Inspirada por mulheres fortes, Tiê mergulha no luto em “Gaya”
Cantora perdeu a avó, Vida Alves, em maio e usou referências femininas como a animação “Moana” para as novas composições
atualizado
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Existem várias maneiras de lidar com o luto. Em janeiro, a cantora Tiê perdeu a avó, a atriz Vida Alves, e escolheu “mergulhar de cabeça” em seus sentimentos para compor parte de seu novo álbum de estúdio, “Gaya”, que já está disponível para venda e nos meios digitais.
“Com a morte da minha avó, precisei tirar algo do luto. Chamei os produtores e fiz seis músicas. Tinha que colocar aquilo para fora”, lembra Tiê, em entrevista ao “Estado. Até então, a produção do disco, que já havia começado no ano anterior, vinha num ritmo lento, à escolha da própria cantora. “Esse álbum foi o mais longo, fiquei muito tempo preparando. Comecei em maio do ano passado, o que foi legal, porque fiz com mais calma, pude pôr, tirar música, mudar letra, regravar.”
Com o processo, Tiê, que sempre se viu mais como compositora, resolveu apostar ainda mais no lado cantora. “Antes, gostava de gravar duas vezes cada faixa e não queria gravar a terceira. Nesse disco, foi diferente. Algumas músicas gravei várias vezes, refiz, quis outras interpretações”, relata. “Acho que o processo mais longo fez o disco ficar mais maduro. Quando amarrei, fez sentido.”Para Tiê, em seu processo de composição, as inspirações vêm de dentro para fora. “São coisas que coleciono ao longo do tempo e que surgem.” Mas, ela admite, houve uma inspiração muito forte na cultura pop para a temática do disco, a animação musical “Moana: Um Mar de Aventuras”. No filme, a protagonista, uma heroína com uma forte conexão com o mar, coincidentemente, perde a avó, de quem era muito próxima.
“Ouvi tanto o disco do filme. Confesso que escuto mesmo sozinha, sem minhas filhas.”
Todos os acontecimentos em sua vida fizeram Tiê ficar mais reflexiva, e foi daí que surgiu a ideia para o título do CD. “O processo com a minha avó me fez olhar para dentro, para minha mãe, para minhas filhas, a sucessão. Venho de uma família com mulheres muito fortes e guerreiras e teve uma ligação forte com a água”, explica. “Da coisa da água e da força da mulher que me veio a ideia de Gaya, que tem a ver com a Mãe Terra. E, na verdade, a Mãe Terra é água.”
A água, para Tiê, vem de uma ideia de banho, mas não de forma literal. “É um ano em que estou rezando mais, me purificando. O mundo está tão louco, muita informação e tantas coisas ruins. Tenho feito alguns processos de limpeza.”
Pop
Com o sucesso de “A Noite”, do disco anterior, “Esmeraldas” (2014), na trilha da novela “I Love Paraisópolis”, a cantora percebeu seu potencial pop, que foi bem explorado no novo trabalho. “‘A Noite’ me abriu um caminho e um olhar para um lado que achei muito legal, então tomei a decisão de fazer (o novo álbum) mais pop. E fiz com dignidade.”
Como seus trabalhos são sempre “autobiográficos”, Tiê diz que a escolha tem a ver, também, com o momento que vive. “Não tem como fazer um disco igual a outro, especialmente no meu caso, em que todos têm a ver com as fases da vida. Estou numa fase pop, em que tenho feito coisas diferentes.”
Tiê brinca que tem, em casa, o melhor indicador para saber se a sua investida foi realmente boa. “É o disco que as minhas filhas mais gostam, o que elas mais cantam. Criança é um bom termômetro”, afirma. “Por isso, acho que esse disco tem uma energia diferente mesmo, é mais radiofônico e eu acho isso muito legal.”
O pop em “Gaya” é consolidado pelas participações. A mais surpreendente é na música “Duvido”, com Luan Santana, que mistura o sertanejo universitário com arrocha e elementos eletrônicos. “Gosto da coisa de misturar e de unir mundos diferentes”, explica. “Quando o Rafael Castro, que é um cara totalmente do indie e que tem uns 10 discos feitos em casa, me mostrou essa música, na hora eu falei que precisava ter o Luan.”
A cantora afirma que é, há anos, uma grande fã do cantor e já pensava em cantar com ele. “Quem me conhece sabe que eu sempre brincava, dizendo que quando crescesse queria ser o Luan e fazer 25 shows por mês. Já tinha essa conexão.”
“Gosto de trazer gente para o disco que faça sentido, não consigo colocar alguém empurrado porque é muito pessoal para mim”, reflete. Gaya traz ainda participação de Ximena e de Filipe Catto junto de “As Bahias” e a “Cozinha Mineira”, em uma das músicas feitas por Tiê para a avó, Vida. “‘As Bahias’ são minhas vizinhas de escritório, vejo todos os dias, são minhas amigas. Do começo, falei que iria achar uma música para cantar com elas ” Na faixa, elas entram para fazer um coro “quase de igreja, mas sem ser”. “Queria um arranjo simples e que o coro fizesse parte. Acabou que o Catto entrou e, quando escuto no fone todos juntos, acho maravilhoso.”
Assim como as composições, a cantora afirma que a parte de produção do disco, assinada por André Whoong e Adriano Cintra, também veio de forma natural. “Eles trouxeram várias coisas do repertório dos dois. Não pensamos ‘vamos fazer um disco com coisas eletrônicas’. Foi mais, ‘e se a gente misturar corda com bateria eletrônica aqui?'”, explica.
Segundo Tiê, ao longo de mais de um ano em que o disco esteve sendo gravado, não faltaram situações inusitadas nas gravações, mas que contribuíram para a diversidade final. “A gente gravou em diversos lugares. Teve pedaços na Europa, no interior do Rio, gravamos dentro de van, em hotel.”
Além do processo de gravação, o de promoção de “Gaya” também está sendo diferente para Tiê. “Não vou fazer um show de lançamento, vou fazer uma turnê. Vou seguir na estrada, adicionando as músicas uma de cada vez. Temos bastante show e ainda o Lollapalooza no ano que vem.” Para o festival, aliás, a cantora já está ansiosa, pensando em surpresas e no figurino para a ocasião.
Tiê lança o disco “Gaya” (Warner; R$ 30; também disponível em plataformas digitais)