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Jukebox Sentimental: caminhoneiros são engrenagem da música nacional

Roberto Carlos e Sula Miranda, por exemplo, marcaram uma geração de trabalhadores da estrada

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1 de 1 sula - Foto: Reprodução

O guri vem todo saltitante com a bandeja cheia de quitutes pela rua até se deparar com uma imponente Scania HL 141, vermelha, parada pelo caminho. Atônito, o menino dispara: “Fala, motorista, não quer adoçar a boca, não?”. Já com a cabeça fora da boleia, indignado, o motora reclama: “Motorista é chofer de madame, seu moleque! Eu sou é caminhoneiro, e dos bons”, diz orgulhoso o personagem Bino (Stenio Garcia), num dos capítulos do clássico Carga Pesada.

Um dos maiores sucessos da televisão brasileira dos anos 1970, Jorge, Um Brasileiro – adaptação de texto homônimo do escritor Oswaldo França Júnior, protagonizado por Antônio Fagundes – trazia com realismo as aventuras da dupla Pedro (Fagundes) e Bino. A atração refletia a diversidade cultural do país e a dura realidade dos trabalhadores das estradas.

Realidade que nas últimas semanas tomou conta dos noticiários do país com a greve e reivindicações da classe que praticamente parou o Brasil, mexendo de forma direta e incisiva com o dia a dia da sociedade. A ponto de até o rei Roberto Carlos, sempre discreto em suas opiniões políticas, tomar partido da categoria num show realizado em São José do Rio Preto (SP).

“Todo meu carinho e meu respeito aos caminhoneiros”, disse o artista, emendando, em seguida, a canção Caminhoneiro (1984). “As causas que eles estão reivindicando não são só deles. Meu abraço para esses nossos heróis de todas as estradas”, endossou Roberto.

Vídeo de Roberto Carlos apoiando a greve dos caminhoneiros:

“Queria ser chofer de caminhão”
Não é de hoje que o universo desses operários das rodovias é tema de canções, extravasando a solidão nas estradas, a angústia pela espera de uma carga, os perigos escondidos por trás de cada curva e a esperança brilhando no horizonte.

Embora as manifestações dos caminhoneiros contra o governo tenha acabado, o movimento serviu para atiçar a memória afetiva dos brasileiros que, pegando carona na situação, relembraram alguns clássicos do gênero.

“Eu conheço cada palmo desse chão/É só me mostrar qual é a direção/Quantas idas e vindas, meu Deus, quantas voltas/Viajar é preciso, é preciso/Com a carroceria sobre as costas/
Vou fazendo frete cortando o estradão”, canta Renato Teixeira em Frete – faixa de abertura de Carga Pesada.

Com letra de Ronaldo Bastos – um dos compositores ícones do mítico Clube da Esquina – e música de Túlio Mourão, a faixa-tema do filme Jorge, Um Brasileiro (1988), cantada por Milton Nascimento, também é outra pérola do gênero que evoca as imagens, paisagens e miragens cruzam os olhos dos caminhoneiros e o para-brisa do caminhão, pelas estradas de Norte a Sul do país.

Milton Nascimento canta música-tema do filme Jorge, Um Brasileiro:

Composta primeiramente ao piano, a já citada, “Caminhoneiro”, de Roberto e Erasmo Carlos, nasceu das memórias do rei em Cachoeiro do Itapemirim, quando não cansava de ver os caminhões entrar e sair de uma distribuidora da Coca-Cola, que ficava a quinze metros de sua casa. “Eu olhava aquilo com uma paixão terrível. Queria ser chofer de um caminhão daqueles”, confessou anos depois.

Lançada no auge do bum do rock nacional, em novembro de 1984, a música estourou nas rádios de todo país, sendo executada, no dia de seu lançamento, das 7h às 19h – um total de 3287 vezes.

Em sua polêmica biografia proibida sobre o rei Roberto Carlos, o crítico, pesquisador e jornalista Paulo César de Araújo defende tese de que “Caminhoneiro”, antecipou em alguns anos, a explosão do “novo sertanejo”. “Na gravação da música, o Rei fez uma segunda voz que resultou num country próximo do sertanejo – o que leva muitos a considerar Caminhoneiro uma canção brega”, escreve o autor.

Assim como aconteceria com os atores Stenio Garcia e Antônio Fagundes, da noite para o dia, Roberto Carlos se tornaria um dos ídolos da classe, recebendo milhares cartas de agradecimento e amizade desses lobos solitários da estrada.

Em 1993, Roberto Carlos voltaria ao tema com a canção, “O Velho Caminhoneiro”, agora trazendo um profissional mais maduro e cansado dos sofrimentos enfrentados nas rodovias.

Esbanjando simpatia e carisma, a gatíssima, Sula Miranda, pegou carona na onda de sucesso da “nova” música sertaneja que lançaria, nacionalmente, duplas como Chitãozinho & Xororó, Leandro & Leonardo, Zezé Di Camargo & Luciano, entre tantas outras. O sucesso responsável pelo título de Rainha dos Caminhoneiros seria a ingênua, mas envolvente, Caminhoneiro do Amor.

Sula Miranda canta Caminhoneiro do Amor:

O rol de artistas que homenagearam os caminhoneiros ao longo da vida é extenso, mas cabem aqui ainda pelo menos mais duas pérolas do gênero. Uma delas é a sofrida faixa Sonho de Um Caminhoneiro, que relata o triste fim de uma dupla de amigos da estrada.

Incluída na trilha sonora de “Carga Pesada”, com direito a palinha de Bino e Pedro debaixo do chuveiro, num dos episódios do seriado, “Motorista de Caminhão”, da dupla, Léo Canhoto & Robertinho, é outra ode a esse universo tão mágico e cheio de aventuras.

Resumindo, como mostrou a recente greve que, sem o caminhoneiro o Brasil simplesmente para.

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