Crítica: The Last Dance finaliza jornada de Jordan de forma apoteótica
Episódios finais do documentário homenageiam elenco de apoio e tentam desvendar o que diferenciava astro dos Bulls dos demais
atualizado
Compartilhar notícia
No começo do último episódio de Arremesso Final, documentário sobre a última temporada de Michael Jordan com o Chicago Bulls, disponível na Netflix, Mark Vancil, autor do livro Rare Air, oferece uma reflexão sobre o que diferencia o camisa 23 dos demais. “A maioria das pessoas têm dificuldades de estar presentes. Elas têm que ir para a Índia meditar. Michael nunca estava em nenhum outro lugar. Ele sempre estava presente”.
Durante os 10 episódios de Arremesso Final, vimos Jordan batalhar contra diversos tipos de adversários. Tanto internos como externos. Reggie Miller, as travessuras de Dennis Rodman, as costas de Scottie Pippen e uma pizza possivelmente estragada foram os últimos obstáculos que MJ teve que superar para conquistar seu sexto e último campeonato da NBA com o Chicago Bulls.
E durante as mais de 10 horas dessa jornada, mesmo quando era um garoto chegando a uma franquia dos baixos escalões da NBA, seu discurso era sempre o mesmo. De esperança, de acreditar que era possível, sempre focado no objetivo. Em momentos, Jordan e sua competitividade obsessiva, quase patológica, levaram essa obstinação a extremos, alienando colegas de time pelo caminho.
Essa obsessividade pode ser vista ainda nos dias atuais, quando Jordan, aos 57 anos, fala de antigos desafetos como se ainda estivesse no começo dos anos 1990, tentando passar pelo Detroit Pistons. Ou em 1998, após ganhar o sexto título, lamentando não ter tido a oportunidade de tentar o sétimo, com aquele grupo vencedor.
Jordan, claramente, não aceitou, até hoje, que aquele era o fim. Talvez, aquele grupo ainda tinha mais um campeonato para conquistar — se há alguma lição a ser aprendida com Arremesso Final é: nunca duvide de Jesus Negro. Mas aquele Chicago Bulls, em termos de basquete, já havia conquistado o suficiente para ser considerado uma das grandes equipes da história do basquete e se manter para sempre no coração dos admiradores do esporte.
Talvez o que Jordan devesse lamentar não é a oportunidade que não lhe foi dada de tentar o sétimo anel, mas sim a falta de conexões humanas mais verdadeiras. No episódio anterior, há uma última tentativa de homenagear o elenco de apoio que ajudou MJ a escalar o monte Everest da NBA.
Essas figuras secundárias são representadas por Steve Kerr, que assim como o Jordan, também perdeu o pai de forma violenta, uma forma da série mostrar que, apesar de MJ e seus companheiros estarem separados por mundos de distância, havia elementos que, apesar de trágicos, aproximavam esses mundos.
Lamentavelmente, como Kerr revela, o atual técnico do Golden State Warriors e Michael nunca conversaram sobre as tragédias que uniam suas histórias. Talvez o fato de sempre estar presente, focado na próxima vitória, no próximo anel, não permitisse que Jordan mostrasse essa vulnerabilidade.
Porém, ela está lá, presente quando ele escreve um poema para se despedir de seu time, presente nas lágrimas presas ao falar de sua reputação como um valentão implacável, ou no sorriso ao lembrar que houve um tempo em que ele precisava pedir dinheiro para a mãe para comprar selos e comida.
Jordan não tinha tempo para nada além de vencer, vencer e vencer em seus dias de jogador. Mas hoje, aos 57 anos e do alto de seus palácios e mansões, MJ com certeza tem tempo para pensar sobre tudo o que foi conquistado e perdido ao longo do caminho.