Os estrangeiros estão tomando conta da NBA?
Pela quarta temporada seguida, jogadores estrangeiros levaram o MVP. Eles se tornaram as grandes estrelas? E como foi o processo até aqui?
atualizado
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O primeiro jogo da NBA aconteceu cerca de 75 anos atrás. O New York Knicks venceu o Toronto Huskies por 68 a 66. Placar baixo, certo? Era um jogo diferente. Não havia limite de tempo na posse de bola ou cesta de três. A NBA nem se chamava NBA, mas BAA (Basketball Association of America). O próprio Toronto Huskies durou apenas uma temporada. Um dos jogadores em quadra se chamava Hank Biasatti. Ele aparentemente não era muito bom. Fez seis pontos em seis jogos e achou que teria mais sorte no beisebol – e teve mesmo. Mas bastou a ele sair do vestiário para fazer história. O ítalo-canadense é considerado o primeiro estrangeiro do melhor basquete do mundo.
De acordo com a Betway, casa de apostas esportivas online, havia um alemão naquela partida, Charlie Hoefer, mas ele cresceu nos Estados Unidos e tinha cidadania norte-americana. Biasatti nasceu na Itália, mas era canadense para todos os efeitos. Partindo deles, a NBA passou por um processo de globalização, inicialmente lento, intensificado na década de noventa, para comemorar três quartos de século como uma liga verdadeiramente internacional, que começou a sua última temporada com mais de 100 jogadores de dezenas de países diferentes, e alguns deles não estão apenas fazendo papel de coadjuvante. Os últimos quatro prêmios de MVP foram vencidos por atletas que não nasceram nos Estados Unidos: o grego Giannis Antetokounmpo, do Milwaukee Bucks, em 2019 e 2020, e o sérvio Nikola Jokic em 2021 e 2022.
É a maior sequência de estrangeiros sendo eleitos o melhor jogador da temporada regular, mas o fato em si é raro. O pivô nigeriano Hakeem Olajuwon ficou com o troféu em 1994, e depois houve dois para o canadense Steve Nash e um para o alemão Dirk Nowitzki, entre 2005 e 2007. Todos os outros, desde o primeiro em 1956, são acompanhados por bandeirinhas dos Estados Unidos. Um francês, Rudy Gobert do Utah Jazz, e o grego Giannis foram eleitos os melhores defensores por quatro temporadas consecutivas, até Marcus Smart do Boston Celtics quebrar a série. O último jogo das estrelas teve seis estrangeiros, além de Karl-Anthony Towns, nascido nos EUA, mas que defende a seleção da República Dominicana. Foram oito nas duas edições anteriores.
Desde a chegada de jogadores europeus no final dos anos oitenta, o protagonismo de estrangeiros foi intermitente na NBA. Hakeem Olajuwon liderou o Houston Rockets a dois títulos consecutivos, enquanto Michael Jordan brincava de beisebol e salvava o mundo de uma invasão alienígena, e o argentino Manu Ginobli e o francês Tony Parker foram pilares do San Antonio Spurs, um dos melhores times dos últimos 15 anos. Steve Nash liderou um Phoenix Suns que não ganhou nada, mas encantou pelo seu estilo de jogo super ofensivo, super rápido e com princípios que influenciariam o basquete que domina a liga no momento. Dirk Nowtizki foi o protagonista de uma das melhores histórias recentes, um Dallas Mavericks cheio de veteranos que superou até o Miami Heat de LeBron James, Dwayne Wade e Chris Bosh para ser campeão. O chinês Yao Ming, primeira escolha do draft em 2002, foi uma das estrelas do Houston Rockets. O espanhol Pau Gasol ajudou Kobe Bryant a ganhar dois anéis.
