Sem caretice: conheça as baladas mais frequentadas por idosos no DF
Seguimos o roteiro dos baladeiros “da melhor idade” e descobrimos histórias incríveis de farra e paixão
atualizado
Compartilhar notícia
Há tempos a chamada terceira idade deixou de ser sinônimo de velhice e as festas noturnas, reduto apenas dos jovens. Na capital federal, existe um roteiro atraente para o público acima de 60 anos em busca de boa música, diversão e também muita paquera. O Metrópoles visitou os principais pontos de encontro dos idosos baladeiros do DF e descobriu histórias emocionantes e inspiradoras dos festeiros da “melhor idade”. Eles têm mais disposição do que muitos jovens por aí.
Alguns bailes acontecem, semanalmente, entre as quintas e segundas-feiras. A maioria dos eventos é realizada há cerca de 20 anos e reúnem frequentadores cativos. Os mais badalados estão no Guará, Gama, Núcleo Bandeirante, em Taguatinga, Ceilândia, e na Asa Sul. E, diferentemente do que sugere a letra de Silêncio da Seresta (1958), interpretada por Nelson Gonçalves, ainda hoje, nas “noites de prata, violões em serenata enchem o céu de amor”.
Ao falar de amor verdadeiro, os românticos tendem a imaginar como seria envelhecer ao lado da pessoa amada. Mas a história do casal Jonas Francisco, de 65 anos, e Elizabeth Santos, 60, prova que não existe idade nem lugar certos para encontrar a alma gêmea.
Amor à primeira vista
Era a terceira vez que a servidora Elizabeth Santos ia com as amigas à Seresta do Clube dos Previdenciários quando conheceu o ex-jogador de futebol Jonas Francisco. Bastou um olhar e uma “cruzada de pernas” para que Jonas a convidasse para dançar. “De 0 a 10, qual chance tenho de te beijar?”, perguntou ele. “Respondi zero, para ele não me achar fácil, mas a vontade era dizer dez”, relembra Beth.
O primeiro encontro aconteceu há 15 anos e, desde então, o casal não se separou mais. São 10 de casados, já que nos cinco iniciais Jonas “enrolou” a namorada o quanto pôde. “Ele não queria nada sério, mas eu soube dobrá-lo”, afirma a aposentada. “Foi amor à primeira vista”, reforça o esposo.
Como na primeira dança, os apaixonados continuam a rodopiar de rosto colado pelo salão. “Sentamos sempre na mesma mesa em que nos conhecemos. Fomos eleitos o casal mais assíduo daqui, ganhamos um ano inteiro de entrada franca”, conta Elizabeth.
Dançar para curar a depressão
Perder o companheiro com quem dividiu a vida durante 49 anos foi um baque terrível para Alaíde Oliveira Kavamoto, 85. A solidão e tristeza profundas levaram a aposentada à depressão. Orientada por seu médico, ela buscou sair do ócio. “Tocava violão, me distraía, mas quando parava, me sentia sozinha novamente”, relembra.
Ela conheceu a Seresta do Previ por meio de amigas. E, em vez de distração, dona Alaíde reconquistou a alegria de viver. “Aqui, renasci, fiz amigos, recuperei minha saúde física e mental. Hoje, sou independente”, ressaltou. Vaidosa, a aposentada fez questão de retocar o batom antes de ser clicada pela reportagem enquanto dançava sozinha em meio aos casais do salão. “Não me privo de vir por não ter companhia. Divirto-me da mesma maneira.”
Reencontros
Dois casais compartilham 35 anos de amizade, viajam juntos e promovem almoços familiares com frequência. Mas o destino resolve distanciá-los. Dez anos depois, Apparecido Walmyr, 79, fica viúvo e Dirce de Oliveira, 73, divorcia-se do marido. Bons amigos, decidem ajudar um ao outro a recomeçar a vida. Ela então convida o amigo para a Seresta do Previ, a fim de apresentar possíveis namoradas ao militar aposentado.
“Em determinado momento, decidi chamá-la para dançar e, enquanto com ela, perguntei-me o porquê de estar procurando outras mulheres, se quem eu queria estava em meus braços”, conta, emocionado. Como uma adolescente, Dirce revela ter relutado para retribuir o sentimento por medo de estragar a parceria. “Dizia que não, falava para o Apparecido ficar com uma das minhas amigas, mas ele insistiu e não resisti”, sorri ao lembrar.
Com cinco anos de namoro, afirmam não ter intenção de se casarem. “Não moramos juntos, uma sexta-feira vou dormir com ele e, na semana seguinte, o contrário”, explica a dona de casa.
Falta divulgação
Juntos há 42 anos, Ademir Gomes Pereira, 67, e Iradir da Silva Pereira, 63, sempre foram boêmios. Após ver os três filhos construírem suas próprias famílias, o casal dedica a maior parte do tempo livre ao hobby preferido: a dança. Além do Baile do Nenen’s Chopp, em Taguatinga, frequentam o do Sesi, no Núcleo Bandeirante, e o Forró da Dona Maria José, no Salão da Terceira Idade, no Gama Oeste.
“Nós sentimos falta de divulgação, muitas pessoas da nossa idade ficam trancadas dentro de casa por não saber que existem tantas opções”, reclama Iradir. “Dançar é saúde. Faz bem para a alma, mente e corpo”, garante Ademir.
Setenta com disposição de trinta
Forró é o ritmo predileto do aposentado José Valneio Vasconcelos, 70. Pelo menos três vezes por semana, ele sai para dançar. Às vezes, chega a marcar presença em mais de uma festa por dia. Como no domingo (25/3), quando o encontramos no Baile dos Amigos, no Guará II. “Hoje, cheguei às 14h ao Forró do Lúcio Costa, fiquei lá até 19h. Depois, vim direto para cá. E serei o último a sair da pista”, prometeu.
Na segunda-feira (26/3), voltamos a esbarrar com o senhor José Valneio. Desta vez, ele vinha do Forró do Ginásio Paradão, em Taguatinga. Ficou lá do início ao fim, das 14h às 19h. O aposentado chegava para o segundo round do dia, no Baile do Nenen’s Chopp, também na mesma cidade. “Não canso, sou mais ativo do que muitos meninos. Vários jovens sequer conseguem fazer isso”, gaba-se.
Divorciado há cinco anos, Valneio garante não estar em busca de namorada. “Só venho para dançar e me divertir com as pessoas. Sou muito conhecido aqui, somos como uma família. Todos me respeitam”, conclui.
Maria de Lourdes, 67, e Eduarte Gomes de Aguiar, 70, se conheceram há um ano no Baile dos Amigos. Ainda em clima de lua de mel, o casal acaba de voltar de viagem ao Tocantins. “Fui apresentá-la à minha família e todos ficaram apaixonados por ela”, disse Eduarte. Apesar do pouco tempo, os dois concordam que, enfim, encontraram o amor para a vida inteira. “É como a música que está tocando, ‘ele não me larga eu e eu não largo ele'”, completou Lourdes.
Para os casais Ayd Alves de Sousa, 69, e Carlos Francisco, 65; e Maria Isabel Monton, 73, e Severino Fernandes, 65, o Baile dos Amigos serve para que a relação não esfrie mesmo depois de tanto tempo juntos. “Nós dançamos agarradinhos como quando nos conhecemos. Nada mudou”, contou Ayd. Já para Maria Isabel, o gosto em comum pelo salão mantém os dois mais unidos.