Frida Kahlo brilha em mostra que chega a Brasília em 2016
Em cartaz atualmente em São Paulo, exposição faz uma rica panorâmica da artista mexicana e de algumas de suas compatriotas e contemporâneas
atualizado
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São Paulo – Programada para atingir Brasília em abril de 2016, uma rica panorâmica da artista mexicana Frida Kahlo, e de algumas de suas compatriotas e contemporâneas, já pode ser desfrutada em terras brasileiras. Abrigada pelo Instituto Tomie Ohtake, a mostra coletiva “Frida Kahlo — Conexões entre Mulheres Surrealistas no México” fica em cartaz em São Paulo até 10 de janeiro de 2016.
De lá, segue para a Caixa Cultural do Rio de Janeiro (de 2 de fevereiro a 25 de março). Na terceira e última escala desta turnê brasileira, chega à Caixa Cultural de Brasília e por aqui permanece por um par de meses, entre 12 de abril e 12 de junho.
“Autorretrato con Monos” (1943) recebe o visitante que adentra a exposição no Tomie Ohtake. Trata-se de uma das mais notáveis obras de Frida Kahlo (1907-1954) e foi estrategicamente posicionada ali pela curadora Teresa Arcq para já introduzir algumas características fundamentais da artista, aspectos a serem esmiuçados e desenvolvidos no correr da visitação.
A figura de Frida enche a tela, em um de seus mais emblemáticos autorretratos. Ao redor dela, abraçados a ela, quatro de seus macaquinhos de estimação. Ao fundo, uma natureza exuberante, da qual parecem emergir tanto os macacos quanto a própria Frida. As esferas doméstica e pública, acredita Teresa Arcq, assim se misturam num imaginário no qual a artista coloca a si mesma como centro pictórico e narrativo. Ou seja, como centro emocional da tela. E ela está olhando para ti, caro espectador, ela está olhando para ti.
Artista e personagem
Tal atitude de Frida Kahlo, fazer de si mesma a protagonista de sua arte, numa sociedade que não tinha assim especial apreço por mulheres artistas, muito ao contrário, fez com que ela se sobressaísse e se tornasse única em sua época, seu lugar.
Mas, ao mesmo tempo, esse gesto também fez com que a personagem Frida Kahlo se tornasse às vezes mais importante que a artista Frida Kahlo. Hoje sua imagem é comercializada de mil maneiras. Não apenas livros de reproduções, mas camisetas, bolsas, bonecas de pano, badulaques e miudezas — que a própria lojinha do Instituto Tomie Ohtake vende às pencas.
Um dos desafios desta mostra e da curadora mexicana Teresa Arcq, portanto, é colocar novamente as coisas em perspectiva. E aqui a visitação fica amarrada por um contexto biográfico, artístico e histórico que informa o que se vê na centena de peças reunidas — 20 delas de autoria de Frida Kahlo.
E mais do que isso. A simples presença das telas de Frida Kahlo faz empalidecer qualquer aproximação fútil e mercantil.
Frida e Diego
Marcada por uma poliomielite que a atingiu ainda na infância e fez com que carregasse sequelas por toda a vida, inclusive perdendo uma perna, Frida Kahlo ainda era atormentada por constantes dores na coluna, desde um acidente de ônibus quando colegial. Dilaceramentos que transparecem em sua obra, na igual medida em que transparecem também seu conturbado relacionamento com Diego Rivera (1886-1957) e os três abortos que ela sofreu.
A figura de Diego Rivera se infiltra, insidiosa, nos autorretratos. Por vezes, ganha até os contornos literais e seu rosto brilha entre as sobrancelhas de “Diego en mi Pensamiento” (1943) e o traje típico de Tehuana. Uma imagem que se rompe em trançados de folhas num efeito visual semelhante ao craquelado de antigas pinturas, mas que preserva intactos os semblantes dos dois amantes.
Noutra das telas aqui reunidas, Frida embala Diego, como a um bebê gordinho, num cenário distorcido, surrealista, que remonta ao deserto mexicano e ao ancestral xamanismo… “El Abrazo de Amor del Universo, la Tierra, México, Diego, yo y el Señor Xolóti”(1949), a pintura a óleo em detalhe no alto desta página.
Diego Rivera, ele próprio um artista ímpar em sua geração, foi sempre sombra para Frida Kahlo. E aqui nesta exposição ele é um dos poucos homens a aparecer na curadoria de Teresa Arcq. Em um trabalho de 1930, Diego desenha sobre o papel o corpo nu da amada. Sem nenhuma imperfeição.
Surrealismo e identidade
Frida Kahlo não se enxergava como uma pintora surrealista. Aquilo que pintava, ela dizia, era a realidade, era a sua realidade. De toda forma, a curadoria de Teresa Arcq reúne, ao redor das obras de Frida, trabalhos de outras 15 artistas dos anos 1920, 1930 e 1940. Em comum, todas trazem ecos das vanguardas europeias do final do século 19, início do século 20.
Entre as envolvidas na exposição, encontram-se as também celebradas Maria Izquierdo, Cordelia Urueta e Lola Alvarez Bravo. Destaque ainda para a espanhola Remedios Varo e a inglesa Leonora Carrington, só para citar duas das inúmeras artistas e intelectuais europeias que se exilaram no México por conta das desordens políticas e das guerras no continente europeu.
Elas teriam na então efervescente cena cultural mexicana um ambiente sugestivo o suficiente para desenvolver suas influências e tentar ultrapassá-las. Impossível não notar em seus trabalhos o impacto brutal das cores tropicais de Paul Gauguin, da desconstrução cubista de Pablo Picasso e da simbologia psicanalítica de Salvador Dalí. Mas essas influências seriam transformadas sob a luz e a natureza do México, seriam recriadas sob a religiosidade e as tradições do México, se tornariam uma arte miscigenada e única.
E Frida Kahlo emprestaria, em definitivo, um rosto para toda essa geração.
Até 10 de janeiro de 2016 no Instituto Tomie Ohtake (Avenida Faria Lima, 201, entrada pela Rua Coropés, Pinheiros, São Paulo, 11-2245-1900). Terça a domingo, das 11h às 22h. Ingressos a R$ 10,00 e R$ 5,00 (meia). Entrada franca às terças. Livre.