Feminino? Homens ocupam 85% das comissões técnicas do Brasileirão delas
Se não houver rupturas no processo de aumento na participação das profissionais nos próximos anos, somente em 2030 haverá igualdade numérica
atualizado
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Assim como em inúmeras áreas, a busca por condições de igualdade entre os gêneros no esporte é constante, mas ainda existe um abismo. No último dia 26 de agosto foi celebrado, em várias partes do mundo, o Dia Internacional de Igualdade da Mulher. Dias antes, em 18 de agosto, cinco pesquisadores brasileiros publicaram um artigo na Revista Movimento. Ele retrata um cenário emblemático no Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino: os homens ocupam 85% dos cargos de comissão técnica dos times formados por mulheres.
Embora o Brasileirão feminino tenha ganhado força com a inserção da marca dos grandes times do país, as mulheres estão inseridas “somente” dentro de campo. O levantamento foi feito nas comissões técnicas desde a primeira edição da competição, em 2013, até o ano de 2019.
Uma das autoras do estudo, Julia Gravena Passero, 28 anos, admite que já esperava uma disparidade grande, mas a porcentagem a surpreendeu. “A gente sempre tem uma hipótese e é de que teriam mais homens, mas não esperava que fosse tanta diferença. É muito mais do que a gente esperava. Mas não me abalou muito. Praticamente não tem mulher, são muitas equipes que só têm homens nas comissões”, afirma Julia, formada em Ciência do Esporte pela Unicamp.
A pesquisa analisou a quantidade de mulheres atuantes como treinadoras, auxiliares técnicas, preparadoras físicas, massagistas, treinadoras de goleiras, fisioterapeutas e médicas. As súmulas oficiais do Brasileirão Feminino, disponíveis no site da CBF, foram utilizadas para a coleta dos dados e montagem da planilha.
Para se ter uma ideia da lentidão no processo de inserção das mulheres também nos cargos de comissão técnica, o estudo calcula que “se não houver rupturas no processo de aumento linear e gradual na participação das profissionais nos próximos anos, é possível que a igualdade numérica entre homens e mulheres em cargos de comissão técnica seja alcançada a partir do ano de 2030.”
Empenhada em mudar essa realidade nos clubes brasileiros, Julia Passero acredita que o aumento de exemplos de mulheres bem sucedidas em cargos de comissão técnica podem impulsionar a chegada delas. “Eu sofri preconceito sendo treinadora. Eu era técnica de um time de futsal de Limeira. Um pai me questionou: ‘Você é mulher, não sabe nada de futebol’. Sabe quando mexe na ferida? E mergulhei ainda mais nos estudos. Acredito que esse resultado (preconceito e disparidade nos cargos) é muito por conta do que vivemos no passado. Essa atribuição da mulher-mãe, mulher-casa, que não sai para trabalhar. Mas acho que o role model pode ajudar nisso. Pessoas que servem de inspiração”, avalia.
“Há 10, 15 anos não tinham exemplos de jogadores bem sucedidas. Agora você já tem um leque de jogadoras e tem inúmeras meninas querendo jogar. No cargo de gestão é a mesma coisa. Olho para o cenário mundial e vejo Mourinho, Guardiola, Bernardinho. Estão chegando referências femininas e espero que isso aumente”, conclui.