“Não caímos no estereótipo”, diz Seu Jorge sobre Irmandade
Série da Netflix narra criação de facção criminosa em presídio de São Paulo e dilemas entre irmãos. Estreia em 25 de outubro no streaming
atualizado
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São Paulo (SP) – Irmandade, nova série brasileira da Netflix, ganhou detalhes nesta quarta (09/10/2019), em coletiva de imprensa realizada em São Paulo. Seu Jorge lidera o elenco no papel de Edson Ferreira, homem negro forjado no sistema carcerário de São Paulo durante duas décadas. Nos anos 1990, ajuda a formar, ao lado de Carniça (Pedro Wagner), a facção que empresta título à trama. Estreia em 25 de outubro na plataforma de streaming.
Irmã de Edson, a advogada Cristina (Naruna Costa) se vê num dilema quando de aproxima da Irmandade e é forçada pela polícia a colaborar com a investigação que pretende derrubar o grupo criminoso. Completa o trio de irmãos Marcel (Wesley Guimarães), que desconhece a situação de Edson. A direção geral é de Pedro Morelli (Zoom), da 02 Filmes, produtora do seriado por meio de uma das sócias, Andrea Barata Ribeiro. Lee Taylor, no papel do detento Ivan, e Danilo Grangheia, como o investigador Andrade, também compõem a escalação.
Ainda não há definição sobre a segunda temporada, mas Morelli diz já ter ideias para novos capítulos. “Nem todos nesse palco vão continuar”, adiantou.
Representatividade
O elenco falou abertamente sobre como a representatividade ajudou a dar autenticidade à trama.
“Uma das preocupações que eu tinha era de não cair no estereótipo”, diz Seu Jorge. A principal locação de filmagem, uma ala desativada do presídio de Piraquara, na grande Curitiba, foi fundamental para o elenco entender os personagens.
“Tínhamos restrições. Era quase regime semifechado. Chegando de manhã e saindo à noite”, brincou. “Ninguém estereotipou nada. A gente viveu. Figuração e elenco de apoio deram alma ali”, completou.
Segundo Seu Jorge, aconteceu algo raro na relação com o enorme time de figuração, com cerca de 500 pessoas: churrasco e pagode. Para compor Edson, contou com ajuda de amigos como os rappers Mano Brown e Edi Rock, do grupo Racionais MCs, representado na trilha sonora. “Tava acostumado com roteiro inteiro. Série é negócio diferente, eu não tinha essa experiência. Não vejo a hora de fazer tudo de novo.”
Naruna Costa diz que a relação com Seu Jorge e Guimarães no set foi mesmo de irmandade. “Nossas histórias pessoais se cruzam tanto. Dilemas e questões próprias da estrutura do país. Em algum lugar a gente é família mesmo. Parecia o mesmo quintal, só que de gerações diferentes”, disse a atriz. “Foi fácil se gostar”, emendou Seu Jorge.
Naruna Costa, bem como o elenco negro de Irmandade, destacou como a realidade brasileira e o lugar de fala ajudaram a série a fugir de clichês sobre violência e criminalidade.
“O racismo não é problema da população negra. É um problema que geral tem que resolver, dos governantes à base”, aponta. “Uma das premissas do trabalho como artista negra é não cair em furadas, estereótipos. Nada foi imposto. Tudo foi sugerido e ouvido”.
“Ainda tem poucos corpos negros no audiovisual. Mas nossa presença fez brotar uma energia de motivação. Nós existimos enquanto corpos políticos e não dá para desligar isso das nossas ações, para além do entretenimento e da criação.”
Seu Jorge destaca, em especial, o ambiente forte do presídio, onde era frequentemente reconhecido pelos detentos. “Gritavam meu nome, ‘representa nós!’. Nessa ala só tinha três pretos de 400 presos. Não dá tempo de o preto chegar na cadeia. São mortos antes. Nesse universo tudo está por um fio. Saí de lá com isso. Que a liberdade precisa ser cultivada”, disse o astro.
Produção
Apesar das semelhanças temporais com o PCC (Primeiro Comando da Capital), Morelli garantiu que a Irmandade não foi baseada em personagens ou situações reais. Da realidade, extraiu o conceito por trás das facções.
“Fugimos de abordagens como o olhar do policial ou do líder da facção. Então trazemos o olhar da mulher para abordar o universo dentro e fora da prisão”, explica.
“Nesse contexto, a gente precisava estar na era antes do celular, época em que as
mulheres eram essenciais para a comunicação dos presídios”.
Morelli se diz ciente do privilégios de ser branco. Por isso, afirma sentir necessidade de falar sobre injustiças sociais e se cercar de pessoas com lugar de fala. “Um dos diretores, Aly Muritiba, trabalhou sete anos no sistema prisional”, revela. Os episódios também trazem Morelli e Gustavo Bonafé (O Doutrinador) na direção.
*O repórter viajou a convite da Netflix Brasil