Agora, porém, parece consolidado. Além de Giannis e Jokic, pelo menos Joel Embiid, do Philadelphia 76ers, e Luka Doncic, dos Mavericks, estão em qualquer lista de melhores jogadores da NBA na atualidade. Aliás, estão na lista do prêmio de MVP também: o camaronês Embiid foi o segundo colocado, o esloveno Doncic foi o quinto, com Jokic na ponta. Giannis, Jokic e Doncic foram eleitos para o quinteto ideal da temporada, e Embiid ficou no segundo time. Então será que as maiores estrelas da liga hoje em dia são estrangeiros? “Não. As maiores estrelas ainda são os jogadores norte-americanos. Eles têm mais acordos de patrocínio, (vendem) bem mais camisas e as audiências de televisão para os seus times ainda são maiores”, afirma o repórter Joe Vardon, do site The Athletic, com exclusividade à equipe de apostas esportivas online da Betway. “O prêmio de MVP é votado pelos membros da imprensa que cobrem a liga e não estamos baseando nossos votos em popularidade”. Ok. Mas então eles são os melhores jogadores? “Se eu disser sim, voltaria apenas até a temporada passada. Jokic foi o MVP e Giannis ganhou o título. Antes disso, no entanto, não. Eu não diria isso necessariamente. Vencer importa para mim”, completa Vardon.
O prêmio de melhor jogador da temporada regular premia… a regularidade. Quem ao longo de 82 partidas consegue ser mais importante para a sua equipe. Isso depende bastante do time em que o atleta se encontra, às vezes para o bem, às vezes para o mal. Giannis se destacou em uma máquina de vencer jogos. Jokic foi eleito porque levou um Denver Nuggets devastado por lesões quase sozinho à sexta melhor campanha do Oeste. No topo do pau de sebo, porém, está o título, e os playoffs são animais completamente diferentes. As partidas são mais pegadas, os momentos decisivos se multiplicam. O verdadeiro craque aparece ali. Giannis até agora é o único que foi até o fim, também porque, apesar de a NBA valorizar esses prêmios individuais, nela ainda se pratica um esporte coletivo, e o grego está em uma melhor situação. Jokic e Doncic defendem franquias a um ou dois movimentos de realmente se tornarem candidatas, e Embiid tem sido engolido pelos problemas em série dos 76ers. Na última temporada, apenas o Dallas de Doncic esteve entre os quatro melhores times, e os estrangeiros dos finalistas foram coadjuvantes. Alguns ilustres, mas secundários. O canadense Andrew Wiggins, do campeão Golden State Warriors, foi o que mais se destacou.
Nenhum ainda conseguiu emplacar múltiplas conquistas ou uma dinastia, o que no fim das contas separa os ótimos das lendas, mas eles ainda têm muita carreira pela frente. A idade é um fator importante nessa discussão e em parte explica o protagonismo que eles apresentam neste momento: quase todos estão entre os 27 e 28 anos, maduros, mais ou menos no auge de seus poderes físicos. Doncic, 23 anos, é a exceção, mas tem se mostrado extremamente precoce em seu desenvolvimento. Enquanto isso, os norte-americanos estão em uma troca de gerações: suas principais estrelas passaram dos 30 anos ou ainda não se estabeleceram como estrelas. LeBron James, 37 anos, Kevin Durant, 33, e Stephen Curry, 34, ganharam todos os prêmios de MVP entre 2008 e 2016, com exceção de um, e ainda estiveram entre os jogadores dos Estados Unidos mais bem cotados para quebrar essa sequência recente de estrangeiros.
Antes dela, James Harden e Russell Westbrook foram os premiados, outros dois jogadores que passaram dos 30 anos e, diferente dos outros três, apresentaram quedas bruscas de rendimento. A nova geração ainda não conseguiu dar o salto. “LeBron James terá 38 anos na próxima temporada e sofreu lesões importantes em três dos últimos quatro anos. Ele nunca se machucou assim antes”, lembra Vardon. “Kevin Durant é provavelmente o melhor jogador norte-americano em atividade, mas ele também se machuca demais para ser considerado como o melhor no geral. Steph Curry é incrível, mas também está ficando mais velho e é propenso a lesões. Há muitas jovens estrelas norte-americanas na NBA, que uma hora serão ótimos – Ja Morant é um deles, Jayson Tatum outro e Devin Booker também -, mas eles ainda estão buscando espaço. Então sim, definitivamente é um momento de mudança na liga”.
A matemática é bem simples: quanto mais jogadores estrangeiros, maior a chance de alguns deles se tornarem grandes estrelas. Essa troca de guarda norte-americana é acompanhada pela sustentada expansão da presença de talentos de outros países. São oito anos consecutivos em que a noite de abertura tem mais de 100 jogadores estrangeiros nos elencos das 30 equipes – que têm a liberdade de fazer mudanças, trocas, contratações emergenciais, mas é naquele momento em que apresentam a base para toda a temporada. Isso dá mais ou menos um quarto de toda a liga.
“A NBA fez um trabalho incrível para o jogo continuar crescendo no mundo inteiro”, afirma um executivo do Philadelphia 76ers com exclusividade à Betway. “A NBA criou os Global Games, que consistem em jogos de pré-temporada e temporada regular sendo realizados fora dos Estados Unidos e do Canadá. Durante a temporada 2022/23, jogos de pré-temporada serão organizados em Abu Dhabi e Paris. Além disso, a NBA desenvolveu academias de basquete em Austrália, Índia, México e África. Essas academias focam no desenvolvimento das principais promessas escolares em cada país para permitir que cada uma delas maximize seus potenciais. Com a criação da Liga Africana de Basquete (BAL, criada com colaboração da NBA), agora haverá uma presença ainda maior da NBA em vários países africanos que receberem jogos. Durante todo meu tempo na NBA, os times sempre investiram recursos em seus departamentos internacionais de observação. Continuam ampliando suas redes internacionais para receber informações necessárias sobre as promessas internacionais”.
Nem sempre foi assim.
A questão soviética
Quando os anos oitenta chegaram, a NBA estava em maus lençóis. As partidas quase não eram transmitidas ao vivo. O grosso passava na televisão dos Estados Unidos com horas de atraso, e a ideia de transmitir para outros países poderia até arrancar algumas risadas. As chegadas de estrelas excepcionais como Magic Johnson e Larry Bird, e posteriormente de Michael Jordan, começaram a mudar o panorama. David Stern, alçado a comissário em 1984, soube aproveitar esses novos protagonistas para transformá-la e ele sempre teve uma missão muito clara em mente: torná-la global.
Durante as primeiras décadas da liga, havia um estrangeiro aqui e outro ali, mas a quantidade começou a atingir os dois dígitos nos anos oitenta. Em 1978, Mychal Thompson, pai de Klay, hoje no Golden State Warriors, tornou-se o primeiro jogador nascido fora dos Estados Unidos a ser escolhido em primeiro lugar no draft da NBA. O pivô das Bahamas teve uma boa carreira, ganhou dois títulos com o Los Angeles Lakers, mas era mais coadjuvante. O primeiro candidato a estrela foi Hakeem Olajuwon, a preferência do Houston Rockets no draft de 1984. No ano seguinte, o New York Knicks selecionou Patrick Ewing, que nasceu na Jamaica, mas representou os Estados Unidos. Também havia o francês Dominique Wilkins, que entrou na liga pelo Atlanta Hawks em 1982, e era norte-americano no basquete. Todos eles têm algo em comum. Passaram pelo sistema universitário norte-americano, o principal garimpo da NBA.
Muito do talento do basquete daquela época estava sob a Cortina de Ferro, e aí havia um probleminha burocrático: jogadores soviéticos não podiam se tornar profissionais. O pivô lituano Arvydas Sabonis, por exemplo, foi selecionado na quarta rodada pelo Atlanta Hawks em 1984, mas, como tinha menos de 21 anos, a NBA o vetou. No draft seguinte, o Portland Trail Blazers usou sua escolha de primeira rodada para contar com os serviços do jogador, mas foi a União Soviética quem vetou dessa vez. Queria manter seu status de amador para a Olimpíada de 1988 em Seul. Sabonis chegaria à liga norte-americana apenas em 1995, depois de passar pelo basquete espanhol, ao qual se transferiu com a queda do Muro de Berlim.
O momento histórico, no fim das contas, era favorável à visão de David Stern. A Guerra Fria estava em seus últimos suspiros. O líder soviético Mikhail Gorbachev era o cara da glasnost e da perestroika, duas políticas que culminaram com a dissolução da USSR. Em 1988, o Atlanta Hawks se tornou o primeiro time da NBA a jogar em solo soviético, com três jogos em Tbilisi, na Georgia, Vilnius, na Lituânia, e em Moscou. Naquele mesmo ano, a União Soviética ganhou a medalha de ouro na Coreia do Sul, passando por um time norte-americano universitário na semifinal, e logo em seguida deu carta branca para seus jogadores atuarem na NBA. “Isso mudou o jogo. Muitos dos outros países do Leste Europeu não poderiam dar esse passo até que a União Soviética o fizesse”, disse a vice-presidente de operações internacionais da NBA, Kim Bohuny, à Sports Illustrated.
