Marcelo Serrado fala sobre o machismo de Nicolau em O Sétimo Guardião
Personagem da novela das 21h oprime a família com seu comportamento retrógrado, mas é combatido pela esposa, Afrodite (Carolina Dieckmann)
atualizado
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Depois de ficar marcado por um bom tempo como o Crô, de Fina Estampa, Marcelo Serrado ganhou mais um personagem curioso em novelas. Em O Sétimo Guardião, da TV Globo, ele vive Nicolau, um homem que leva o machismo a níveis extremos. Casado com Afrodite (Carolina Dieckmann), é pai de quatro filhos.
Além de não aceitar a paixão do herdeiro, Bebeto (Eduardo Speroni), pela dança, abomina a ideia de Diana (Larissa Ayres) fazer carreira lutando karatê, pois acredita que esporte é coisa de homem. Porém, tudo começa a mudar na casa desse homem machista com o novo comportamento de sua esposa, que faz de tudo para ver a família feliz.
Leia entrevista do Metrópoles com Marcelo Serrado:
Como você vê as questões machistas no núcleo do Nicolau?
Esse núcleo é muito à parte na novela. Ele fala de questões que são muito pertinentes: preconceito, machismo, quase uma coisa homofóbica. Há um pouco de inspiração em cima de Billy Elliot (filme britânico de 2000) também, com o garoto que quer dançar e tem um pai bronco.
Pelas reações das pessoas, há muita gente que pensa assim ainda. O Nicolau é um pai preconceituoso com o filho que quer dançar e com a filha que deseja fazer um esporte. Ele ficou no século retrasado. Acho que são questões pertinentes em uma novela que tem esse realismo fantástico, mas que também tem questões reais sobre as quais o Aguinaldo (Silva, autor) está tratando.
E você criou mais um tipo novo, não é?
Novela é a criação de tipos. Eu não tenho aquela barriga, inflo na hora. Fico até meio cansado, porque fico inflando a barriga sempre. Estou inventando agora de ficar penteando os cabelos da barriga. O público ama isso e se diverte. Eu vejo que a equipe fica rindo e coloco mais. Isso é legal porque a gente vê que funciona. O Nicolau é um personagem popular, que cria empatia com o público.
Como foi esse processo para você?
Eu comecei a ver que tinha de criar um tipo diferente do que já tinha feito. Fiz o Crô com o Aguinaldo (Silva, autor) em Fina Estampa e quis criar algo completamente diferente. Ele também queria me dar um personagem diferente do que já me deu. Falou que ia criar um cara homofóbico, que não gosta de gays. Aí, procurei dar alma a ele dentro dessa composição. Criei a coisa do cabelo, da barriga, do pente. Os diretores foram deixando. Cada um vai fazendo sua criação até achar. Hoje já achei o personagem.
Existe sensibilidade por trás do comportamento rude do Nicolau?
Acho que ele deve ser um cara extremamente frágil por dentro. Tanto que chorou ao ver o filho dançando. O menino que faz meu filho, Eduardo Speroni, é ótimo. É um garoto que veio do teatro. Ele faz as cenas de verdade, é muito dedicado. Realmente talentosíssimo. Meu personagem tem questões muito arcaicas no pensamento. É um personagem extremamente de direita, radical. Um maluco nesse sentido.
Ele vai ceder e deixar a filha lutar karatê?
Eu não sei. Aí, é o Aguinaldo que sabe. Os capítulos vêm e a gente fica meio sem saber o que ele vai aprontar. Já está escrevendo lá na frente. Sei que o Nicolau vai achar que a filha está sendo assediada pelo empresário. É bom fazer cenas assim, fortes e contundentes, em uma novela.
O Nicolau vai continuar com o desejo de ter um filho jogador de futebol?
Não sei. Aí é com o Aguinaldo. Não posso falar muito.
A Afrodite passou a bater de frente com o marido. Essa mudança de comportamento pode deixar o Nicolau menos rude?
Eu acho que a Afrodite vai, em algum momento, largar esse cara. Mas ele também pode no futuro, não sei, querer fazer de novo um filho.
Você acompanha a repercussão do personagem nas redes sociais?
Sim. Depois da cena em que ele levou chibatadas, foi muito bom. Até o Aguinaldo falou: “Posso me aposentar depois dessa cena”. Ele escreveu uma sequência muito contundente da “porradaria” da família. Muitas pessoas comentaram no Twitter e no Instagram, que eu uso muito.
Botei a cena e surgiram muito comentários, positivos e de pessoas com ranço. Ninguém aguenta esse personagem. É legal fazer uma cena assim. Quando há uma cena contundente em uma novela com tantos personagens, é sempre uma coisa que causa felicidade.
Como são as gravações com o seu núcleo?
É um núcleo legal e à parte na novela. Tanto que gravamos separados com frequência. Todo mundo passa pelo trailer do BB na Chapa. Então, há cenas em que a gente tem que estar lá.
