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Ilustradoras discutem representações machistas no mangá

O Metrópoles convidou Ju Loyola, Kari Esteves e Renata Rinaldi para falar sobre as personagens femininas em tempos de #MeToo

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group anime girl manga vector illustration eps 10
1 de 1 group anime girl manga vector illustration eps 10 - Foto: iStock

O mangá, tradicional formato japonês de histórias em quadrinhos, habitou a infância de muitos brasileiros – e é fonte de leitura para vários geeks até hoje. A arte secular tem diversos segmentos que atendem a todo tipo de público: o kodomo, por exemplo, pode ser descrito – grosseiramente – como destinado a crianças, enquanto o josei é feito para mulheres jovens e adultas. As classificações também se estendem a estilos: harém é o mangá de um personagem masculino cercado de mulheres, magical girl trata-se de um estilo mais fantástico, como o famoso Sakura Card Captor.

Um dos estilos mais famosos é o hentai, com seus desenhos pornográficos e histórias majoritariamente sobre sexo heterossexual. As representações femininas nesse estilo – e em muitos outros – são desconcertantes. Elas são desenhadas com seios imensos e muitas vezes em posições ginecológicas, retratadas como frágeis e passivas ou histericamente agressivas. Geralmente, ocupam a posição de interesse romântico do protagonista, que na maioria das vezes está indisponível para o relacionamento amoroso. Em tempos de #MeToo, representações assim são cada vez mais questionáveis.

“Tem gêneros que objetificam a mulher sem quaisquer escrúpulos, como o hentai e o lolicon. Existem clichês de personagens, como mulheres dentro do estereótipo da fofinha e submissa, ou a agressiva apaixonada pelo protagonista. Isso é muito estigmatizado na narrativa japonesa”, pontua a ilustradora e quadrinista mineira Renata Rinaldi, radicada em Brasília há 8 anos.

Leitora de mangás desde criança, Renata lembra de um aspecto dos quadrinhos que sempre a incomodou: os tombos das personagens nas histórias. “Se elas caem no chão, é sempre em alguma posição ginecológica, com os seios no rosto do personagem masculino, a roupa abre… Existe uma sexualização muito forte”, analisa a artista.

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A mineira Renata Rinaldi prefere dar personalidade aos seus desenhos femininos, sem tratá-las como uma cota
A artista conta que gosta de fazer suas crianças "bem sapequinhas"
"Crio personagens femininas com iniciativa e irreverência, transgressoras, de certa forma." - Renata Rinaldi
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Em Heart of the True Friend, de Ju Loyola, um garoto deixa de jogar um videogame frustrante para encontrar amigos no futebol

Ju Loyola/Divulgação
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A mineira Renata Rinaldi prefere dar personalidade aos seus desenhos femininos, sem tratá-las como uma cota

Renata Rinaldi/Divulgação
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A artista conta que gosta de fazer suas crianças "bem sapequinhas"

Renata Rinaldi/Divulgação
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"Crio personagens femininas com iniciativa e irreverência, transgressoras, de certa forma." - Renata Rinaldi

Renata Rinaldi/Divulgação
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Renata Rinaldi/Divulgação

Para a ilustradora e quadrinista Ju Loyola, vencedora de cinco prêmios internacionais de mangá, um grande problema no gênero é a predominância masculina de homens como ilustradores. “Infelizmente ainda temos poucas heroínas e artistas femininas. Acredito que o mangá precisa se atualizar, e muito. Todas minhas protagonistas são femininas, eu adoro esse destaque. Sempre dou a elas poderes, são fortes, sedutoras, românticas, misteriosas…”, descreve.

Personagens fortes
Nem toda representação é ruim: mangás inspiradores ajudaram as artistas a criarem suas próprias personagens. “Animes como Macross, em que a música de uma garota aliada ao poder de luta de um soldado foram suficientes para combater o mal, me fizeram ver que mulheres podem ser importantes em uma história”, comenta a ilustradora Kari Esteves.

Para Kari, bons exemplos podem ser encontrados nos shoujos, mangás destinados a garotas adolescentes. “Gosto de Nana, porque as personagens correm atrás de seus sonhos e mesmo quando as coisas não saem como queriam, elas dão a volta por cima”, opina. Segundo Renata, um bom ponto de partida é procurar mangás da Clamp – estúdio criado por quatro japonesas. De lá, saíram clássicos como a própria Sakura e também as Guerreiras Mágicas de Rayearth.

