MC Cabelinho protesta no disco Ainda: “Quem mora em favela também é gente”
Em apenas 24 horas, o álbum bateu sete milhões de views no YouTube e ficou entre os assuntos mais comentados do Twitter
atualizado
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Lá na década de 1990, quando Cidinho e Doca lançaram o Rap da Felicidade, o funk tinha um olhar mais voltado para dentro das favelas. De lá para cá, o estilo seguiu para outros caminhos e ganhou o mundo. Agora, MC Cabelinho resgata o tom político do ritmo com o lançamento de Ainda, disco que, em menos de 24 horas, bateu sete milhões de views no YouTube e ficou entre os assuntos mais comentados do Twitter.
Ao longo de 13 faixas, o artista transforma em música todos os sons do lugar onde cresceu, o PPG – conjunto das comunidades Pavão-Pavãozinho e Cantagalo, no Rio de Janeiro. “As letras do álbum são muito reais porque falam de problemas sociais, de política, de vida mesmo”, ressalta o MC em entrevista ao Metrópoles.
Com a ajuda dos DJs Juninho e Portugal, MC Cabelinho deu contornos de trap, rap e funk a sons como as sirenes policiais, os tiros de fuzil e até os coros de igreja. A ideia, segundo o funkeiro, é fazer o país se levantar contra o racismo estrutural. “Se eu não acreditasse no poder da arte, eu não teria lançado Ainda”, afirma Cabelinho.
É impossível ouvir os versos de Reflexo, música com participação de BK, e não lembrar do caso João Pedro, de 14 anos, morto dentro de casa, durante ação policial, em São Gonçalo (RJ). “Minha nossa senhora essa madrugada nem deu pra dormir/O barulho do águia sobrevoando me fez despertar/ Passou no jornal a polícia invadindo e claro que eu ouvi/A troca de tiro impede outra vez o meu filho de estudar”, diz trecho da canção.
Denunciar a truculência policial e o descaso dos governantes com as vidas pretas também é parte da missão de MC Cabelinho com Ainda. “Parece que as autoridades esquecem que quem mora em favela também é gente. É violência, é desprezo… se nós, os artistas, não dermos voz às minorias, as coisas vão ficar muito mais difíceis”, salienta o músico.
Com as discussões sobre igualdade racial aquecidas por movimentos como o Black Lives Matter, as novas canções de MC Cabelinho tiveram rápida aceitação e enorme repercussão nas redes sociais. “Eu fiquei surpreso quando eu entrei pros Trends Topics do Twitter. Fiquei emocionadão. Mas imaginava que meus fãs iam chegar junto. A rapaziada sempre fortalece e isso só me dá mais força”, comemora.
Nem só de luta vive os jovens da favela, eles também amam e se divertem. É o que o cantor destaca em faixas como Beco do Pistão e Em Busca do Prazer, que retratam a vida de solteiro no morro, além de Essa Noite e Recaídas, com batidas mais ligadas ao pop, versos mais românticos e participações do cantor Gaab e da cantora Budah, respectivamente.
“Só tem parceiro no meu álbum. Admiro o trabalho de todo mundo ali. Já tinha gravado com MC Hariel, Dfideliz, DJ Juninho… BK, meu irmão! A Budah eu conheci pelo Juninho, ele me mostrou uma música dela e eu me amarrei no som”, lembra.
Aos 23 anos, MC Cabelinho construiu sua carreira tendo a internet como principal ferramenta de divulgação. Apesar disso, é na união do povo do PPG que o funkeiro credita o sucesso. “Acho que o funk é disseminado nas favelas de forma diferente. É na roda de amigos, é na rádio da comunidade… a favela é muito unida, tá ligado?”, conclui.