Peça sobre homofobia e opressão lota teatro e arranca aplausos na UnB
Revide, com direção de Bruna Dutra, faz parte do projeto Quartas Dramáticas, que ocorre todo semestre na universidade
atualizado
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Durante quatro meses, 13 alunos da UnB se reuniram em um teatro do subsolo da universidade para dar luz à Revide, peça teatral com roteiro de Felipe Uchôa e direção de Bruna Dutra e Guilherme Liones. A obra, orientada por André Gomes, professor e coordenador do projeto Quartas Dramáticas: Leituras Cênicas, estreou nessa quarta-feira (28/11) e lotou os 60 lugares do teatro, fazendo sucesso entre o público, que aplaudiu de pé após o espetáculo.
A peça foi marcada por um texto com fortes críticas à homofobia, opressão, manipulação pela mídia e ao excesso de masculinidade, sendo a maioria dos personagens interpretados por homens. Além disso, críticas ao estereótipo do “cidadão de bem” e ao “homem de família”, que deseja fazer justiça com as próprias mãos, se fazem presentes de forma explícita.
O enredo gira em torno de um caso de homofobia que ocorreu em São Paulo, no qual irmãos foram confundidos com um casal homossexual e acabaram sendo espancados ao caminharem na rua Augusta. Guilherme Liones e Marisa Miranda interpretam as duas vítimas da agressão cometida por Gigio, personagem principal encenado por Diego Paz. Durante a peça inteira, que se inicia com o nascimento da vítima, os atores interpretam homens violentos e com masculinidades frágeis, contendo diversas falas que criticam esse comportamento.
“Fui um menino que apanhei de outros meninos, e hoje em dia guardo minha masculinidade em meus músculos subdesenvolvidos”, repete constantemente uma das vítimas. “Não há nada de feminino em mim, portanto, não há nada de humano em mim”, relata a personagem. Enquanto isso, Gigio reencarna a homofobia, agressividade, o extremismo e veste uma camisa do Brasil durante todo o espetáculo, como uma possível crítica à atual situação política do país.
Os únicos papeis femininos foram os das âncoras, que representam uma mídia tendenciosa, parcial e manipuladora. As atrizes Gabriela Neves, Maria Clara Mendes e Daniele Souza incorporaram de forma cômica as personagens. Do início ao fim, mantiveram um sorriso no rosto, mesmo em meio à tanta violência e caos que noticiavam ao público.
“Gigio é um típico cidadão de bem hipócrita, idealizador de um mundo livre de pessoas que ele não gosta, as ditas minorias. Ele é um típico eleitor do Bolsonaro”, declarou Marisa, que interpreta a vítima em Revide.
Uma interpretação que chamou a atenção do público foi a de Benjamin Figueredo, que representa o subconsciente coletivo e a opinião pública. “Meu personagem é como se fosse a caixa de comentários de um site qualquer de notícias, principalmente os comentários negativos”, disse.
A todo momento, o “subconsciente” faz apologia à vingança, sempre atuando como uma voz na cabeça das vítimas que as aconselha a revidar o ato e, até mesmo, a assassinar o personagem.
“O sonho do oprimido é ser o opressor, mas não se pode confundir a reação dele com a violência do opressor”, fala uma das vítimas durante o monólogo final. Por fim, uma vítima opta pela vingança, enquanto a outra, que permaneceu a peça inteira em silêncio e angustiada, encerra o espetáculo levantando uma pergunta para a plateia: “Eu tenho duas opções: me vingar ou perdoar. O que você faria no meu lugar?”.
A gravação completa de Revide será editada e publicada em breve no YouTube e Facebook do projeto Quartas Dramáticas.
Reação do público
Com uma plateia bem receptiva ao roteiro de Revide, que recebeu risadas em momentos de sátira e aplausos estrondosos no final, tornou-se difícil encontrar algum espectador que tivesse críticas negativas ao espetáculo.
Fernanda Neves, irmã de uma das âncoras, conta que realmente se sentiu tocada pela mensagem transmitida pela peça. “O que eu mais gostei foi o final, no qual eles deixaram o público escolher entre a vingança e o perdão”, disse Fernanda. “Também senti que o Diego, ator de Gigio, deu tudo de si e levou o personagem para casa para conseguir interpretar esse papel”, continuou a espectadora.
Já Marcelo Alves, que assistiu ao lado de Fernanda, compartilha da mesma visão. Porém, ele chama atenção para o papel das âncoras. “O que me pareceu mais interessante foram as jornalistas representando de forma engraçada algo que não tinha graça alguma”, conta.