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Biografia mostra a dor e a delícia de ser Elza Soares

Obra sobre a cantora de voz rouca marcante escrita pelo jornalista Zeca Camargo é definitiva

atualizado

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Elza Soares
1 de 1 Elza Soares - Foto: Daryan Dornelles/Divulgação

Ela carregava lata de água na cabeça para ajudar a mãe, uma lavadeira de Bangu (RJ). Varreu chão de “madama”, quando criança, e espetou as mãos montando enceradeira. De doméstica a operária, chegou ao posto de estrela da música brasileira, dona de voz rouca inconfundível, vivendo um romance turbulento com o craque Garrincha. Uma vida que daria um livro e deu. Dois…

Um deles foi escrito em 1997, pelo experiente jornalista já falecido José Louzeiro. O outro, de Zeca Camargo, acaba de chegar às livrarias pela editora Leya. “Foi a primeira vez que brinquei com a ideia – uma brincadeira que acabou me levando ao centro gravitacional de uma história de vida única, poderosa e inspiradora. A trama me consumiu como um bálsamo, um refúgio, uma inspiração”, conta o apresentador do É de Casa.

Divulgação
Cantora Elza Soares ganha biografia feita por Zeca Camargo

 

A nova biografia da cantora é uma pedrada. Isso porque, passados mais de 20 anos, muita água passou por debaixo da ponte. Vinda da mais genuína pobreza do subúrbio do Rio de Janeiro, ela venceu, mas não foi fácil. Na vida privada e na profissional viveu altos e baixos de uma montanha-russa.

Aos 13 anos foi forçada a se casar com um peão, colega do pai na pedreira, depois de ser flagrada se enroscando com o homem num matagal. Na verdade, Elza tentava se desvencilhar do rapaz, mas seu Avelino pensou outra coisa e não demorou muito para a menina subir morro carregando uma barriga.

João Carlos nasceu quando eu tinha 14 anos e eu sabia que ele era meu filho, mas era mais como um boneco para eu brincar – um boneco de verdade, não aqueles de pano que eu tinha até então

Elza Soares

Quando descobriu que tinha uma voz legal para cantar, foi uma luta convencer a família: àquela época, ser artista não era tão mal-visto quanto se prostituir. Até tiro levou, disparado pelo marido Alaordes. Nada disso a abateu. “Eu sou pequenininha, mas quando é preciso ,eu sei como crescer”, conta com orgulho de sua garra e determinação.

E cresceu. Foi o malandro Moreira da Silva quem lhe abriu as portas da esperança, mas antes o ranheta Ary Barroso tentou tirar sarro de sua miséria no programa Calouros em Desfile, na Rádio Tupi. Logo, foi emparedado pela jovem. “Então, agora, me responda, menina, de que planeta você veio?”, provocou o autor de grandes sucessos como “Aquarela do Brasil” e “No Rancho Fundo”. “Do planeta fome”, disse ela, sem titubear.

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A biografia mostra a trajetória cheia de percalços da artista
Elza Soares acumulou prêmios na fase mais recente da carreira, com os discos Mulher do Fim do Mundo e Deus é Mulher
Segundo a BBC de Londres, Elza tem a Melhor Voz do Universo
No livro, Elza fala sobre o a apaixonante e conflitante relação com Garrincha
A obra, do jornalista Zeca Camargo, caminha por diversos momentos da vida da cantora
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Elza Soares: "Vim do planeta fome"

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A biografia mostra a trajetória cheia de percalços da artista

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Elza Soares acumulou prêmios na fase mais recente da carreira, com os discos Mulher do Fim do Mundo e Deus é Mulher

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Segundo a BBC de Londres, Elza tem a Melhor Voz do Universo

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No livro, Elza fala sobre o a apaixonante e conflitante relação com Garrincha

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A obra, do jornalista Zeca Camargo, caminha por diversos momentos da vida da cantora

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O sucesso viria em 1960, com a gravação do primeiro disco e o estouro, na sua voz, de um dos maiores sucessos do gaúcho Lupicínio Rodrigues: Se Acaso Você Chegasse. Ziriguidum, que se tornaria uma marca registrada, viria só no terceiro álbum, O Samba É Elza Soares (1961). A canção faria parte do filme Briga, Mulher e Samba.

Garrincha
O livro tem o mérito, entre outras coisas, de destacar com elegância o poder de superação de Elza que, como uma highlander incansável, venceu com persistência as batalhas da vida. E foram muitas. Perdeu quatro filhos, um deles, Garrinchinha, aos 9 anos. No início da carreira, o preconceito foi uma barreira por “causa da sua classe e sua cor”.

A barra mais pesada que segurou foi ao lado do jogador Garrincha, o grande amor de sua vida com quem viveu 15 anos. Uma mulata de parar o trânsito, Elza, “madrinha” do escrete de 1962, entrou na vida do craque de pernas tortas quando ambos eram estrelas solitárias. Viúva desde 1959, já tinha três discos gravados, entre eles, A Bossa Negra (1961). Já o ponta-direita do Botafogo colecionava dois títulos mundiais e nove filhas de seu primeiro casamento.

“O homem que eu amava tinha matado a minha mãe, e eu não conseguia sentir raiva. Parecia que eu tinha uma pedra de gelo dentro de mim. Eu só lembrava da história do Mané, de tudo que já tinha acontecido na vida dele, tanta tragédia, tanta coisa que tinha dado errado e agora mais essa. Eu é que não ia condenar ele por isso!”, desabafa a cantora ao se lembrar do acidente de carro que matou sua mãe, 1969, com Garrincha ao volante.

A biografia traz revelações surpreendentes, como o seu drama tardio com as drogas nos anos 1980, quando, sem trabalho e negligenciada no mercado, cantou num circo e quase aceitou um emprego de babá numa creche. Foi o baiano Caetano Veloso quem lhe salvou, dando impulso a mais uma das várias guinadas para cima da artista que, nessa época, flertou com a turma do rock e gravou com Cazuza e Lobão.

A potente renovação musical da cantora na década de 2000, realizada a partir do flerte com sonoridades pulsantes como a música eletrônica e o rap – registrado em trabalhos explosivos como Do Cóccix Até o Pescoço (2002), passando pelo premiadíssimo A Mulher do Fim do Mundo (2015), até Deus É Mulher (2018) –, são documentados pelo autor com sutil olhar de crítico musical. Os novos amores da artista, na casa dos 20 e poucos anos, também.

“(…) Como uma mulher ainda era capaz de descobrir-se feminina, donzela, amada, garota, apaixonada, após décadas e mais décadas vividas”, escreve o autor, referindo-se aos dois mais recentes amores da cantora, o rapper Anderson Lugão e o cineasta Bruno Lucide. “Elza desafiava as convenções. (…) viveu esses dois amores numa idade em que as mulheres já não esperam mais a descoberta do amor – e menos ainda do sexo”, observa.

Reprodução
De Zeca Camargo. Editora LeYa, 400 páginas, R$ 54,90

 

Uma mulher de fibra inquietante no auge dos seus mais de 80 anos homenageada em musical em cartaz pelo país e filme em fase de produção, Elza Soares, eleita pela BBC de Londres a “Melhor Cantora do Universo”, tem na ponta da língua a resposta quando lhe perguntam sobre sua idade. “Não tenho idade. Tenho tempo”, ensina. É… Como diz uma canção do amigo Cazuza que ela gravou recentemente: O Tempo Não Para…

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