Aposta do pop, cantor Nick Cruz fala de representatividade trans na música
O artista chamou a atenção da Warner após viralizar nas redes com a autoral Me Sinto Bem, com mais de 1 milhão de views no YouTube
atualizado
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A arte, em especial a música, é um importante espaço de luta e resistência contra a transfobia. No Brasil, país que mais mata pessoas trans no mundo, são vários os exemplos de transexuais e travestis que conseguiram amplificar suas vozes através do mercado fonográfico. Nomes como Liniker e Linn da Quebrada, entre outros, ajudaram a potencializar a cena e abrir caminho para novos artistas. Um deles é Nick Cruz, a nova aposta da Warner Music.
Aos 22 anos, o artista chamou a atenção da gravadora de Anitta após viralizar nas plataformas de streaming com a autoral Me Sinto Bem. Lançado de forma independente, a canção ultrapassou a marca de 1 milhão de visualizações no YouTube. De lá para cá, o cantor aproveita o sucesso de outros dois singles, Até de Manhã, e, a mais recente, Então Deixa, ambos com o selo da Warner.
Nascido e criado em Serra, município do Espírito Santo, Nick Cruz herdou da família o gosto pela música. Aos 9 anos, seu passatempo preferido era cantar em karaokês na companhia da mãe, Rosângela. Com o violão do irmão mais velho, Jeorge, aprendeu os primeiros acordes. O processo de entendimento enquanto trans também aconteceu muito cedo. “Nasci homem. Me afirmo desde criança”, ressalta o cantor.
Além da família, que entendeu, aceitou e respeitou a decisão dele de seguir com a transição hormonal, a música sempre foi uma grande aliada de Nick. “Me ajuda a lidar com as dificuldades que eu passo por ser trans e funciona como um refúgio para mim. Também me dá forças para insistir no que eu acho que tenho de melhor para oferecer, me ensina e faz tudo fazer sentido na minha vida”, afirma.
A coragem de se afirmar desde a infância veio acompanhada de dor. “Sofri mais bullying na época do ensino fundamental, pois eu era uma criança muito masculina e me destacava entre as outras crianças”, lembra. No ensino médio, tomou as frentes do grêmio estudantil da escola onde estudava, virou o jogo e criou um movimento que abraçava os estudantes LGBTQIA+. “Eram muitos”, salienta.
Antes de se lançar de cabeça na carreira musical, Nick trabalhou como ajudante de obras, eletricista, servente e pintor. Ofícios que aprendeu com o amigo Jefferson Mulford. Foi dele que Nick ganhou o primeiro microfone e o incentivo para cantar nos bares de Vitória (ES).
A experiência musical conquistada nas noites capixabas e as difíceis vivências com o preconceito se transformaram na base das composições do cantor. Foi assim que saiu a letra do primeiro sucesso, Me Sinto Bem, inspirada no único lugar que lhe trazia paz naquele momento — a sua namorada da época.
Representatividade
Com muitas representantes drags, travestis e mulheres transexuais, enquanto homem trans, Nick Cruz enfrenta a responsabilidade de ser uma minoria, dentro da própria minoria que é a comunidade LGBTQIA+ no cenário musical brasileiro. “É triste ver que grande parte dessas pessoas são excluídas ou não tem o reconhecimento que merece”, considera.
Para Nick, ainda há muito preconceito a se combater no meio musical, “mesmo com toda a vitória de artistas incríveis e renomadas”. Segundo ele, muitas pessoas relacionam mulheres trans e travestis à violência e à prostituição, enquanto os homens trans têm a capacidade colocada à prova a todo momento. “Isso leva vários da nossa comunidade a cometerem suicídio”, denuncia.
Nick entende que seu papel dentro do mercado fonográfico é mais que alcançar grandes números no streaming. “É levar mais representatividade para que outras pessoas de dentro da comunidade ascendam também e me sinto honrado por isso”. Mesmo com todas as dificuldades que ainda estão por vir, o cantor sente que está no caminho certo. “Tudo que passei na vida para chegar aqui valeu a pena. Hoje, mais que nunca, sou a pessoa mais realizada em poder levar minha música a ‘todes'”, conclui.