionalmente abre o calendário, em agosto, com jogos entre os atuais campeões de copa e campeonato.
Além de ampliar para quatro equipes, levou o novo torneio para a Arábia Saudita. Inúmeras questões surgiram. Desde a lógica da competição, passando pelos impactos no calendário e chegando aos diversos problemas do país escolhido. Acima de tudo, estava o dinheiro.
A possibilidade de rentabilizar com os principais clubes virou um pote de ouro para a Federação. Mais do que isso. Era também a chance de dar um golpe na Liga, já que existe uma guerra política em andamento. Representantes de La Liga e RFEF (Real Federação Espanhola de Futebol) divergem frequentemente e protagonizam diversas polêmicas em público.
Ao marcar a nova Supercopa para fora da Espanha, a entidade leva adiante uma ideia que havia surgido na Liga e que, na época, encontrou muita resistência para sair do papel. A proposta era realizar uma rodada ou alguns jogos do campeonato nacional em diferentes países pelo mundo. Uma maneira de explorar a marca global e fortalecer o produto em importantes mercados espalhados por outros continentes.
Em campo, o que se viu foi um menor interesse das torcidas espanholas. Valencia e Atlético de Madrid, por exemplo, somaram menos de 100 pedidos de ingressos por parte de torcedores que teriam que viajar até a Arábia Saudita. Na realidade, virou um ambiente de excursão de pré-temporada, em que os fãs estrangeiros conseguem ver os clubes e ídolos de perto. Naturalmente, a maior atração para ir ao estádio foi Lionel Messi.
A organização também recebeu críticas dos próprios clubes, e com razão. A divisão dos valores destinados aos participantes não foi igual. O Valencia, campeão da última Copa do Rei, recebeu bem menos dinheiro que os outros três. É evidente que os organizadores estão mais preocupados com o maior número de jogos e com a garantia de que, de alguma forma, as principais estrelas estarão em campo para justificar a nova fonte de lucro.
A sensação de aberração ainda ficaria maior por conta do desfecho futebolístico. Real Madrid e Atlético venceram as semifinais e se enfrentarão na decisão do torneio. Uma Supercopa que terá uma final entre equipes que nada venceram no país na última temporada. Total contradição e zero sentido histórico.
O Real Madrid fez boa partida contra o Valencia e testou, com sucesso, uma nova formação. O Atlético conseguiu uma improvável virada em um segundo tempo dramático contra o Barcelona. Nada injusto na parte esportiva.
Claro que qualquer clássico espanhol vai despertar interesse mundial e será um jogo agradável de se ver. E é nisso que a Federação aposta para obter sucesso. A questão é se faz sentido jogar um mini torneio no início de janeiro, ignorando problemas de direitos humanos na escolha da sede e atropelando a tradição de uma taça que tinha outro significado. Que Real Madrid e Atlético podem fazer um ótimo clássico, não há a menor dúvida. Muitos deles marcaram a última década, inclusive. No entanto, o sentimento é de que será um dérbi fora de hora e fora de lugar, entre dois times que nem deveriam estar ali.