Em 1989, o talento europeu começou a chegar de vez. Nomes como Vlade Divac, o primeiro jogador nascido e treinado fora dos Estados Unidos a fazer pelo menos 1.000 jogos de NBA, e Drazen Petrovic, protagonistas do documentário Once Brothers, foram os principais destaques, ambos da Iugoslávia, ao lado do lituano Sarunas Marciulionis. Eles estiveram entre os primeiros estrangeiros que realmente se tornaram estrelas. Naquela mesma época, houve outra decisão que também mudou o jogo: a Federação Internacional de Basquete passou a permitir que jogadores da NBA atuassem em seus torneios. Logo, poderiam jogar o Campeonato Mundial. Ou os Jogos Olímpicos.
Era uma progressão natural. Naquela época, apenas os jogadores da NBA não podiam jogar nos torneios da FIBA. Mesmo outros profissionais, como Oscar Schmidt, que atuava na Itália, não eram barrados. A mudança foi aprovada oito meses depois dos Jogos de Seul, mas quase passou em 1986. O sérvio Boris Stankovic, então secretário-geral da entidade administrativa, foi um dos principais entusiastas. “Nossa competição era fechada para jogadores da NBA e para mais ninguém. Isso parece imoral”, disse, segundo o site da seleção norte-americana de basquete. “Não faz sentido ter 200 milhões de jogadores no mundo como membros da FIBA, mas não os 300 melhores jogadores. O fato é que os profissionais dos EUA são muito mais fortes, mas apenas jogando contra eles com times fortes o resto do mundo pode melhorar. Se você é de outro país e pode correr contra Carl Lewis, talvez você não tenha uma chance. Mas você ainda quer correr”.
Em 1992, sem nenhum tipo de amarra, a galera inteira pegou o avião para a Olimpíada de Barcelona: Michael Jordan, Magic Johnson, Larry Bird, Charles Barkley, Karl Malone, Scottie Pippen, Patrick Ewing, David Robinson, John Stockton e outros figurões. A seleção norte-americana simplesmente passou por cima dos adversários, ganhando todos os jogos por pelo menos 30 pontos, recuperou a medalha de ouro e exibiu o melhor que a NBA tinha a oferecer em um palco mundial. A liga havia fechado seu primeiro contrato de transmissão internacional na década anterior, mas ainda não era como hoje. A Olimpíada foi uma oportunidade para o mundo inteiro ver Michael Jordan de perto. E muitos dos aspirantes a jogador de basquete em outros países começaram a querer ser como Michael Jordan. Ou Bird. Ou Magic.
Stern estava bem focado em abrir o mercado asiático. Discutia passar jogos na China e em 1990 levou um jogo de NBA entre Phoenix Suns e Utah Jazz para Tóquio, o primeiro disputado fora da América do Norte. Quatro anos depois, enquanto Hakeem Olajuwon era o primeiro não-norte-americano a ganhar o prêmio de MVP, a China enviava uma equipe de transmissão da sua emissora estatal para cobrir o Jogo das Estrelas. Na virada do século, Yao Ming foi o primeiro jogador que nunca atuou no sistema universitário dos Estados Unidos a ser selecionado com a principal escolha do draft. A popularidade do basquete naquele país pode ser constatada no All-Star de 2005, quando Ming foi titular com 2,5 milhões de votos, quebrando o recorde de Michael Jordan. Jordan, aliás, havia feito seu primeiro tour pela China no ano anterior e inspirou outros grandes nomes, como Kobe Bryant e Stephen Curry, a fazerem o mesmo regularmente.
Em 2001, a NBA inaugurou uma iniciativa chamada Basquete Sem Fronteiras. São campos de treinamentos que reúnem talentos jovens, técnicos, jogadores e olheiros da NBA, da WNBA e da FIBA em um mesmo teto. Todos passam alguns dias em alguma cidade ao redor do mundo exibindo suas habilidades, trocando ideias e fazendo contatos. Os elencos da noite de abertura da temporada 2021/22 contaram com 35 jogadores que passaram pelo programa. Entre eles, Joel Embiid (2011), Jamal Murray (2015) e Deandre Ayton (2016). “Foi uma benção”, disse Ayton, das Bahamas, dois anos antes de ser selecionado com a primeira escolha do draft pelo Phoenix Suns. “Eu nunca estive perto de tantos jogadores da NBA e jogadores experientes. É motivação para chegar ao topo como esses caras”.
