Artista alemão Sven Marquardt conta um pouco de sua vida ao Metrópoles
Host de uma das festas mais badaladas em Berlim, ele está com instalações fotográficas incluídas na mostra “Zeitgeist: A Arte da Nova Berlim”, no CCBB
atualizado
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Tímido, poucas palavras (todas em alemão) e um aperto de mão curto e forte. Assim o artista alemão Sven Marquardt recebeu a equipe do Metrópoles na tarde de segunda-feira (1/8). Marquardt veio a Brasília para uma palestra, parte da programação de “Zeitgeist: A Arte da Nova Berlim”, exposição em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Ficou na capital federal por pouco mais de 24 horas e contou que a arquitetura da cidade o confundiu um pouco.
Nascido na Berlim Oriental um ano após a construção do fatídico Muro de Berlim, Sven cresceu sob um proibitismo que fugia de suas escolhas. No entanto, ganhava destaque sem muito esforço. Com um estilo diferenciado, uma paixão por música eletrônica, um olhar para a arte e a vontade de se expressar, chegou a ser banido pela polícia de andar alguns bairros da Berlim Oriental.Hoje, ele não só viaja pelo mundo expondo seu trabalho, como é o cara que decide quem entra e quem fica na fila da famosa Berghain, uma das maiores e mais comentadas festas de música eletrônica na capital alemã — e conhecida internacionalmente.
Vontade de se expressar
Sven conta que sua família não tem um histórico artístico e filosófico, mas que ele sentia necessidade de fazer algo em que pudesse se expressar. “Sempre vivi a arte como forma de ser”, comenta. Diferente do restante dos cidadãos que viviam do mesmo lado do muro, ele criou em si um espírito anárquico que não era compreendido ali.
À época, crescia no bairro de Prenzlauer Berg a chamada onda punk new-wave. “Todos aqueles jovens adotando moicanos, usando lápis de olho. Pessoas opostas à ditadura e que queriam de alguma forma que seu ponto de vista fosse notado. Achei esse movimento fascinante e queria fazer parte disto”, ele conta. Sven tinha uma Praktica (analógica SLR) e havia começado a registrar essas pessoas nas ruas. Foi assim que decidiu registrar sua forma de ver o mundo através da fotografia.
O ano de 1989 chegou e o muro caiu. O período de adaptação o levou a observar as coisas de outra forma. “Via edifícios e lugares em que podia transgredir e me expressar”, conta. A chegada da década de 1990 veio como uma nova descoberta para ele, que deixou um pouco a fotografia de lado e entrou no mundo da música techno.
O mundo do underground trouxe uma grande união entre os artistas, sabe? Me deixa até meio sentimental perceber o quanto crescemos e o quanto conseguimos expressar essa sensação de liberdade e autonomia em festas
Sven Marquardt
Berlim era uma festa
Nos lugares abandonados, rolavam festas novas e diferentes a cada fim de semana. Seu irmão iniciou uma dessas baladas já tão comentadas por toda Berlim. “Meus amigos me incitaram a começar a frequentar, tocar, entrar nesse mundo”, comenta. Dali nunca mais saiu. “Na verdade, não mudou muita coisa no espírito festeiro desde as décadas de 1980 e 1990, tocamos inclusive algumas músicas da época”, comenta rindo.
Na festa de seu irmão, Sven cuidava da porta. O conceito de host, para ele, é algo diferente do que estamos acostumados no Brasil. A separação de pessoas da fila para dentro é simples: se você pertence àquele tipo de festa, você pode entrar.
Pessoas da cena cultural, artistas e fãs da música eletrônica são bem-vindos. O restante, nem tanto. E como ele escolhe isso? “É tudo muito subjetivo. Não existe um traje, uma faixa etária. É muito subjetivo, não posso explicar.” Assim ele foi cada vez mais fazendo parte do mundo das festas noturnas berlinenses. Há 13 anos, migrou para a porta da badalada Berghain .
Um grande palco
Para Sven Marquardt, a festa é um grande palco. Ali, artistas conseguem mostrar a forma como veem o mundo através de performances, discotecagem e até mesmo pela decoração do local. A programação da exposição no CCBB Brasília inclui três festas que vão tentar trazer para o brasiliense um pouco do que os alemães sentem dentro da Berghain.
As baladas estão marcadas para os dias 19/8, 9/9 e 12/10. Contarão com sets de música eletrônica, performances de artistas participantes da mostra e projeção videográfica.
Ele disse estar animado em saber os resultados da produção brasiliense. “Acho impossível conseguirem reproduzir literalmente o sentimento que vivemos lá. São lugares diferentes, sensações diferentes. Mas tenho expectativas altas de que conseguirão trazer um pedaço de Berlim para cá de alguma forma.”
Com várias tatuagens no corpo, inclusive no rosto, o artista conta que começou sem intenção de se rabiscar por completo. “Minha primeira tatuagem foi uma cruz bem feia na batata da perna. De repente, estava já nas mãos e no rosto”, comentou aos risos. Para ele as tatuagens funcionam como um diário e cada uma tem uma história diferente para contar.
Admiro a juventude de hoje em dia. Você vê? Qualquer um tem tatuagem, não é mais um estereótipo de uma pessoa errada
E sobre Brasília? Foi a primeira vez dele aqui. Sven ainda não havia decidido se tinha achado a cidade agradável: a arquitetura o confundiu um pouco. Ainda assim, não criticou. “Lembra-me Bauhaus. Mas gosto muito dessa coisa de não precisar olhar para cima para ver o céu. É estranho porque vocês não têm calçadas. Onde vocês andam?”.
Outra impressão que o alemão levou da capital federal é a de ser uma cidade de não muitos agitos.
Zeitgeist– Arte da Nova Berlim
Até 12/10. Quarta a segunda, das 9h às 21h. No Centro Cultural Banco do Brasil (Setor de Clubes Esportivos Sul, Trecho 2). Entrada franca. Classificação indicativa livre.