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Especialistas explicam por que livros não têm classificação indicativa

Especialistas do mercado editorial debatem a falta de regulamentação na classificação indicativa de livros e explicam a ausência do tema

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Livro com luz vermelha mostra pessoa folheando as páginas - Metrópoles
1 de 1 Livro com luz vermelha mostra pessoa folheando as páginas - Metrópoles - Foto: FreePik

“Aviso de conteúdo: cenas de sexo explícita, gravidez, breve discussão sobre aborto, capacitismo em relação à desigualdade de membros, ex-parceiro verbalmente abusivo, depressão, suicídio, câncer, amputação”, diz a nota do autor do livro Minha Melhor Parte (ed. Globo Livros), novo sucesso das redes sociais escrito por Hannah Bonam-Young.

O cuidado da autora canadense e de outros escritores, principalmente os voltados para a literatura sobre temas tabus, acende um debate sobre a falta de regulamentação na classificação indicativa de livros. Afinal, por que não existe a mesma regra aplicada a filmes e programas de TV?

Capa do livro Minha Melhor Parte - Metrópoles
Minha Melhor Parte é o mais novo sucesso do TikTok e conquistou o público com o tema sensível que aborda.

A resposta mais simples é: não há legislação. A classificação indicativa de programas de televisão, cinema, vídeo doméstico (DVD), jogos eletrônicos e aplicativos, jogos de RPG, programas de rádio, espetáculos públicos e vídeo por demanda (VOD) são previstos pela Constituição Federal de 1988 e regulamentados por outros dispositivos legais, como o Estatuto da Criança e do Adolescente e portarias do Ministério da Justiça. Os livros, no entanto, não são considerados produtos classificáveis, assim como aponta o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), responsável pela regulamentação no Brasil.

O filme Cinquenta Tons de Cinza, por exemplo, teve classificação indicativa estabelecida para maiores de 16 anos. Incluído na categoria Romance Erótico, o livro de E. L. James — lançado no Brasil pela editora Intrínseca — vendeu mais de 150 milhões de cópias no país e fez sucesso entre um público mais jovem, que acompanhou as aventuras sádicas de Christian Grey sem nenhum tipo de restrição.

Liberdade de expressão

Cinquenta Tons de Cinza foi uma das obras que rompeu o nicho do romance erótico e chegou a outros públicos. Desde então, obras de taboo romance e dark romance, que trazem temas sensíveis como estupro, pedofilia, violência contra a mulher, submissão e mais, além de obras com conteúdo sexual explícito, tomaram conta das redes sociais.

Com mais de 1,4 milhão de publicações apenas no TikTok e outros 1,6 milhão no Instagram, além de uma coleção de livros autopublicados em plataformas e lançados por editoras, o dark romance se popularizou pelos temas tabus e os personagens tipicamente maldosos, geralmente mafiosos bombados, empresários gostosos e bandidos malvados que brincam com o imaginário de quem lê.

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“Abordar um assunto não quer dizer que se compactua com ele, inclusive vem escrito na nota da autora sobre ser uma obra fictícia. Existem em filmes e séries as mesmas cenas ou até piores e as pessoas decidem se querem ou não ver, assim deveria ser com o dark romance também. Esse gênero não é para todos, assim como filmes de terror ou literatura clássica também não são”, pontua Kah, dona de um perfil voltado para o tema.

Mas afinal, por que não existe uma classificação indicativa em torno dos livros? O Ministério da Justiça e Segurança Pública entende que o assunto é vetado pelo princípio da liberdade de expressão, também prevista na Constituição Federal. A exceção fica por conta das obras regidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

“É importante destacar que a Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) determina que publicações com conteúdo impróprio ou inadequado para crianças e adolescentes sejam comercializadas em embalagem lacrada, com advertência de seu conteúdo e do art. 79 da Lei nº 8.069/1990, que especifica que: ‘As revistas e publicações destinadas ao público infantojuvenil não poderão conter ilustrações, fotografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e munições, e deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família'”, diz o órgão em nota.

Impacto no mercado editorial

O tratamento dado ao assunto no Brasil está alinhado com o de diversos países ao redor do mundo, onde a liberdade de expressão é um valor fundamental.

Sevani Matos, presidente da Câmara Brasileira do Livro

No mercado editorial, a possível distinção de idade para os livros segue a mesma ideia de outros países, como Estados Unidos, Alemanha e França. Apesar da falta de obrigatoriedade, editoras cedem a plataformas de venda, como a Amazon, dados de classificação indicativa sugerida.

Segundo Rafaella Machado, editora do grupo Record, a demanda de padronização de idade para livros voltados ao público jovem vem crescendo, mas explica que há dificuldade em determinar o tema. “A grande dificuldade em padronizar uma classificação indicativa para os livros é determinar uma idade certa de leitura para cada obra, em especial na infância, quando a habilidade e competência do leitor podem ser diferente mesmo em crianças da mesma idade”, explica.

“Na minha opinião, apesar de ser importante sinalizar o tipo de conteúdo presente em uma obra, é ainda mais importante a forma como aquele conteúdo é abordado. Se o livro contém menção a uso de drogas ou menção a abusos, por exemplo, mas essa abordagem é feita com cuidado, passando uma mensagem importante e alertando sobre possíveis consequências, meu medo é que esses avisos afastem o jovem de um livro que justamente está lá para tratar desses assuntos com ele de forma adequada”, completa.

Sevani Matos, presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL), segue a mesma ideia de Machado: “No mercado editorial brasileiro, a indicação etária é utilizada especificamente para livros voltados ao público infantil e infantojuvenil. A orientação de idade nessas obras visa auxiliar pais, educadores e bibliotecários na escolha de conteúdos apropriados para o desenvolvimento de cada faixa etária. Porém, mesmo nesses casos, a indicação é apenas orientativa, não restritiva, pois especialistas acreditam que cada leitor tem um ritmo e uma capacidade únicos para interpretar temas com a orientação de professores e familiares.”

Matos ainda garante que a CBL, responsável por representar editores, livreiros, distribuidores e demais profissionais do setor, não pretende discutir regulamentação em classificação indicativa de livros, alegando que “cabe aos adultos acompanhar as escolhas de leitura dos jovens e mediar temas mais complexos, sem comprometer a curiosidade natural dos leitores”.

Rafaella Machado ainda lembra que o mercado editorial atual é sustentado, na maioria, pelos jovens e é importante não “menosprezar a inteligência do leitor”. A leitura contribui muito para a formação do pensamento crítico, da linguagem e do repertório linguístico do adolescente e nosso papel é orientar esse jovem para que ele possa continuar lendo e pensando sobre o que leu ao longo da vida, oferecendo opções de qualidade para cada etapa de seu desenvolvimento”, conclui.

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