Orgulho e Paixão: primeiro capítulo tem beleza, mas falta diversidade
É complicado usar uma novela para tratar de mulheres, questionando seus papéis na sociedade, e esquecer que existem outras diversidades
atualizado
Compartilhar notícia
Saem os tons escuros, o português antigo e os choros de Tempo de Amar e entram o sol dourado, os tons pastéis e as moças sorridentes de Orgulho e Paixão, a nova novela das 18h da TV Globo, inspirada em várias obras da escritora inglesa Jane Austen.
Elisabeta Benedito (Natália Dill) quer desbravar o mundo além dos limites da sua cidade, a bela Vale do Café. A Monarquia caiu e a República chegou, mas com todos os títulos de nobreza intactos. Por isso, os personagens falam em barões, condes e rainhas. Ou uma rainha, a Rainha do Café, encarnada com eficiência e uma mecha branca sobre a testa por Gabriela Duarte.
Por muito tempo, estas obras foram tachadas de “água com açúcar” e mero entretenimento para mulheres educadas. Levaram anos até que os estudiosos de literatura percebessem que Jane, na verdade, expunha o sistema machista e as exigências absurdas do mundo feminino.
Há uma promessa que este também seja o tom da novela de Marcos Bernstein. O autor, curiosamente, sempre se afastou desse tipo de história. Suas novelas anteriores eram de aventuras. O casamento entre o brasileiro e a inglesa deve agradar aos diversos tipos de público, pois um pode cobrir o que falta no outro.
Logo de cara, a abertura da novela traz desenhos que parecem capas de livros clássicos para colégio, feitos para atrair olhos juvenis. E, a tirar pela personagem da atriz Natália Dill, a adaptação funcionou.
Destaque para Grace Gianoukas, que interpreta uma empregada enxerida, um prato cheio para nos fazer rolar de rir, e Vera Holtz, interpretando a simplória, mal-educada, amorosa e desesperada mãe de cinco filhas. Tudo o que essa caipira quer é deixar suas meninas casadas antes de sua morte ou do fim do dinheiro da família, o que vier primeiro. Dentre as histórias, o caso da filha que lê livros góticos e tem certeza de que o vizinho assassinou a mulher, cujo corpo nunca foi encontrado, chama a atenção.
Do belo primeiro capítulo, com direito a largos campos de café e baile a fantasia, um detalhe não passou despercebido. Nos 50 minutos de duração, não apareceu uma única pessoa negra. Claro que a mão de obra era, majoritariamente, de imigrantes europeus, mas aniquilaram todos os negros da cidade? Será que foi uma decisão estética? Isso realmente compromete a verossimilhança de uma obra tão bonita. Não ter intérpretes negros não significa ser mais fiel à obra de Jane Austen.
É complicado usar uma novela para tratar de mulheres questionando seus papéis na sociedade — tendo o amor de pano de fundo — e esquecer que existem outras diversidades. Já que Bernstein gosta tanto de aventuras, sugiro a sua equipe ver o filme. Corra!
Confira as adaptações dos livros de Jane Austen para a novela das 18h: