Upload e mais: como as séries de ficção-científica atuais discutem a morte
Os seriados de ficção-científica trabalham com a noção de imortalidade digital: especialistas explicam o fenômeno
atualizado
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Um dos mais novos sucessos da Amazon Prime Video é uma série que mistura doses de ficção romântica em uma espécie de comédia romântica. Trata-se de Upload, seriado sobre uma vida após a morte em tempos digitais. A produção é mais uma que aborda o tema, que, para além de crenças religiosas, ganha ares de possibilidades.
A ficção-científica, não custa lembrar, é ficção: aborda alguns conceitos utilizados na ciência para criar um mundo fantasioso. E a vida pós-morte tem ganhado força no momento – afinal, diariamente, estamos lidando com o crescente número de mortos da pandemia de coronavírus.
Upload se passa em um futuro (distante?) no qual o ser humano pode carregar sua consciência em um espaço virtual e, assim, viver eternamente em um ambiente digital. Quando Nathan (Robbie Amell) encontra sua morte prematura, ele é recebido por Nora (Andy Allo) em sua versão do céu – a programadora funciona como uma espécie de anjo-guia.
A ideia também aparece na série policial Altered Carbon, da Netflix, com alguma mudança. A consciência fica em um cartucho, que pode ser acoplado a uma nova capa: um corpo humano criado ao dispor do freguês.
Em Black Mirror (Netflix), por exemplo, o tema volta em alguns episódios – porém, com um olhar mais negativo, no qual seria possível ficar digitalmente presos em traumas ou questões do gênero.
As ideias da ficção, de toda forma, já são discutidas na sociedade. No livro Homo Deus, o historiador Yuval Harari levanta essa possibilidade de forma científica: afinal, a memória e a consciência são uma sequência de dados. Decifradas, podem ser emuladas em um ambiente virtual.
Na ficção, assim como no pensamento de Yuval Harari, a vida pós-morte tecnológica vem seguida de uma discussão sobre desigualdade. Afinal, “upar” uma consciência para a nuvem custaria muito caro, dada a quantidade de dados necessários.
Arte remédio da angústia
O psiquiatra Luan Diego Marques lembra que a morte é um dos maiores mistérios da humanidade e, ao mesmo tempo, causa temor e curiosidade.
“Quando a ficção representa essas formas de continuar vivendo, ela está falando sobre a busca humana de ter mais tempo. A arte vira uma estratégia para simbolizar as angústias da humanidade”, explica.
De fato, desde as artes mais antigas, a representação da morte e do que ocorreria após o fim são representadas das mais diversas formas. O sobrenatural, por exemplo, é parte de filmes tradicionais da cultura pop, como Sexto Sentido e sua famosa frase “Eu vejo pessoas mortas”.
Para Marcelo Veronez, filósofo e especialista em inteligência espiritual, seriados como Upload e Altered Carbon espelham tentativas de homens e mulheres contemporâneos de ressignificar a morte.
“O ser-humano tem a capacidade de memorizar e a morte mexe tanto com a gente que precisamos interpretá-la. E fazemos isso por meio da arte”, conclui Veronez.