Senado aprova projeto que permite destruição de documentos originais
Especialistas afirmam que a medida, conhecida como “queima de arquivo”, traz insegurança jurídica e prejudica a produção da história do país
atualizado
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O patrimônio documental brasileiro está em risco. O Senado aprovou, no último dia 14, o Projeto de Lei nº 146/07, que autoriza a destruição de um documento original após a digitalização do mesmo. Engavetada há 10 anos, a proposta foi colocada em votação no plenário da Casa pelo senador Magno Malta (PR-ES).
De acordo com o projeto, conhecido como “queima de arquivo”, os documentos podem passar por uma validação não científica, digitalização e armazenagem em mídia ótica autenticada. Depois deste processo, fica autorizada a destruição por meio de incineração, objetos mecânicos ou outro meio que garanta seu fim.
O professor de informação digital da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp) Charlley Luz afirma que o projeto está desatualizado, provoca instabilidade jurídica e prejudica o acervo documental brasileiro.“A medida permite que processos judiciais utilizem apenas arquivos digitalizados. Porém, caso surja alguma dúvida, não será possível conferir o documento original, já que ele estará destruído”, explica o professor. “Além disso, o método previsto na lei é desatualizado, data de 2007. Há outros meios de virtualizar os arquivos de forma mais eficiente e correta”, avalia.
Apesar de o projeto não atingir documentos já considerados históricos – que incluem papéis do período colonial e imperial brasileiro –, o professor se preocupa com a produção de dados na atualidade. “A história do país se faz todos os dias, por meio de seus documentos. Sem eles, pode-se prejudicar a produção historiográfica em um futuro próximo”, entende.
Equívocos
O ex-curador digital da Biblioteca Britânica e atual pesquisador em curadoria digital da Biblioteca Nacional, localizada no Rio de Janeiro, Aquiles Brayner também discorda do projeto de lei. Para ele, trata-se de um ataque à memória nacional e um ato de ignorância por parte dos responsáveis pelo projeto.
É uma aberração. Não há qualquer política de arquivamento nacional e sequer há um padrão de digitalização no Brasil. Perder o original é correr o risco de ter uma imagem solta num sistema caótico
Aquiles Brayner
O Conselho Nacional de Arquivos (Conarq), responsável por regulamentar políticas nacionais que dizem respeito aos documentos do país, repudiou o projeto. Em um trecho, a instituição comenta que o “PL possui equívocos ao alterar importantes dispositivos legais, pois extingue a função genuína de prova ou testemunho de grande parte dos documentos arquivísticos”.
De acordo com a assessoria do senador Magno Malta, a proposta de lei pode ser alterada a partir do momento em que “os segmentos interessados se manifestarem”. De acordo com a equipe do parlamentar, o projeto serve para levantar o debate e trazer à tona a possibilidade de “modernizar” o arquivo nacional.