Você tem liberdade para criar em cena?
Tenho. O Papinha (Rogério Gomes, diretor) é muito generoso. Com o negócio do pente, nem perguntei se poderia. Penteei. Eu não peço nada, eu faço. Se o diretor mandar cortar, eu corto, mas eu faço. O barato é isso. Outro dia eu falei: “Hambúrguer e prazer, só no X-BB”. Com a minha filha, eu falei: “Vai lá, shimbalaiê!”.
Shimbalaiê é a música da Maria Gadú. É uma brincadeira que estou fazendo, e espero que ninguém leve isso a ferro e fogo. Não é o Marcelo Serrado, o personagem que é assim, e ele tem essas questões todas. Acho que trazer humor para um personagem que tem uma certa vilania faz com que ele fique mais interessante aos olhos do público.
Você conhece alguém com personalidade parecida com a do Nicolau?
Não. Tenho histórias de amigos, como um que conversou comigo outro dia. Ele é gay, casado com um rapaz e o pai dele era um militar forte, do interior de São Paulo. Foi alvo de muito preconceito do pai, que agiu de forma extremamente rigorosa durante sua adolescência por causa da escolha que fez. Agora o pai já o aceita, mas no começo foi barra pesada.
Alguém já te abordou concordando com as atitudes do Nicolau?
Nunca ninguém falou. Fui ao Maracanã outro dia e os caras estavam rindo. Acham engraçado.
O machismo está enraizado na sociedade brasileira?
Esse cara machista, como o Nicolau é, existe. A gente vê pessoas sendo espancadas no interior do Brasil. No meu Instagram, as cenas têm dez mil views. O Aguinaldo comenta com as pessoas no Twitter, a Carol também. Foi uma cena que criou um impacto.
Como você enxerga as questões que seu personagem condena?
Eu sou um cara de cabeça aberta. O mundo hoje em dia está muito aberto. O que o Nelson Rodrigues fazia, de duas meninas com 12 anos se beijando em uma cena no convento, era uma coisa. Hoje em dia, as meninas estão se beijando com 13, 14 anos. Isso não é mais uma questão. E quem achar isso, parou no tempo. Temos que estar abertos às novas coisas da vida.
Eu vou amar meus filhos, independente das escolhas que fizerem em relação a qualquer coisa. Vou estar ao lado deles no que fizerem. A minha filha mais velha está com 13 anos. Outro dia, ela falou que deu um selinho pela primeira vez. Contou para a mãe, que me contou. Eu perguntei: “O menino estuda na sua sala?”. Ela respondeu: “Não, pai. Ele estuda na outra sala, mas não quero falar
disso”. Eu falei: “Tá bem”. Tenho uma relação muito aberta com meus filhos.
O que seus filhos acham do Nicolau?
Eles não veem porque estão dormindo. A mais velha também não vê porque acorda cedo. Vê depois, no Globoplay, uma coisa ou outra. Ela me acompanha pouco, mas quando vê gosta.
O Crô ficou marcado em sua vida?
Está marcado. Estava fazendo Velho Chico, no sertão da Bahia, e o Luiz Fernando de Carvalho (diretor) gritou: ‘Olha o Crô ali!’. Faz parte. Quantos atores não queriam ter um personagem como a Carminha (Adriana Esteves, em Avenida Brasil), o Crô ou o Félix (Mateus Solano, em Amor à Vida)? Eu só tenho a agradecer.
Você prefere trabalhar em TV, cinema ou teatro?
Eu gosto de tudo. Vou atrás de bons personagens. Em 2018, fiz muito cinema. Fiz uns seis filmes. Fiz um musical também: A Noviça Rebelde. Meu próximo projeto no teatro é um musical. Depois dessa novela, vou ver se descanso um pouco. Vim de Pega Pega (2017), emendei com cinco ou seis longas, o musical e essa novela.
Ainda fui para a Colômbia gravar uma série. Estou indo agora em janeiro lançar a série na Telemundo. Dia 22 estarei lá para lançar Jugar com Fuego. No meu Instagram tem um teaser de Amores Roubados. É a primeira série em parceria da Globo com a Telemundo.
Como é a série Jugar com Fuego?
É uma série com atores de oito países diferentes da América Latina. Tem de Cuba, México, Porto Rico, Peru, Argentina, Brasil e outros dois. Acho que é uma boa iniciativa para a gente ir para o mercado hispânico. É uma história original da Rede Globo que saiu e foi para outro lugar. Isso me dá muito orgulho também.
Provavelmente, a Globoplay vai acabar passando no futuro. Tem a ver com a plataforma. E certamente vai colocar legendas em português. Provavelmente, será uma parceria que vai se estender. Poderão vir depois, sei lá, Como Nascem os Fortes, O Rebu ou Assédio em espanhol.