Em esquema de corrupção, dirigentes da Conmebol lesaram clubes da América do Sul
Com isso, dinheiro que deveria ter ido para os cofres dos clubes que participavam da Libertadores acabaram nas contas de cartolas que hoje são investigados pelo FBI
atualizado
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Documentos da Justiça dos Estados Unidos, Suíça e Uruguai obtidos pelo jornal O Estado de S.Paulo revelam que dirigentes sul-americanos impediram que contratos mais lucrativos para os clubes fossem assinados com parceiros comerciais e, em troca de acordos subvalorizados, receberam propinas milionárias. Com isso, dinheiro que deveria ter ido para os cofres dos clubes que participavam da Libertadores acabaram nas contas de cartolas que hoje são investigados pelo FBI.
Na última quinta-feira, a polícia do Paraguai atendeu a um pedido do FBI e realizou uma operação de busca na sede da Conmebol, em Assunção. Depois de quase 10 horas, as autoridades deixaram o prédio com dezenas de caixas com documentos.
Conforme já foi anunciado em Washington no dia 3 de dezembro do ano passado, José Maria Marin, Ricardo Teixeira e Marco Polo Del Nero (os três últimos presidentes da CBF) estão, segundo as investigações, entre os dirigentes que receberam propinas no esquema da Libertadores.
Na avaliação dos investigadores, o impacto da corrupção tem sido a impossibilidade de aumentar a renda aos clubes que participam da competição. Para a edição de 2016, por exemplo, o torneio vai distribuir pouco mais de US$ 7,2 milhões ao campeão. O valor é apenas pouco mais de 12% do que o vencedor da Liga dos Campeões na Europa receberá este ano: cerca de US$ 58 milhões.
Se parte da explicação para o abismo que existe entre a renda na Europa e na América do Sul é a diferença de desenvolvimento econômico entre as duas regiões, os documentos da Justiça revelam que outra constatação é de que os contratos comerciais da Libertadores poderiam ser bem superiores se não fosse pela corrupção na Conmebol e nas federações nacionais.
Uma denúncia apresentada a uma corte de Montevidéu contra a Conmebol, por exemplo, aponta um valor estimado de US$ 68 milhões entre 2011 e 2014 que teria feito parte de um esquema de corrupção. Isso sem contar com o contrato já fechado entre 2015 e 2020 para a transmissão dos jogos.
“O mecanismo utilizado consistia em que a T & T Global ficaria encarregada de adquirir os direitos a um preço inferior ao que correspondia e, logo, cedê-los à Fox Sports e à Rede Globo a um preço muito superior, beneficiando ilegitimamente entre outros o sr. J.G (hoje falecido) e E. F.. A sigla J.G. se refere a Julio Grondona, ex-chefão do futebol argentino e vice-presidente da Fifa. E.F. é Eugênio Figueredo, ex-presidente da Conmebol.
Figueredo, segundo a investigação, recebeu “enormes somas de dinheiro indevido, provenientes de empresas dedicadas à comercialização de televisão dos torneios”. No processo, Figueredo também admitiu que recebia um salário de US$ 40 mil como presidente da Conmebol, além de outros US$ 50 mil por mês “graças a pagamentos de empresas como a T&T.
Essa não era a única renda extra do ex-presidente da Conmebol. Em seu depoimento em Montevidéu em 24 de dezembro de 2015, Figueredo confirmou que recebeu da empresa Full Play Group S.A. US$ 400 mil para “manter esses contratos”. O uruguaio também disse que essa “foi a quantia que cada um dos presidentes das federações nacionais recebeu pela assinatura de contratos de direito de televisão”.
Já nos documentos do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, as investigações apontam que “em vários momentos Marco Polo del Nero, José Maria Marin, José Luis Meiszner e Ricardo Teixeira também solicitaram e receberam propinas e subornos de Alejandro Burzaco e do Co-Conspirador #12 em troca de seu apoio para a T&T se manter como a detentora dos direitos da Copa Libertadores, entre outros torneios”.
O esquema de corrupção envolvia a ameaça aos clubes que tentassem questionar o sistema. Segundo o auto do processo contra a Conmebol no Uruguai, os times do país chegaram a ser ameaçados de expulsão dos torneios internacionais.
Eugenio Figueredo admitiu que as ameaças ocorriam graças às ligações de um de seus diretores, Gorka Villar, com a cúpula da Fifa. Villar é filho de Angel Maria Villar, presidente da Real Federação Espanhola de Futebol (RFEF) e membro do Comitê Executivo da Fifa. Segundo jornais paraguaios, Villar entrou na Conmebol há poucas semanas e, com assessores, destruiu parte dos arquivos da entidade. Ele nega.
Procurado pelo reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, Marco Polo del Nero rebateu as acusações, em nota enviada pela CBF. “O presidente Marco Polo Del Nero refuta veementemente que tenha havido pedido ou recebimento de valor indevido em qualquer circunstância de sua trajetória no futebol”.