Casos de violência doméstica com lutadores reacendem debate sobre saúde mental no esporte
Quatro lutadores foram presos nos Estados Unidos recentemente pela mesma acusação e ligaram sinal de alerta
atualizado
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Nas últimas semanas, o MMA foi notícia no mundo, mas não pelos golpes ou finalizações dentro do octógono. Lutadores renomados foram presos sob a mesma acusação: violência doméstica.
Jon Jones, Chuck Liddell e Luis Peña acabaram no xadrez e acenderam o sinal de alerta em relação à saúde mental no esporte.
Ambiente como complicador
O caso de maior repercussão com certeza foi o de Jon Jones. O ex-campeão dos meio-pesados do UFC havia acabado de entrar para o Hall da Fama do evento quando acabou preso por suspeita de agredir a esposa.
E não trata-se de um caso isolado. Bones já foi preso outras vezes e por outros delitos. Para Fauzi Mansur, psicólogo, mestre e doutor em Psicologia pela UFRJ, o ambiente surge como influenciador aos rompantes de fúria, como nos casos de Jones, Liddell e Peña.
“O ambiente não é determinante, mas é influente. Se eu estou em um ambiente no mínimo agressivo eu tenho uma tendência a ir absorvendo respostas que o ambiente me ensina: respostas agressivas, respostas até um ponto grosseiras ou até certo ponto, violentas. Obviamente que não são todos os lutadores que terão esse tipo de resposta violenta à vida “, explica.
Porém, o especialista pondera que a pandemia potencializou casos deste tipo. “A pandemia foi outro agravante. Mesmo em lugares que já possuem a vacina, é inegável o aumento de tensão, um aumento de medo. Tudo isso refletiu no aumento não só da violência doméstica, mas de outros tipo, como escolar”, conclui o professor do Instituto Federal de Brasília (IFB).
Formação
Com o avanço de doenças como depressão e ansiedade, saúde mental tornou-se um assunto que virou parte da formação de atletas e lutadores.
Daniel Evangelista é treinador de alto nível do UFC e de MMA, como Vicente Luque, Gilbert Burns, Vivi Araújo e os irmãos Bonfim. Para Daniel, orientação é o caminho.
“A gente repete bastante isso na cabeça dos atletas. São pessoas que, não todos os atletas, a grande maioria, não são bem orientadas. Elas veem muita violência no dia a dia. Então isso aumenta muito nossa responsabilidade de mostrar para eles que este caminho não é o caminho. Então a gente alerta que quanto mais eles saírem do lado profissional, mais chance de acontecer algo que não deveriam estar fazendo. Bebida, festa, tudo é muito legal, todo mundo gosta, mas no nível de alta performance não existe essa possibilidade, e se você não consegue trabalhar isso na base do lutador, dificilmente você conseguirá no auge dele”, diz Daniel.
Nesta semana, a equipe de Jon Jones afastou o lutador. Postura que gera críticas do treinador. “Não adianta agora você fazer isso como se o cara fosse mudar, sendo que você aceitou por muitos anos essa condição. O certo é tentar cortar no começo. Orientar que aquilo vai afetar a vida do atleta marcial, a família dele”, explica Evangelista.
E o treinador aponta que, antes de lutadores, o importante é formar pessoas.
“Agredir uma esposa, uma criança, ou quem quer que seja, é muito descontrole emocional. Então a gente tenta trabalhar bem a parte mental dos lutadores. Mostrando, perguntando, vendo como eles estão no dia a dia, que tipo de reação eles têm, porque estamos formando cidadãos, estamos entregando a ferramenta que é a arte marcial, para formar o cidadão. Formar alguém que saiba o que é certo e o que é errado, alguém que entende a necessidade do próximo”, finaliza.