Greve que impactou filmes e séries pode acontecer no Brasil? Entenda
Em entrevista ao Metrópoles, presidente do Sindcine afirmou que cenário no Brasil também pode causar uma greve no setor
atualizado
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A greve de roteiristas e atores norte-americanos, que culminou em uma crise sem precedentes no audiovisual, pode ganhar contornos ainda mais dramáticos. Segunda nação que mais consome serviços de streaming, de acordo com o relatório Streaming Global do Finder de 2021, o Brasil deve amargar prejuízos financeiros com o cancelamento de filmes e séries hollywoodianos, mas essa é só uma parte do problema. Isso porque as produções nacionais também estão ameaçadas pela falta de acordo entre profissionais e plataformas de streaming.
Nos Estados Unidos, a paralisação começou com o Sindicato de Roteiristas dos Estados Unidos (WGA) exigindo remunerações mais adequadas e proteção jurídica aos profissionais, em um ambiente de trabalho que vem mudando rapidamente. Na semana passada, o sindicato dos atores e artistas de rádio dos Estados Unidos (SAG-AFTRA) se juntou ao movimento.
Ambas entidades pleiteiam uma espécie de royalty por parte dos serviços de streaming. Antes, quando um seriado de televisão fazia sucesso, atores e roteiristas podiam contar com uma longa sequência de pagamentos, mas o esquema de transmissão contínua mudou a dinâmica. Os grupos também querem meios de resguardar os artistas em relação ao uso da inteligência artificial, para a preservação de empregos.
Em entrevista ao Metrópoles, a presidente Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Cinematográfica e do Audiovisual (Sindcine), Sônia Santana, afirma que o futuro do áudiovisual é uma preocupação no mundo todo. O assunto, inclusive, foi tratado em fevereiro em uma série de reuniões técnicas na Organização Internacional do Trabalho, em Genebra.
“As plataformas de streaming agem de forma parecida em todos o mundo. Estão somente em busca de lucro e os atores cada vez têm menos direitos. Não pagam veiculações em outros países e querem agora usar a IA para reduzir custos de produção. Isso implica em reduzir também o trabalho do elenco extra, figurantes, dubladores e outras funções que podem desaparecer”, explica Sônia.
A porta-voz dos trabalhodores do cinema avalia que “todos os sindicatos de profissionais do audiovisual no mundo deveriam entrar em greve”. “A situação é muito semelhante. [As plataformas de streaming] são uma caixa preta sem transparência”.
Segundo Sônia, é possível que a greve que começou nos Estados Unidos chegue em breve ao Brasil e a outros mercados: “Hoje já se fala em greve no audiovisual brasileiro. Há possibilidades de paradas pontuais, até haver um despertar para a realidade”.
Tudo depende do que será discutito em agosto, em um grande encontro encontro de sindicatos do setor na Filadélfia. “Este será um momento para tomada de decisões em torno do mundo do trabalho digitalizado. Regular é urgente”, salienta.
Regulação
Sônia Santana defende a urgência de regular o streaming e aprovar leis de proteção ao trabalho, assim como o estabelecimento de limites para o uso da IA. “Já existem projetos no Congresso brasileiro para regulação da IA. Um deles está em debate, do senador Rodrigo Pacheco”, diz, sobre o PL 2338/2023.
O anteprojeto apresentado por Pacheco foi elaborado por uma comissão de especialistas, coordenada pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Ricardo Villas Bôas Cuevas, e prevê avaliação de riscos, responsabilização dos agentes envolvidos e direitos para pessoas eventualmente afetadas pela Inteligência Artificial.
O texto descreve as obrigações da autoridade competente para fiscalizar, a ser definida pelo Executivo, e sugere, em caso de infração às regras, multa de até R$ 50 milhões para pessoas físicas e de até 2% do faturamento de empresas.
A representante também cita a necessidade de “regular o VOD, para que contribua com a produção independente”. Nesse sentido, vale lembrar que há um projeto em tramitação na comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal buscando definir regras para atividades de empresas como Netflix, Amazon Prime e HBO Max no Brasil.
Em entrevista recente ao Metrópoles, o senador Humberto Costa dafirmou que essas plataformas têm obtido “lucros bastante expressivos” no Brasil, sem nenhum tipo de contrapartida em termos de pagamento de impostos, por exemplo.
“Quase todas as atividades culturais já são reguladas, como é o caso do cinema e dos canais de TV por assinatura. O pagamento da Condecine e a definição da cota nacional representam importante estímulo ao audiovisual brasileiro, que é uma parcela expressiva do nosso Produto Interno bruto (PIB), reflete em prestígio internacional e contribui para a formação da nossa identidade, além de gerar muitos empregos”, avaliou o senador.