A globalização como um todo, o desejo da NBA de se tornar internacional e o simples fato de que hoje em dia você pode acessar informações sobre qualquer coisa a hora que quiser andaram de mãos dadas para abrir as portas do basquete norte-americano ao mundo. “Há mais jogadores nascidos estrangeiros e, logo, mais estrelas, do que em qualquer outro ponto da história da NBA”, afirma o repórter do The Athletic, Joe Vardon, à reportagem da Betway. “É um efeito natural da disseminação gradual do esporte nos anos 90 e 2000, uma operação de olheiros e de ensino feita pela NBA que se expandiu rapidamente, e o mundo cada vez menor (graças à internet), que torna nosso jogo mais acessível ao redor do mundo, e o desempenho de jogadores estrangeiros mais acessível aqui”.
“A NBA é uma liga global”, acrescenta o armador brasileiro Raulzinho, que está na NBA desde 2015, atualmente no Washington Wizards. “Todas as equipes possuem estrangeiros, algumas com mais presença, mais influência, outras com menos, e a questão dos prêmios ou do protagonismo acaba sendo consequência do trabalho e da oportunidade para esse número cada vez maior de jogadores internacionais. Quase um quarto da liga é de atletas estrangeiros, há uma mistura muito grande de estilos e escolas. São cerca de 40 países (39 na primeira rodada de 2021/22), isso impacta também, faz com que todos aprendam e evoluam os seus jogos. Hoje temos jogadores internacionais se destacando ao ponto de concorrerem ao troféu de MVP. Isso mostra a qualidade e o nível dos estrangeiros que jogam na NBA”.
Claro que além da expansão, o protagonismo que esses jogadores estrangeiros atingiram hoje em dia também exige uma geração especialmente talentosa. Raulzinho atuou com um desses caras, Joel Embiid, no ano em que passou defendendo o Philadelphia 76ers em 2019/20: “Embiid é um pivô que tem habilidade, visão de jogo e recursos como poucos, além de saber usar bem a sua envergadura. Tem mobilidade, bom arremesso e é um jogador extremamente inteligente, que ajuda a equipe a jogar melhor. Fico feliz por ver ele fazendo uma temporada tão boa. Isso é fruto de muito treino e principalmente muita dedicação. Ele nunca está satisfeito, sempre buscando mais”.
O executivo do 76ers também destacou a ética de trabalho e o desejo de melhorar de Embiid: “Joel é um jogador que sabe atacar e defender e que continua trabalhando quando a temporada não está em atividade para melhorar seu jogo. Joel continua expandindo o alcance do seu arremesso, junto com a habilidade de criar arremessos para si e para os companheiros em transição ou na meia-quadra. Além disso, o manuseio da bola e o trabalho com os pés são elementos que ele levou a outro patamar”.
O chefe de desenvolvimento internacional da NBA, Troy Justice, disse em entrevista ao site Basketball News que acredita que os estrangeiros precisam se provar nos Estados Unidos, têm “humildade, desejo e fome”, e uma forte ética de trabalho. “E não estou falando que os jogadores domésticos (não trabalham duro). Não estou falando negativamente sobre eles, mas diretamente sobre características que vejo nos jogadores internacionais. Diria que são incríveis alunos, muito humildes na maneira como abordam isso”, disse, destacando que eles são “tipicamente ótimos jogadores de equipe” e colocam o time em primeiro lugar “com muito pouco ego”, o que também foi observado pelo repórter Joe Vardon. “Toda essa atual geração de estrelas estrangeiras parece jogar com muito empenho nos dois lados da quadra e não parece interessada em atrapalhar a química dos seus times nos vestiários”, afirma.
A próxima geração
A Sports Illustrated produziu uma história oral com jogadores estrangeiros relatando as dificuldades que encontraram assim que chegaram à NBA. Tem para todo gosto. Literalmente, inclusive, porque o esloveno Goran Dragic reclamou que achou a comida muito doce. Drazen Petrovic e Vlade Divac comentaram sobre os diferentes estilos entre o basquete europeu e o norte-americano. Durante muito tempo, houve uma espécie de preconceito, cada vez menor e difícil de sustentar em um momento no qual eles dominam prêmios defensivos, de que os jogadores de outros países eram mais moles, não jogavam tão duro assim. A língua sempre foi uma questão.
