Em +AR, Almir Sater e Renato Teixeira mostram a delícia de ser caipira
O segundo disco da longeva parceria dos dois músicos é um primor no cenário musical sertanejo
atualizado
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Existe uma relação xamânica entre Almir Sater e Renato Teixeira construída há mais de 30 anos. Tudo começou quando a dupla se esbarrou certo dia durante os bastidores de um programa de televisão que eles nem sabem mais qual foi. Quando viram, estavam compondo na Serra da Cantareira.
Curiosamente, apesar dessa estreita relação de três décadas, só em dezembro de 2015 eles realizaram um projeto juntos. Com produção do estadunidense Eric Silver, AR, simbolicamente representando a sigla dos primeiros nomes dos amigos, foi um trabalho que mesclou o country e o folk ao som genuíno da nossa música de raiz. Deu certo.
Os dois voltaram com +AR (2018). A continuação dessa sinergia de encanto, acalanto e espanto criativo desenvolvida entre dois violeiros de alma telúrica autêntica – cujos sentimentos puros têm raízes frondosas. Parece contradição, mas não é. Até porque é um elemento que surge como esteio na produção, sofisticando, sem parecer piegas, o lirismo das letras de Teixeira e o virtuosismo de Sater na viola. Uma simbiose poderosa e hipnótica.Química azeitada pelo gosto mútuo de ambos em fundir com naturalidade o folk estrangeiro com as nossas tradições sertanejas. Para se ter uma ideia, Almir Sater é fã ardoroso de Beatles, Stones, Pink Floyd, Jethro Tull e James Taylor. Renato Teixeira já compôs para Roberto Carlos e tem paixão pela Bossa Nova.
“Bossaipira”
Com boa parte do que não entrou no primeiro projeto, +AR começa com Flor do Vidigal. Uma ode ao Rio de Janeiro. “Repara a maneira dela andar/Sandália de nuvens, balanço do mar”, diz os versos inicias, num tipo de evocação “bossaipira”.
Assim Os Dias Passarão é uma homenagem ao cantor e compositor Geraldo Roca, que se suicidou em 2015. Carioca radicado há anos no Mato Grosso do Sul, o artista era coautor, junto com Paulo Simões, da canção O Trem do Pantanal, gravada por Almir Sater. Na balada romântica Venha Me Ver, com seu piano contido, slide guitar comovente e bandolim sutil, há ressonância da melancolia de Neil Young.
Quando A Gente Chama é daquela safra em que a dupla evoca a magia do universo rural já cantado por eles em canções emblemáticas, como Romaria, Boiada e Peão. O Mascate, com sua letra descritiva à la roteiro de cinema, traz lembranças das histórias de nossos avós sobre viajantes de língua enrolada com suas malas cheias de quinquilharias.
Não pelas letras – profundas e cheias de imagens poéticas do imaginário rural –, mas por conta do descompasso musical – uma pegada country maçante –, talvez as faixas Touro Mocho e Vira Caipira soam destoantes neste álbum de 10 canções.
Avaliação: Bom