Veja mangás recomendados pelas artistas entrevistadas:

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Ran to Haiiro no Sekai foi criado pela ilustradora Aki Irie e conta a história de uma garota criada em uma família de bruxas
Azumi trata da protagonista homônima ao mangá, uma jovem criada por assassinos no Japão feudal
Tongari Boushi no Atelier conta a história de Coco, uma garota de cidade pequena que sonha em se tornar uma maga
Toradora! conta a história de um grupo de adolescentes passando pelo ensino médio
Your Name é, originalmente, um filme e um romance, lançados simultaneamente em 2016. A adaptação para o formato de mangá segue a mesma história: uma menina do interior do Japão troca de corpo com um garoto que vive em Tóquio
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Em Garota Revolucionária Utena, a protagonista é uma garota tomboy que faz parte de uma academia de espadachins e luta para defender outra aluna, Anthy. O mangá foi criado pela artista Chiho Saito

Shogakukan/Reprodução
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Ran to Haiiro no Sekai foi criado pela ilustradora Aki Irie e conta a história de uma garota criada em uma família de bruxas

Beam Comix/Reprodução
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Azumi trata da protagonista homônima ao mangá, uma jovem criada por assassinos no Japão feudal

Shogakukan/Reprodução
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Tongari Boushi no Atelier conta a história de Coco, uma garota de cidade pequena que sonha em se tornar uma maga

Morning Two/Reprodução
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Toradora! conta a história de um grupo de adolescentes passando pelo ensino médio

ASCII Media Works/Reprodução
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Your Name é, originalmente, um filme e um romance, lançados simultaneamente em 2016. A adaptação para o formato de mangá segue a mesma história: uma menina do interior do Japão troca de corpo com um garoto que vive em Tóquio

Yen Press/Reprodução
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Little Witch Academy seguiu o caminho inverso da maioria dos mangás: originou do anime. Na história, jovens garotas estudam para se tornarem bruxas

Shueisha/Reprodução
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Nana foi criado pela roteirista e ilustradora Ai Yazawa e conta a história de Nana Komatsu e de Nana Osaki, duas xarás que se conhecem em uma viagem de trem e continuam se cruzando pela vida

Shueisha/Reprodução
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Escrito e ilustrado por Hiromu Arakawa, Fullmetal Alchemist é um clássico sobre Al e Ed, dois irmãos alquimistas que pagarem o preço de tentar reviver a mãe

Square Enix/Reprodução
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Outro clássico é Sakura Card Captors, famoso no Brasil nos anos 2000 por seu anime. Na história, a jovem Sakura, com a ajuda de sua melhor amiga, Tomoyo, tenta reunir as cartas Clow

Clamp/Reprodução
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Sailor Moon é outro sucesso no Brasil: trata-se de um grupo de guerreiras mágicas que se unem para salvar o mundo

Kodansha/Reprodução
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A Princesa e o Cavaleiro é um clássico de 1953, de Osamu Tezuka. Na história, a princesa Safira se veste de cavaleiro para impedir que o duque Duralumin usurpe seu trono

Kodansha/Reprodução
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Em As Guerreiras Mágicas de Rayearth, três garotas de 14 anos são enviadas para uma realidade paralela com a missão de resgatar uma princesa raptada

Clamp/Reprodução

Problema cultural?
Muito se discute se o machismo nos mangás não seria um problema cultural do Japão. Caberia a nós, brasileiros, criticar e cobrar mudanças da indústria japonesa?

“Acho que é muito importante pensar no contexto cultural japonês, mas isso não quer dizer que mangás com hipersexualização feminina, violência contra mulher ou pedofilia sejam normais, apenas por pertencerem a outra cultura”, opina Rebeca Puig, roteirista e editora do site Nebulla. A preocupação com a representação é quase óbvia: se ali estão desenhadas alegorias de mulheres japonesas, a narrativa pode servir na sustentação de comportamentos machistas.

Acho que o mundo todo vem passando por um momento de discussão sobre como mulheres devem ser representadas na mídia e tratadas dentro do mercado de trabalho. Como em qualquer área, o mercado de ilustração japonês carrega o machismo da sua sociedade. Sempre existiram mulheres ali, e elas são tão ou melhor sucedidas do que muitos dos homens considerados gênios

Rebeca Puig, roteirista e editora do site Nebulla

Os tempos estão mudando: segundo Kari Esteves, as coisas melhoraram no Japão. “Garotas têm papéis bem mais influentes nos mangás, embora a figura da mulher indefesa ou objetificada ainda exista. Mas em shoujo especialmente, elas ganham um destaque sensacional”, comenta.

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