“Não tive problemas de adaptação quando cheguei à NBA”, afirma Raulzinho. “Na verdade, a única coisa que precisei entender melhor, que levou um pouco mais de tempo, foi me encaixar melhor, me acostumar com a velocidade, com o tipo de jogo, que era bem mais físico do que na Europa. Todos me receberam bem. Alimentação, clima, tudo foi simples, até porque a liga é global. Tem mais de uma centena de jogadores internacionais há muitas temporadas, então era uma questão de tempo até assimilar melhor o estilo de jogo”.
Esse processo é facilitado aos jogadores estrangeiros que entram na NBA por meio do sistema universitário dos Estados Unidos. Atuando por faculdades, têm tempo de assimilar uma nova cultura antes de se tornarem profissionais. Outros caem diretamente de outros países na pressão de um negócio multimilionário, e a adaptação pode ser um fator considerado na hora de tomar decisões que moldam o futuro das franquias. Luka Doncic, hoje em dia uma super-estrela e com potencial de ser um dos melhores jogadores da liga, havia sido eleito o MVP da competitiva Euroliga carregando o Real Madrid ao título, com apenas 19 anos, e três times deixaram passar a chance de contar com ele. Preferiram jogadores que haviam se destacado nos torneios universitários norte-americanos. Giannis e Jokic foram draftados diretamente da Grécia e da Sérvia, respectivamente, com escolhas do meio da primeira rodada e da segunda do draft. Embiid jogou por Kansas antes de ser convocado pelos 76ers em terceiro lugar.
As simulações do draft deste ano da NBA na imprensa norte-americana sugerem alguns candidatos com potencial, como Ousmane Dieng, francês que atua na Nova Zelândia, Christian Koloko, camaronês da Universidade do Arizona, e Nikola Jovic, outro sérvio do time local Mega Basket e que precisará encontrar um apelido para evitar confusões. A principal promessa parece ser o canadense Bennedict Mathurin. Ele está previsto em sexto lugar pela ESPN, em sétimo pelo Yahoo e em décimo pela Sports Illustrated. De qualquer maneira, entre as escolhas mais valiosas.
Em entrevista ao The Ryen Russillo Podcast, o vice-presidente associado de operações internacionais de basquete da NBA, Chris Ebersole, contou que Mathurin é mais um fruto das iniciativas da liga para atrair talentos do mundo inteiro. Nesse caso, de uma mais nova, a NBA Academy, fundada em 2016. Segundo Ebersole, Mathurin preferiu encarar o choque de culturas mais cedo e trocou Montreal pelo México quando ainda era muito jovem, dando um voto de confiança porque a iniciativa ainda não tinha um histórico tão longo, como a do Basquete Sem Fronteiras, por exemplo.
“Não falava espanhol, não conhecia nenhum companheiro. Ele passou por algumas adversidades. Perdeu o irmão mais velho, que era seu melhor amigo e morreu em um trágico acidente de bicicleta. Acredito que ele tinha 12 anos quando isso aconteceu”, afirmou. “O que torna Ben tão impressionante é como ele se recuperou disso. Ele manteve sempre a guarda alta e demorou para desenvolver confiança com nossos técnicos e com os seus companheiros. Uma vez que fez isso, não há ninguém que você queira ao seu lado em uma trincheira mais do que ele. Ele tem uma forte mentalidade, não tem medo, sua motivação para ter sucesso é incomparável com qualquer jogador que eu já vi no Basquete Sem Fronteiras e nas academias”.
Trabalhando para internacionalizar a liga desde 2013, Ebersole conta que Mathurin foi o primeiro canadense nesse programa, que agora conta com muitos outros garotos de Montreal que o admiram. A NBA não parece disposta a desacelerar a atração de talento estrangeiro. O dirigente afirma que é “definitivamente possível” que metade da liga seja de jogadores internacionais nos próximos 20 anos, considerando que o total passou de aproximadamente 45 duas décadas atrás para mais de 100 há oito temporadas consecutivas.
“Todos os três finalistas do MVP este ano são internacionais. Os últimos quatro MVPs são internacionais. Três jogadores do primeiro time da temporada foram internacionais. Não é apenas a quantidade, mas também o alto nível. Você vê o impacto que os jogadores internacionais podem ter. Estamos olhando para mercados emergentes de basquete e ainda estamos na superfície. Esse crescimento está em andamento. Não acho que chegou ao ápice”, encerrou.